Mantega diz que não será ministro no governo Lula
Ex-ministro da Fazenda diz que não será titular de pasta e elogiou economistas da equipe de transição
Integrante do governo de transição, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega afirma ser necessário dar prioridade máxima à população mais pobre para o governo não se enfraquecer e que isso está por trás dos questionamentos feitos por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a exigências fiscais nesta semana.
“Ele não quer começar o governo com as mãos amarradas. Porque, se não, ele não vai longe. Se ele não conseguir atender rapidamente os anseios dessa população, o governo vai por água abaixo”, afirma à Folha. “Se ele fizer um governo medíocre como Bolsonaro, ele vai perder força política”, diz.
O mais longevo ministro da Fazenda do Brasil diz que não será titular de nenhuma pasta novamente e afirma que Lula foi mal interpretado nesta semana, reforçando o freio de arrumação que o partido resolveu dar um dia depois de a Bolsa cair em decorrência das falas do petista. Mais cedo, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, falou em responsabilidade fiscal “em primeiro lugar” e falou que o social e as contas públicas podem caminhar juntos.
“Não existe antagonismo [entre fiscal e social]”, diz Mantega. “Se você ouviu o discurso, ele falou [também] ‘olha, eu fui o presidente que mais manteve as contas públicas equilibradas na história do Brasil'”, diz o ex-ministro.
No entanto, Mantega ressalta que serão necessários gastos emergenciais no ano que vem e que é preciso estimular a taxa de investimento no Brasil, usando inclusive os cofres públicos —mas também despertando o interesse de investidores privados. “O governo Bolsonaro deixou o investimento cair e tirou o dinamismo na economia. Então nós precisamos recuperar esse dinamismo”, afirmou.
Segundo ele, o governo vai precisar de uma licença de R$ 150 bilhões a R$ 200 bilhões fora do teto em 2023 —inclusive para fazer a taxa de crescimento sair do 0,5% estimado por ele em 2023. Esse é um assunto já precificado pelo mercado, diz. Os números finais, em discussão por meio da PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, só devem ser definidos após conversa com o Congresso.
“Esse dinheiro vai voltar, porque essa população [mais pobre] consome. Você vai ter aumento de arrecadação”, diz. “Ela vai ajudar a mobilizar a economia também. Quer dizer, não é só um gasto, né? Também é um estímulo”, afirma.
Na sequência, durante o ano que vem, deve ser discutida a nova âncora fiscal do país para guiar as expectativas de médio e longo prazo. Há diferentes formatos ainda em discussão para a nova regra fiscal e, entre os modelos analisados está tirar os investimentos do teto de gastos.
Outro é estabelecer uma lógica para metas de resultado primário que variam conforme a condição da economia —necessidade de maior superávit em momentos de bonança e de um valor menor (ou até déficit) em momentos de esfriamento da economia.
Mas o assunto não é unanimidade nem dentro do PT, conta o ex-ministro. Mantega nega boatos no mercado de que o novo governo queira uma ampla revogação do arcabouço fiscal —que incluiria, além do teto de gastos, também a regra de ouro (que evita endividamento para gastos correntes) e a própria meta de resultado primário. “Nunca ouvi falar disso e acho difícil que isso esteja ocorrendo “, diz.
Mantega diz que seu trabalho na transição se limitará a remontar o antigo Ministério do Planejamento, inclusive para receber novamente a Secretaria de Orçamento Federal (hoje sob o guarda-chuva da Economia). Ele descarta ser ministro dessa e de qualquer outra área.
Os economistas escolhidos para a transição na economia são Persio Arida, André Lara Resende, Nelson Barbosa e Guilherme Mello. Para Mantega, é uma equipe de altíssimo nível e que reúne pensamentos distintos. “É o momento agora de a gente aproximar o pensamento para convergir em propostas é que sejam satisfatórias para todos”, diz. “Não significa que eles vão definir a estratégia. Já tem uma estratégia definida e eles vão ajudar nos detalhes dela”, diz.
Mantega concorda com a afirmação de um deles, Persio Arida, de que o governo não pode errar na largada. “Acho que é bastante salutar essa ideia. Não se pode queimar a largada”, diz. “Mas também não se pode mergulhar na estagnação que o Bolsonaro deixou. Você não pode também ficar na mesma”.