Marco Civil entra em vigor
O texto enfrentou resistência da oposição e de setores sensíveis ao tema
A chamada “Constituição da internet” passou a valer a partir desta segunda-feira, 23 de junho. O projeto que estabelece princípios para o uso da rede no Brasil foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff em 23 de abril. O texto do Marco Civil introduz mudanças em áreas delicadas como neutralidade de rede, liberdade de expressão e privacidade.
O texto enfrentou resistência da oposição e de setores sensíveis ao tema, como empresas do setor de telecomunicações e interessadas na proteção de direitos autorais, o que inclui companhias de TV e rádio. Uma das preocupações agora é com possíveis brechas que as teles tentarão encontrar no texto para não obedecer a exigência da neutralidade.
O Marco Civil da Internet foi um projeto construído colaborativamente após a criação de uma plataforma na web, criada pela Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça e o Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV/RJ, na qual cidadãos poderiam fazer comentários sobre o texto do projeto. O processo se estendeu de novembro de 2009 a junho de 2010 e acrescentou ao texto inicial mais de 2 mil contribuições.
NEUTRALIDADE
A exigência da neutralidade de rede é uma dos destaques do Marco Civil, que trata o tráfego de dados como a eletricidade ou o uso de uma estrada, ou seja, o serviço tem a mesma qualidade para todos e dados não podem ser diferenciados pelos provedores de conexão.
Isso quer dizer que o usuário, após contratar um serviço de internet em sua casa ou celular, tem a liberdade de acessar o que quiser, baixar o tipo de conteúdo que quiser, usar os serviços que quiser (redes sociais, e-mail, serviços de armazenamento na nuvem, blogs, rádios online, serviços de streaming, VoIP, etc) sem ter de pagar mais por isso.
Os provedores de conexão podem continuar vendendo velocidades de download diferentes, como 5Mbps ou 10Mpbs, mas não podem discriminar entre aplicativos ou sites específicos.
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
O Marco Civil pretende “assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura”, segundo seu texto. A partir de agora, um provedor de aplicações de internet (como o Facebook ou o Google, por exemplo) só poderá ser responsabilizado por eventuais danos que seu conteúdo tenha causada se “após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente”. Isso significa que uma empresa como o Google não pode ser punido por não cumprir uma notificação de usuário, que lhe indicou um conteúdo indevido. A punição só deve acontecer depois de ordem judicial.
O único caso de exceção está no Artigo 22, que diz que o provedor poderá ser punido caso não retire do ar “imagens, vídeos ou outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado sem autorização de seus participantes quando, após o recebimento de notificação pelo ofendido ou seu representante legal”, em referência ao que se costuma chamar de revenge porn – imagens íntimas publicadas por parceiros sexuais sem consentimento na rede.
PRIVACIDADE
Apesar de garantir o sigilo de dados e comunicações na internet, esta área tem pontos que enfrentaram críticas, mesmo de apoiadores do projeto. Segundo o texto, provedores de aplicações devem guardar registros de acesso de usuários (como, por exemplo, o dia e horário em que determinado IP entrou na internet) por até seis meses e registros de conexão (como no caso do tempo em que determinado pessoa, através de um IP, permaneceu online) por um ano, o que hoje é opcional.
O objetivo é ajudar em investigações policiais de pessoas que cometem crimes na rede. Críticos, porém, acreditam que faltam garantias de que estes dados estão protegidos do acesso sem justificativas do estado.
Ainda segundo o texto, sites e aplicativos precisam informar ao usuário quando e como coletam e usam seus dados, o que inclui seu compartilhamento com outras empresas. Foi o que fez o Facebook, por exemplo, em 2013 ao dividir sem pedir autorização dados de seus clientes com o aplicativo Lulu.