RIO DE JANEIRO

Médico denuncia agressão ao tentar acabar com festa durante pandemia

Um médico de 41 anos afirma que foi agredido por um empresário no dia 20…

Um médico de 41 anos afirma que foi agredido por um empresário no dia 20 de junho deste ano, no condomínio Península, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro, ao tentar acabar com uma festa que ocorria durante a madrugada no apartamento vizinho ao seu. O profissional de saúde, que prefere não ter seu nome divulgado, relata que levou um soco de Fernando Trabach Gomes Filho, de 27 anos, apontado por ele como locatário do imóvel. O caso foi registrado na 16ª DP (Barra da Tijuca).

Ao GLOBO, o médico contou que, desde maio, quando Fernando passou a morar no apartamento, são realizadas inúmeras festas no local, mesmo com a pandemia do novo coronavírus. Segundo ele, nos eventos, há aglomeração e música alta durante a madrugada. Além disso, os convidados transitam sem máscaras pelo condomínio. O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, é um dos moradores do Península.

O médico relata que os eventos já foram alvo de diversas denúncias por parte de vizinhos, e, segundo ele, o empresário foi multado pelo condomínio. Em uma ocasião, em maio, ele afirma ter conseguido conversar com Fernando para que uma festa terminasse. No início da madrugada de 20 de junho, ele afirma ter ido novamente ao apartamento para falar com o vizinho.

— Pedi para um funcionário do prédio me acompanhar (ao apartamento). Chegando lá, eu disse a ele (Fernando) que a música estava muito alta e que eu tinha plantão no dia seguinte, mas ele estava extremamente agressivo e falou obscenidades da minha mãe e minha esposa. Em seguida, me deu um soco, quebrou meus óculos e abriu meu supercílio — relata o médico, que depois da agressão chamou a Polícia Militar e o síndico.

Empresário não foi para delegacia

Segundo relatos do médico e também dos policiais que atenderam a ocorrência, Fernando recusou-se a ir para a delegacia, alegando que o PM não possuía uma ordem judicial para encaminhá-lo para a unidade. Segundo os policiais, Fernando foi alertado de que isso não era necessário, pois se tratava de um caso de flagrante, uma vez que ele estava sendo acusado pelo vizinho de uma agressão que acabara de acontecer.

Ainda segundo o depoimento dos policiais na 16ª DP, após um período de resistência, Fernando concordou em ir para a delegacia. No entanto, afirmou que estava sem os documentos e disse que iria até em casa buscá-los. O empresário acabou não retornando e não foi levado para a unidade.

Mesmo sem a presença de Fernando, o caso foi registrado na 16ª DP. Apesar dos relatos dos policiais e testemunhas sobre a negativa do empresário de ir para a delegacia, a assessoria de imprensa do advogado Carlos Felipe Guimarães, que defende Fernando, alegou ao GLOBO que não foi constatado qualquer crime pelos policiais militares que atenderam a ocorrência. “Caso acontecesse, seria dada voz de prisão e todos os envolvidos seriam conduzidos à delegacia”, diz o comunicado da assessoria.

Confrontada com as informações sobre as tentativas de levar o empresário para a delegacia, a assessoria acrescentou que contesta a informação. O advogado alega ainda que não houve festa ou aglomeração no apartamento de Fernando.

Xingamentos e ameaças

Ainda em seu depoimento na delegacia, um dos policiais militares que foram acionados para o prédio afirmou que Fernando chegou a afirmar que ele estava “comprando barulho errado” e também que o PM não sabia com quem estava lidando, pois ele ligaria para a corregedoria.

O GLOBO teve acesso a um vídeo que foi filmado pelo médico agredido. Na gravação, que foi entregue à polícia, ele não aponta o celular para o empresário e outros presentes, e durante quase todo o tempo filma o chão. No entanto, é possível ouvir parte da discussão que estava ocorrendo no corredor do prédio após a chegada da PM.

