Justiça

Mãe de garoto que morreu ao cair do 9º andar se matricula em curso de Direito

Mirtes Renata Souza Santana afirmou que a escolha do curso ocorreu durante a luta por justiça pela morte de Miguel

A mãe do menino Miguel Otávio Santana da Silva, 5, morto ao cair do 9º andar de um dos prédios do condomínio de luxo Pier Maurício de Nassau, localizado na área central do Recife, decidiu que vai cursar Direito no próximo ano para se tornar advogada. Mirtes Renata Souza Santana, 33, afirmou que a escolha do curso ocorreu durante a luta por justiça pela morte de Miguel, pois recebeu inúmeros pedidos de ajuda de mulheres em situação de vulnerabilidade.

O menino morreu ao cair de uma altura de 35 metros do prédio em que Mirtes trabalhava como empregada doméstica para o casal Sérgio Hacker (PSB), prefeito do município de Tamandaré (PE), e Sarí Mariana Gaspar Corte Real, primeira-dama do município, no dia 2 de junho. Hacker tentou se reeleger prefeito neste mês, mas perdeu.

Mirtes se matriculou em uma faculdade particular do Recife, depois de passar no vestibular há dois meses, mas terá parte do curso custeado por uma bolsa de estudos do programa Educa Mais Brasil. O restante da mensalidade ela mesma vai pagar, pois conseguiu um emprego como palestrante sobre temas étnicos-raciais e voltados às mulheres, por meio do grupo Curumim, entidade que atua no fortalecimento da cidadania de mulheres, dos direitos humanos e da igualdade étnico-racial e de gênero. Ela começa a trabalhar em dezembro.

Mirtes contou à reportagem do UOL que já planejava cursar uma graduação de nível superior, na modalidade a distância, para poder conciliar os estudos com os cuidados com filho e com o trabalho como empregada doméstica. O curso de Direito foi escolhido depois que ela perdeu o filho.

“Essa decisão de me tornar advogada, ao escolher o curso de Direito, me dá força de manter Miguel vivo no meu coração. Lutarei por justiça sempre. Miguel veio com a missão para eu ajudar pessoas que lutam por justiça. Diante de toda essa situação difícil que estou passando, muitas pessoas vêm me pedir ajuda também e isso acendeu essa vontade de ser advogada. Por isso, é importante eu cursar Direito para eu ajudar outras mães que estão precisando de ajuda”, destaca Mirtes.

“A Curumim que está em parceria com um coletivo quilombola dos Estados Unidos para apoiar três mulheres na América Latina e eu fui uma das escolhidas. Vou passar por um período de treinamento para depois trabalhar com palestras presenciais e online, além de oficinas. Como terei formação, vou exercer uma função de palestrante sobre temas relacionados às mulheres, aos direitos humanos e outros que poderei discutir qualquer tipo de assunto”, diz Mirtes.

A morte de Miguel

No dia da morte de Miguel, Mirtes levou o filho para o trabalho porque a creche em que a criança ficava estava com as atividades paralisadas devido à pandemia da covid-19. Ela tinha saído para levar o cachorro dos patrões para passear e deixou o filho com a patroa Sarí.

De acordo com denúncia do Ministério Público Estadual, Miguel foi deixado sozinho no elevador de serviço pela ex-patroa de Mirtes, se perdeu no prédio e morreu ao cair de uma das sacadas da edificação. Em setembro, Sarí se tornou ré pelo crime de abandono de incapaz com resultado morte, com os agravantes de cometimento de crime contra criança e em ocasião de calamidade pública (pandemia do novo coronavírus), conforme o CPB (Código Penal Brasileiro).

O crime de abandono de incapaz com resultado morte tem pena de 4 a 12 anos de prisão. Com os agravantes, a ré poderá pegar a pena máxima, caso seja condenada. Sarí aguarda o julgamento em liberdade provisória, após ter sido presa em flagrante e pagar R$ 20 mil de fiança.

A audiência de instrução para julgamento do caso está marcada para o próximo dia 3 de dezembro, às 9h, na 1ª Vara de Crimes Contra a Criança e o Adolescente da capital. A família de Miguel e coletivos de Pernambuco pretendem fazer um protesto na frente do prédio onde ocorrerá a audiência. O movimento ainda está sendo articulado.

A mãe de Miguel conta que nos últimos dias a ansiedade aumentou com a proximidade do dia da audiência de instrução sobre a morte de Miguel. “Estou confiante que tudo vai dar certo e a justiça pelo meu filho será feita. Recebi uma homenagem ontem que fizeram para mim e para Miguel. Nunca tinha viajado de avião, fui com minha mãe e tudo isso foi bem diferente para mim”, destaca.

Mirtes relata que a rotina dela mudou depois que o filho morreu, pois ficou desempregada, e recebe ajuda de pessoas que estão “na luta por justiça por Miguel”.