Me sinto muito culpada, diz mãe de Henry ao pai dele, após uma semana da morte
Conversa com o avô da criança faz parte do conteúdo recuperado pela polícia no celular de Monique
Isolada em uma cela no Hospital Penitenciário Dr. Hamilton Agostinho, no Complexo de Gericinó, onde recebe tratamento contra a Covid-19, Monique Medeiros da Costa e Silva passa o tempo lendo a bíblia e escrevendo cartas. Além da de 29 páginas em que narrou um relacionamento de ciúmes, humilhações e agressões com o namorado, o médico e vereador Jairo Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho (sem partido), a professora tem dedicado correspondências também aos seus pais. Eles foram justamente seus principais interlocutores no período de 31 dias entre a morte do filho, Henry Borel Medeiros, de 4 anos, e a prisão do casal, em 8 de abril.
Mensagens recuperadas pela Polícia Civil no celular de Monique, que constam no inquérito que apura o homicídio duplamente qualificado, com emprego de tortura e impossibilidade de defesa do menino, e obtidas com exclusividade por O GLOBO, mostram 360 diálogos entre a família. Com o pai, o funcionário civil da Aeronáutica Fernando José Fernandes da Costa e Silva, Monique trocou 134 mensagens entre 13 e 24 de março. Dois dias depois, policiais da 16ª DP apreenderam quatro aparelhos celulares da família na casa onde moram, em Bangu.
Ao idoso, a quem a professora identifica como “papy”, ela escreve, à 1h18 de 15 de março: “Devo merecer o que está acontecendo. Tudo foram escolhas minhas. Agora estou colhendo. Me sinto muito culpada.” O pai então responde: “Todos nós erramos.” E Monique argumenta: “Eu deveria ter colocado ele na cama dele que era mais baixa. Deveria ter dormido no quartinho dele com ele”. E Fernando rebate: “Nada acontece se Deus não permitir.”
Já com a mãe, a também professora Rosângela Medeiros da Costa e Silva, a moça trocou 226 textos, ligações e arquivos. No dia anterior ao sepultamento do neto, no Cemitério do Murundu, em Realengo, Rosângela escreveu à filha: “Dizia para o Henry que ninguém o amava mais que você. E eu lhe digo, ninguém a ama mais que eu. Quero estar com você. Não me deixe estar longe de você. Eu lhe peço. Vamos juntas despedir do Henry.”
No dia 16 de março, Monique contou estar indo para o escritório do advogado André França Barreto, que, na ocasião, representava o casal. Ela disse ter passado por “sete horas de interrogatório” no local durante o dia anterior, “fazendo um possível inquérito” e escreve: “Que Deus me ajude”. Rosângela, identificada como “mamy” em sua agenda, então responde: “Isso tudo vai passar. Foi o que eu lhe disse. Tem coisas que nós, mães não conseguimos evitar que o filho passe. Estou em oração por você e Deus escuta nossas orações.”
As duas continuam conversando e, quatro minutos depois, a avó de Henry envia a Monique: “Você foi a melhor mãe para o seu filho. Tenha certeza do que você foi e ele será sempre grato. Te amo e rezo sempre. Não tenha medo de nada. O que não foi feito ou da maneira que foi feito foi o seu entendimento como mãe. Mãe quer sempre educar mesmo que muitas vezes nos parece errado. Te amo. Isso tudo vai passar. Entregue a Deus a sua vida e espera a recompensa.”
Em depoimento prestado na 16ª DP (Barra da Tijuca), em 24 de março, Rosângela, que definiu o neto como um menino doce, tímido, introvertido, educado e excelente aluno, disse ter recebido uma ligação de Monique, na madrugada do dia 8, dizendo: “Mãe, o Henry não está respirando!” e imediatamente se dirigiu ao Hospital Barra D’Or com o outro filho. Durante o trajeto, ela ligou novamente insistindo: “Mãe, vem para cá”. Minutos depois, disse ter recebido o terceiro telefonema, quando soube que o menino havia falecido. Chegando a unidade de saúde, Rosângela contou que encontrou a filha “desolada”.
Questionada sobre a causa da morte de Henry, Rosângela informou que “pelo que soube” ele “teve um problema no fígado, uma hemorragia causada por uma queda”. No dia 12 de abril, no entanto, a babá Thayna de Oliveira Ferreira, ouvida pela segunda vez na delegacia, relatou ter contado a idosa sobre o episódio de “chutes” e “bandas” de Jairinho contra Henry, em 12 de fevereiro, no apartamento onde viviam, no Condomínio Majestic, no Cidade Jardim. A professora teria “ficado assustado” com o que ouvira da funcionária.