Um dos diálogos, segundo o médico, ocorreu entre Fernando Trabach e o síndico. “Deixa eu falar uma coisa pro senhor? Eu não lhe perguntei porra nenhuma, então cale a sua boca, seu velho de merda”, diz o empresário. O síndico então responde que oito apartamentos ligaram reclamando de Fernando. “Faz um favor pra mim, gagá? Mande a multa, mande a multa”, retrucou o empresário.

Outro diálogo no vídeo, segundo o médico, ocorre entre Fernando e um dos policiais militares. Nele, é possível ouvir quando um homem, que seria o empresário, afirma que não irá para a delegacia. “Cadê o mandado? Desculpa. Vai ficar na vontade”.

Em outro momento, o homem diz para o policial que ele é seu funcionário. “Eu não sou seu funcionário. Sou funcionário da população do estado do Rio de Janeiro”, retruca o PM.

Procurado pelo GLOBO, o síndico Dirceu Castro confirmou que foi acionado com a chegada dos policiais no dia 20 de junho e também que se desentendeu com Fernando naquela ocasião.  Ele, no entanto, afirma que não considera ter sido ofendido.

— Tenho 71 anos, sou velho mesmo — desconversa.

Indagado sobre as denúncias de festas realizadas no apartamento do empresário, Dirceu disse que as constatações foram de som alto. Sobre outras ocasiões em que Trabach foi multado, ele disse ao GLOBO que não poderia falar sobre o assunto.

Outra acusação de agressão

O médico e sua esposa, que também prefere não se identificar, afirmam que, mesmo após o episódio, as festas continuam a acontecer no apartamento. A mulher afirma que no dia 5 de julho resolveu ir até o corredor para filmar a movimentação de pessoas entrando e saindo do apartamento de Fernando. Ela afirma que, naquele momento, acabou encontrando com o empresário e seu irmão, Luís Fernando Trabach, de 21 anos. Os dois, segundo ela, arrancaram o celular de sua mão e lhe empurraram. Em seguida, Fernando teria pisado no telefone. Um registro online foi feito pela mulher, que alega ter sido internada após a agressão.

— Fiquei 8 dias internada. Tive um síncope nervosa. O que dizem é que tive um curto neurológico e no coração — explica ela.

Os irmãos Fernando e Luís Fernando são esperados para prestar depoimento na 16ª DP na próxima sexta-feira. O médico e sua mulher relatam que as festas continuam a ocorrer, mas sempre nos fins de semana. Por isso, quando o profissional de saúde não está de plantão, eles procuram viajar.

— Essa situação toda ficou muito traumática pra mim e para a minha família. E é um desrespeito inacreditável o que ele faz. Além da agressão contra mim em si, ele ainda está ajudando a disseminar essa doença de forma totalmente irresponsável — afirma.

Preso duas vezes

Fernando Trabach Gomes Filho, de 27 anos, já foi preso duas vezes em 2017. Em agosto, ele foi capturado ao chegar ao Batalhão Especial Prisional, que na época ficava em Benfica, para visitar o pai, que estava preso.

Fernando, acusado por prática de crime de organização criminosa, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro, teve a prisão decretada porque retirou caixas de pertences da residência de seu pai, no condomínio Golden Green, na Barra da Tijuca. O pai do empresário, Fernando Trabach Gomes, estava preso sob a acusação de ter fraudado licitações.

Em escutas telefônicas interceptadas com autorização da Justiça, Fernando, o pai, sugere a uma advogado o pagamento de propina para um juiz e chega a sugerir que “arrumem um jeito do juiz bater de carro”.

Três meses depois, em novembro, pai e filho foram presos novamente, acusados de darem golpes na construções de empreendimentos imobiliários em Resende. Segundo as investigações, eles arreceadaram dinheiro dos compradores, mas nunca entregaram a obra. Segundo as investigações, a intenção do grupo nunca foi de entregar os empreendimentos.