Concorrência

MP é proibido de “invadir” competência Judiciária no caso João de Deus

Decisão foi tomada pela Comarca de Abadiânia depois que promotores solicitaram avaliação médica do médium sem autorização prévia da Justiça

A Força-tarefa do Ministério Público de Goiás (MP-GO), que investiga acusações contra o médium João de Deus, foi proibida de praticar atos que possam invadir a competência do Poder Judiciário. O pedido foi feito pela defesa do réu depois que promotores solicitaram avaliação médica do acusado sem autorização prévia da Justiça. A decisão foi proferida pela juíza Rosângela Rodrigues Santos, da Comarca de Abadiânia. O caso é tratado como invasão de competência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e percebido como transgressor de garantias constitucionais do custodiado.

Em audiência realizada há pouco mais de 13 dias, Gabriella de Queiroz, promotora integrante da força-tarefa solicitou pedido de perícia pela junta médica do TJGO para averiguar eventuais inconsistências ou irregularidades em relação às informações dos médicos responsáveis pelo tratamento hospitalar prolongado do médium. Na ocasião, ela informou que o pedido deveria ser feito em separado para evitar tumulto no procedimento da ação penal. Na ocasião, MP e defesa técnica concordaram com a realização da perícia oficial.

Porém, os promotores requisitaram a avaliação de um geriatra do SUS, com acompanhamento de assistente indicado apenas pela força-tarefa, sem a participação da defesa ou mesmo comunicação ao Poder Judiciário, que é o órgão responsável por todas as decisões a respeito da internação do réu.

Na decisão, a juíza alega que o MP não pode decidir questões já submetidas ao crivo do Poder Judiciário, mas apenas requerer à autoridade judiciária competente. No caso, a autoridade competente para decidir todas as situações envolvendo a internação hospitalar do médium é do STJ, órgão que decidiu pelas prorrogações do prazo de internação. “Desta forma, não cabe ao MP investir-se de um poder de decisão que compete a um Poder de Estado, principalmente quando se faz à revelia do órgão jurisdicional competente e da defesa técnica”, justifica.

Para ela, trata-se de uma invasão na competência do STJ, especificamente do Ministro Neifi Cordeiro, que é o relator do habeas corpus e que já requisitou informações dos médicos responsáveis sobre a previsão de alta hospitalar e estado de saúde de João de Deus. “O ato unilateral do MP, sem participação da defesa ou do Judiciário, ofende a garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa e torna-se inadmissível diante da clarividente ilicitude”, diz trecho.

Com a sentença, os promotores não são permitidos de realizar qualquer tipo de avaliação ou exame no médium sem autorização judicial. Em nota, o MP-GO informou que a decisão infringe a independência funcional do Ministério Público, que “tem a prerrogativa de ter acesso a pessoas presas, onde quer que estejam”.  O texto ainda afirma que o texto foi proferido sem ouvir a instituição e que as avaliações médicas de presos não dependem de decisão judicial.  Confira a nota na íntegra no final da matéria. 

Relembre

Réu em oito processos por abuso sexual e posse de arma,  João de Deus continua internado no Instituto Neurologia de Goiânia por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). De acordo com relatórios médicos apresentados pela defesa, o médium não tem condições de voltar ao presídio. Para o MP, nunca houve necessidade de o acusado deixado o presídio.

João de Deus foi preso no dia 16 de dezembro de 2018 e levado ao Núcleo de Custódia de Aparecida de Goiânia, sob acusação de violação sexual mediante fraude, além de estupro de vulnerável e nega os crimes.

Nota do MP-GO

ESCLARECIMENTOS SOBRE O PROFERIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL
1) A DECISÃO PROFERIDA PELO JUÍZO DA COMARCA DE ABADIÂNIA INFRINGE A INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, O QUAL TEM A PRERROGATIVA DE TER ACESSO A PESSOAS PRESAS, ONDE QUER QUE ESTEJAM, COMO TAMBÉM AFRONTA O PODER/DEVER DE QUE DISPÕE O MINISTÉRIO PÚBLICO PARA REALIZAR INVESTIGAÇÕES.
2) A DECISÃO FOI PROFERIDA SEM PRÉVIA OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, BASEANDO-SE TÃO SOMENTE EM PEDIDO FORMULADO PELA DEFESA TÉCNICA DO ACUSADO JOÃO TEIXEIRA DE FARIA, SEM
QUE O MINISTÉRIO PÚBLICO TIVESSE A OPORTUNIDADE DE ESCLARECER AS RAZÕES QUE JUSTIFICARAM AS REQUISIÇÕES DE ATENDIMENTO MÉDICO EFETUADAS.
3) AVALIAÇÕES MÉDICAS DE PESSOAS PRESAS NÃO DEPENDEM DE DECISÃO JUDICIAL.
4) A DECISÃO DO STJ, AO DETERMINAR A INTERNAÇÃO DO PRESO JOÃO TEIXEIRA DE FARIA, NÃO VEDOU SUA AVALIAÇÃO POR OUTROS MÉDICOS IMPARCIAIS, TAIS COMO OS MÉDICOS DO NÚCLEO DE CUSTÓDIA.
5) A PARTIR DISSO, O MINISTÉRIO PÚBLICO, AO CONSTATAR CONTRADIÇÕES ENTRE INFORMAÇÕES MÉDICAS OBTIDAS JUNTO A UNIDADE PRISIONAL E AS OBTIDAS COM OS MÉDICOS PARTICULARES, INICIOU APURAÇÕES COM FUNDAMENTO EM SEUS DEVERES E PRERROGATIVAS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS.