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llan Goldfajn, ex-BC, será o primeiro brasileiro a comandar o BID

O economista Ilan Goldfajn — ex-presidente do Banco Central (BC) e diretor licenciado do Departamento…

O economista Ilan Goldfajn — ex-presidente do Banco Central (BC) e diretor licenciado do Departamento do Hemisfério Ocidental do Fundo Monetário Internacional (FMI) — foi eleito presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) neste domingo. Ilan será o primeiro brasileiro a comandar o banco de desenvolvimento, fundado em 1959. Ele venceu em primeiro turno, com o equivalente a 80% dos votos.

O Banco de desenvolvimento é responsável por gerir uma carteira com 616 projetos ativos em 27 países, com investimentos que somam US$ 56,2 bilhões. Somente no ano passado os desembolsos somaram US$ 12,5 bilhões. O Brasil é o país com a maior carteira de projetos do BID, com 82 projetos em andamento, à frente da Argentina (75), Paraguai (41) e Uruguai (38).

O BID já foi chefiado por um chileno, um mexicano, um uruguaio, um colombiano e, mais recentemente, pelo americano Mauricio Claver-Carone. Ele foi indicado no governo Donald Trump e deixou a instituição em setembro por recomendação da diretoria executiva do banco, após denúncias de relacionamento inapropriado com sua chefe de gabinete.

Ilan foi indicado para o cargo pelo atual governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) e chegou a enfrentar a resistência de parte dos assessores do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, tentou adiar a eleição do BID, sem sucesso. Mas, nos últimos dias, conseguiu obter declarações de aliados do petista, como o ex-chanceler Celso Amorim, que o novo governo não se oporia a seu nome, facilitando sua eleição.

O economista concorreu com outros quatro candidatos: Cecilia Todesca Bocco, indicada pela Argentina; Nicolás Eyzaguirre, ex-ministro da Fazenda dos governos de Ricardo Lagos e Michelle Bachelet e nomeado pelo Chile; Gerardo Esquivel Hernández, vice-presidente do Banxico (banco central mexicano) e indicação do México; e Gerard Johnson, nome de Trinidad e Tobago.

O Brasil nunca comandou a entidade, que tem mais de 60 anos. Nascido em Israel, mas crescido no Rio, Ilan é formado pela UFRJ e tem doutorado pelo MIT (EUA).

Em entrevista ao GLOBO, a primeira depois de assumir a candidatura, o economista disse que a relevância do BID é amplificada ante um cenário global turbulento, com alta de juros e desafios ambientais, ao mesmo tempo em que amplia as vantagens para a América Latina. Ele avalia que o Brasil poderia retomar seu papel de liderança.

— A região pode se posicionar como parte da solução dos atuais problemas globais — afirmou, citando a pandemia, a invasão russa à Ucrânia, os desafios energéticos e a busca de americanos e europeus de reduzirem a dependência chinesa.

Na sabatina aos governadores do BID (os ministros da Fazenda dos países que fazem parte do banco), defendeu temas como a ação contra as mudanças climáticas e a redução da pobreza.

Desafios pela frente

A economista e professora da Universidade Johns Hopkins, Monica de Bolle, avalia como bastante “significativo” a presença de um brasileiro na presidência do BID. Segundo a economista, o cargo possui um caráter não só técnico, mas também político e Ilan terá grandes desafios pela frente pelo passado recente da instituição.

— O Ilan é um grande economista, mas ele vai ter grandes desafios pela frente. As dificuldades vêm tanto da região do qual ela cuida, que nunca foi fácil e está passando por um momento de extrema complexidade.

Monica relembra que o BID é bastante dependente dos EUA e que os últimos presidentes americanos não tiveram uma política externa voltada para a América Latina.

— O governo americano, desde Obama, na verdade, tem tido uma postura radicalmente diferente em relação à América Latina, no que diz respeito à política externa. A política externa do Obama foi voltada à Ásia e no governo Trump, partes do governo voltadas para América Latina foram esvaziadas. E desde então isso não se recompôs com o Biden e não está em vias de se recompor.

Apesar das dificuldades, a professora da Universidade Johns Hopkins enxerga na eleição de Ilan uma possibilidade do Brasil se recolocar como uma liderança na região.

— Não vai ser fácil, mas espero que o Brasil tenha a capacidade de se colocar no palco internacional da forma que deveria, como uma importante liderança regional e tentando construir uma ponte com o governo americano. Esse também é um desafio para a nova gestão do BID.

Além de oferecer empréstimos e subsídios, o banco de desenvolvimento atua com cooperação técnica e pesquisas para o setor público e privado. Atualmente, o BID foca sua atuação sobre três desafios de desenvolvimento – inclusão social e equidade, produtividade e inovação e integração econômica – e em três temas transversais – igualdade de gênero e diversidade, mudança climática e sustentabilidade do meio ambiente, e capacidade institucional do Estado e Estado de direito.

O BID obtém recursos financeiros de seus 48 países-membros, além de captações nos mercados financeiros, fundos que administra e operações de cofinanciamento. O banco tem sede em Washington (EUA) e representações nos 26 países-membros da América Latina e Caribe, além de escritórios em Madri e Tóquio. O Brasil é o único país do mundo que tem dois escritórios do BID: há uma representação oficial em Brasília e outra em São Paulo.

Os países membros do BID são Alemanha, Argentina, Áustria, Bahamas, Barbados, Bélgica, Belize, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, Croácia, Dinamarca, El Salvador, Equador, Eslovênia, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Guatemala, Guiana, Haiti, Honduras, Israel, Itália, Jamaica, Japão, México, Nicarágua, Noruega, Países Baixos, Panamá, Paraguai, Peru, Portugal, Reino Unido, República da Coreia, República Dominicana, Suécia, Suíça, Suriname, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela.