Livro debate trabalho escravo contemporâneo no Brasil e no mundo
De acordo com dados da OIT (Organização Internacional do Trabalho), em 2017, cerca de 40 milhões estavam em situação análoga à escravidão
Em 2014, em uma visita para fiscalização de denúncias de trabalho escravo em Lábrea, interior do Amazonas, conhecido pela extração de castanha-do-pará, André Esposito Roston, um auditor-fiscal do trabalho, encontrou Osvaldo. Único proprietário de castanhais em uma área de cerca de 300 km, somente ribeirinhos autorizados podiam fazer a catação e a quebra da castanha.
Os trabalhadores tinham a obrigação de entregar toda a colheita a ele. Não recebiam nenhum dinheiro durante todo o período da safra, e o valor era entregue somente após Osvaldo negociar o produto na cidade de Lábrea.
Nesse meio-tempo, para sobreviver e trabalhar, os ribeirinhos compravam produtos básicos do patrão, acumulando dívidas. Por vezes, segundo Osvaldo, seus trabalhadores recebiam entre R$ 100 e R$ 200 por safra.
Em “Escravidão Contemporânea”,organizado por Leonardo Sakamoto, que também é diretor da ONG Repórter Brasil e conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão, o jornalista reúne especialistas sobre trabalho escravo contemporâneo para debater como a situação se insere no Brasil e no mundo e o que tem sido feito para erradicá-lo.
O livro passa pela Lei Áurea até o ciclo na borracha, a fase do período militar com o Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia) e aponta aspectos positivos e negativos nas legislações ao longo da história para combater o trabalho escravo, dando destaque para países como Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e França.
De acordo com dados publicados pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), em 2017, cerca de 40 milhões estavam em situação análoga à escravidão. Desse total, 15 milhões de trabalhadores estavam em situação de trabalho forçado, sendo 23,4% no trabalho doméstico, 18,2% na construção civil, 15,1% em manufaturas e 11,3% no agronegócio, entre outros.
No Brasil, o trabalho escravo na história recente é marcado por problemas com educação e, em sua maioria, por homens negros, voltando para o trabalho rural.
Segundo dados do Programa Seguro-Desemprego do extinto Ministério do Trabalho, 70% dos trabalhadores libertados têm baixíssima escolaridade. Desse total, 31% são analfabetos e 39% não chegaram a concluir o quinto ano do ensino fundamental. Os dados foram coletados entre janeiro de 2003 e junho de 2008.
Os autores ressaltam que pessoas que estão em condições de trabalho análogo à escravidão são são trabalhadores de baixa renda e, por consequência, são mais vulneráveis e caem em falsas promessas de aliciadores -conhecidos como “gatos”.
Além da questão financeira, acabam sendo chantageados, estabelecendo uma relação de dependência financeira e também emocional.
Ainda de acordo com o Programa de Seguro-Desemprego, 94,8% dos resgatados eram homens. No entanto, segundo os autores, as estatísticas podem encobrir casos específicos de mulheres resgatadas, com em casos de exploração sexual.
No trabalho rural, os homens ficam destinados a funções como corte de cana, aplicação de agrotóxicos e outros tipos de colheita. Já as mulheres ficam responsáveis por trabalhos domésticos e, muitas vezes, ficam sujeitas à abusos sexuais ou são forçadas a se prostituir.
Para exemplificar, um caso nos arredores da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Na ocasião, mulheres tiveram dificuldades em garantir seus direitos como vítimas de trabalho escravo. Parte das autoridades não chegou a reconhecer que a atividade a que as mulheres eram submetidas era uma forma de trabalho.