Justiça

Justiça decide que colunista não ofendeu Joaquim Barbosa

Ainda cabe recurso, mas o MPF decidiu aceitar a decisão.

Acusado pelo ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (TSE) Joaquim Barbosa de ter cometido racismo, difamação e injúria (esta, qualificada pelo uso de elementos referentes à raça) em um artigo publicado em 19 de agosto de 2013, o colunista Ricardo Noblat, do jornal “O Globo”, foi considerado inocente pela Justiça Federal.

A denúncia, proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) a partir de uma representação criminal apresentada por Barbosa, foi rejeitada pelo juiz federal Elder Fernandes Luciano, da 10ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, em decisão tomada no dia 11 de setembro. Ainda cabe recurso, mas o MPF decidiu aceitar a decisão.

O artigo, intitulado “Quem o ministro Joaquim Barbosa pensa que é?”, foi publicado quatro dias depois que Barbosa, durante sessão de julgamento do Mensalão, acusou o colega Ricardo Lewandowski de fazer “chicana”.

Noblat escreve: “Que poderes (Barbosa) acredita dispor só por estar sentado na cadeira de presidente do Supremo Tribunal Federal? (…) Ora, se foi honesto e agiu orientado unicamente por sua consciência, nada mais fez do que deveria. A maioria dos brasileiros o admira por isso. Mas é só, ministro”.

O colunista afirma que ser admirado “não autoriza ninguém a tratar mal seus semelhantes, a debochar deles, a humilhá-los, a agir como se efêmera superioridade que o cargo lhe confere não fosse de fato efêmera”.

Ao citar a autoridade, Noblat escreve: “Joaquim faz questão de exercê-la na fronteira do autoritarismo. E, por causa disso, vez por outra derrapa e ultrapassa a fronteira, provocando barulho. (…) Não é uma questão de maus modos. Ou da educação que o berço lhe negou, pois não lhe negou. No caso dele, tem a ver com o entendimento jurássico de que para fazer justiça não se pode fazer qualquer concessão à afabilidade”.

Na sequência, o colunista se refere ao fato de Barbosa ser negro. “Para entender melhor Joaquim acrescenta-se a cor – sua cor. Há negros que padecem do complexo de inferioridade. Outros assumem uma postura radicalmente oposta para enfrentar a discriminação. Joaquim é assim se lhe parece. Sua promoção a ministro do STF em nada serviu para suavizar-lhe a soberba. Pelo contrário. Joaquim foi descoberto por um caça-talentos de Lula incumbido de caçar um jurista talentoso e… negro. (…) Quando Lula bateu o martelo em torno do nome dele, falou meio de brincadeira, meio a sério: Não vá sair por aí dizendo que deve sua promoção aos seus vastos conhecimentos. Você deve à sua cor”.

Noblat encerra o texto fazendo uma recomendação ao jurista: “Julgue e deixe os outros julgarem.”

Após receber a representação de Barbosa, o MPF, representado pela procuradora da República Lilian Guilhon Dore, apresentou denúncia contra o jornalista. A defesa de Noblat afirmou que o texto não é ofensivo à honra de quem quer que fosse e tampouco indutivo da prática de racismo.

Na sentença, o juiz afirma que “questionar os poderes de uma autoridade pública não deve ser considerado uma afronta. (…) A crítica à autoridade pública (…) tornou-se algo não somente possível, mas necessário. (…) A emitente tarefa de julgar não deve estar desatrelada da atenção e de críticas (construtivas) para o bem desempenho da função. A atenção e a crítica serão maiores se maior for a responsabilidade do detentor do cargo”.

A “possibilidade de crítica é uma das facetas da liberdade de expressão, previsto no art. 5º, IX, da Constituição Federal”, continua o magistrado. “Da leitura do texto não se pode extrair que, em qualquer momento, o articulista tenha colocado em dúvida a probidade exercida no cargo de ministro do STF. (…) Ainda que o articulista tenha se utilizado de duras palavras, deveria ser punido por justamente retratar uma realidade vista sob a sua ótica? Evidentemente, situação diversa existiria se o articulista tivesse deturpado totalmente a existência dos fatos”.

“Barbosa despertou paixões com a mesma velocidade com que despertou ódio. Não há problemas quanto a isso. (…) Mas também não há problema de as pessoas, dentre elas as jornalistas, entenderem se a sua compostura na Suprema Corte era adequada ou não. Alguns o elogiavam, outros o criticavam. Se casos como esse foram reputados como crime, perde a sociedade a oportunidade de formular senso autocrítico”, afirma o juiz na sentença.