Modelo chinês que transforma sala de casa em galpão chega ao Brasil
Quando a pandemia eclodiu, Ana Carolina Pais e Guilherme dos Santos Silva não imaginavam que…
Quando a pandemia eclodiu, Ana Carolina Pais e Guilherme dos Santos Silva não imaginavam que seu lar, um apartamento de 47m² no Campo Limpo, Zona Sul de São Paulo, seria transformado em um minigalpão para recepção e entrega das compras feitas por seus vizinhos. Dois anos depois, giram entre R$ 40 mil e R$ 50 mil em itens que eles mesmos cuidam de separar e entregar.
Eles são a nova fronteira do varejo. Para além da chamada última milha, é uma batalha travada na última quadra. Um modelo inspirado em negócios chineses como Nice Tuan e Xingsheng, investidas das gigantes Alibaba e Tencent para alcançar cidades pequenas. Especialistas, no entanto, têm dúvidas de que o modelo vá pegar por aqui.
Nesse formato, não há lojas por todo canto: são moradores locais, que cuidam de atrair clientes e atendê-los. Pioneira nesse modelo no Brasil, a Mercado Favo já conta com mais de 7 mil pessoas cadastradas na ponta, a maioria em regiões periféricas da Grande São Paulo.
— Há vezes em que tem 50 pedidos em um dia — conta Ana Carolina.
Até a Covid deixar todo mundo em casa, ela trabalhava em uma empresa de móveis para escritório. Enquanto as vendas ali estancavam, o “Mercadinho da Carol e do Gui”, inaugurado um mês antes de eclodir a pandemia, florescia.
Do carro para galpão em casa
O plano do casal era que essa atividade os aliviasse da parcela mensal do financiamento da casa em que moram, em torno de R$ 2 mil.
— Hoje estamos com um ganho de R$ 5 mil a R$ 7 mil por mês — conta ela, que graças ao volume vendido, está mais perto da ponta mais alta da faixa de comissões paga pela Mercado Favo, de 7% a 15% das vendas.
Motorista de aplicativo, Guilherme também viu seus rendimentos irem a zero com a pandemia.
— Dirigi por dois, três anos. No início era bom — conta ele, que agora não quer mais voltar para as ruas.
A freguesia potencial do casal é grande. Ao redor do seu condomínio há outros 40. Mas eles não devem ir tão longe, a fim de não perder a proximidade que propicia a isenção de frete, um dos três pilares do negócio.
O modelo é calcado ainda na prática de preços semelhantes ao de mercados de atacarejo, em média 15% abaixo dos preços cobrados no varejo comum. O tripé da estratégia se completa com a ausência de um mínimo para compras.
Segundo Marina Proença, cofundadora e sócia da Mercado Favo, uma pessoa pode ganhar de R$ 4 mil a R$ 8 mil de comissão por mês, trabalhando de quatro a sete horas por dia.
1,5 milhão de unidades com galpão por mês
O peruano Alejandro Ponce, presidente da empresa, explica que essa tática visa a atrair a classe C, que para na barreira da última milha ao recorrer ao comércio eletrônico. Além de ter ido à China aprender sobre o modelo, ele traz a vivência de oito anos à frente da maior rede varejista do Peru.
Experiência mais que bem-vinda para dar conta do desafio que o negócio representa, na opinião do sócio da consultoria Performa Partners, André Pimentel:
— Para que seja competitivo em preço, ele tem que aumentar a escala, e eu vejo um desafio monstruoso para que esse modelo de negócio seja competitivo em escala
No Peru, a Mercado Favo tem uma operação de porte semelhante ao da brasileira. Segundo Ponce, juntas elas processam atualmente mais de 1,5 milhão de unidades por mês. Nos cálculos de Pimentel, todo esse volume caberia em uma boa loja de atacarejo, com folga.