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Médico defende lockdown contra parente que iria para balada e é agredido

O médico infectologista José Eduardo Panini, de 31 anos, sofreu uma agressão dentro de casa…

O médico infectologista José Eduardo Panini, de 31 anos, sofreu uma agressão dentro de casa ao defender o lockdown vigente desde sexta-feira (26) no Paraná. O crime aconteceu após questionar um familiar que pretendia furar o isolamento, no mesmo dia da publicação do decreto do governo estadual.

De acordo com o médico, que atua na rede pública e privada de Toledo, na região Oeste do Paraná, a intenção era alertar o parente sobre os riscos que poderia colocar a família ao sair para a balada em um momento de pandemia. A região tem 97% de ocupação dos leitos de UTI (Unidades de Terapia Intensiva) para covid-19, a maior taxa do estado, segundo o governo paranaense.

O familiar, que até então morava com o médico, teria se irritado com a orientação e partido para cima do infectologista. A vítima conta que um amigo do agressor ainda chegou a ajudar no crime, o imobilizando. Ele sofreu socos no rosto e também levou um golpe “mata-leão”.

Além do médico, a esposa dele também teria sofrido agressões verbais do familiar. Ambos registraram boletim de ocorrências na Polícia Civil. Panini preferiu não revelar a identificação e o grau de parentesco de quem o agrediu – a reportagem será atualizada caso haja um posicionamento.

“Diante do decreto de lockdown, ao chegar em casa, depois de uma reunião, minha esposa estava aflita, pois um parente nosso pegou o carro informando que iria para uma balada. Eles começaram uma discussão grave e me intrometi para explicar a situação, orientando que a situação era muito grave porque a condição do Paraná piorou muito e que precisaria ficar em casa em razão do risco. Num determinado momento, ele começou a me agredir com ajuda de um amigo que me imobilizou”, narra o médico, que teve covid-19 na pandemia e precisou de internação.

O caso foi levado às redes sociais pela vítima. Ele compartilhou no Instagram uma foto com hematomas no rosto. A publicação teve mais de 9 mil curtidas e dois mil comentários de apoio.

“O desânimo não vem! E junto com eles temos muita coisa boa, progresso, vacinas e tudo que vai fazer sairmos dessa pandemia! E aos trabalhadores da saúde muita força!”, escreveu.

Ele conta que publicou o caso nas redes sociais como uma maneira de desabafar sobre a indignação.

“Sempre busco criar o menor alarde possível. Meu registro nas redes sociais foi uma indignação por trabalhar com um tapa olho para esconder a lesão e aquilo atrapalha muito, tanto que pedi afastamento até conseguir me recuperar do hematoma. Esse fato me deu até um ânimo para colocar em prática tudo o que estudo sobre a covid-19 ao longo deste tempo”, comentou.

“É reflexo do negacionismo”

O médico que atua na linha de frente de combate à covid-19 em Toledo, que já registrou 143 mortos pela doença, afirma que o caso reflete o que parte dos profissionais enfrenta no cotidiano: a negação das pessoas sobre a pandemia.

“Isso é reflexo do negacionismo das pessoas. Elas negam o que acontece. Estamos vendo uma piora nos números e nada é feito e quando uma medida é tomada, a população não respeita. Tentamos ajudar os nossos familiares, mas nem eles estamos conseguimos convencer. É algo frustrante, parece que estamos enxugando gelo”, lamentou.

Prefeitura repudia; Polícia Civil investiga

Panini atua na rede pública de Toledo. O município afirmou, em nota, que “toda a agressão é injustificável e inaceitável”.

“Desejamos ao Dr. Panini pronta e completa recuperação. Informações preliminares dão conta de que o fato reprovável se deu fora do ambiente e horário de trabalho, portanto, não tendo relação direta com o exercício profissional. Ainda assim, o município de Toledo se coloca à disposição do profissional para todo o suporte que for necessário”, complementou.

Também em nota, o Conselho Municipal de Saúde criticou o ato contra o médico. “O conselho se manifesta com repúdio e pode que os autores sejam identificados e punidos. Aos profissionais de saúde que enfrentam as mais diversas dificuldades para atender toda a população, nosso reconhecimento e empatia em um momento de absoluta tensão e risco”, diz um trecho do documento, assinado pelo presidente Teomar Jantsch.

O caso é investigado pela Polícia Civil, em Toledo. Está previsto para hoje o exame de corpo de delito da vítima no IML (Instituto Médico Legal). Procurada pela reportagem, a corporação informou que, apesar de haver o registro e investigação em uma delegacia, o caso é tratado pela SESP (Secretaria de Segurança Pública) por envolver um assunto sobre a covid-19. A pasta ainda não retornou aos questionamentos do UOL.

O CRM (Conselho Regional de Medicina) do Paraná prometeu que acompanhará o caso institucionalmente.

Paraná em lockdown

Desde meia-noite de sábado (27), o Paraná está em lockdown. A medida segue pelos próximos nove dias. Todos os serviços não essenciais terão que ficar fechados, podendo reabrir a partir das 5h de 8 de março. Além disso, haverá toque de recolher das 20h às 5h. Ou seja, está proibida a circulação em vias públicas neste horário.

Dados da Regulação de Leitos Estadual divulgados ontem mostram que o Paraná somou 3.650 pessoas internadas em leitos destinados para covid-19. Outros 616 aguardavam por transferências, sendo 387 pela Regulação do Estado e 229 pela Central Metropolitana de Leitos de Curitiba. Os números de ontem eram os maiores desde o início da pandemia. A taxa de ocupação de leitos no Paraná é de 92%.