Moradores de ruas se multiplicam em praças, prédios históricos e vias nas capitais
Crescimento dessa população se repete pelo país, conforme observado pela Folha, ao longo da pior crise econômica enfrentada pelo país e sua resultante de 13 milhões de desempregados. Não há, porém, estatística com critério uniforme para avaliação
Em 2013, Carlos Alberto dos Santos, 55, ajudou a erguer o estádio da Fonte Nova para a Copa do Mundo. Em 2016, após perder o emprego, brigar com familiares e passar a usar crack, ele morava nas ruas do centro de Salvador.
A trajetória ecoa a de muita gente em situação de rua. “Trabalhei 26 anos com carteira assinada e hoje estou aqui”, diz, ao se encolher em meio a outras 12 pessoas sob um viaduto no bairro do Politeama.
O crescimento dessa população se repete pelo país, conforme observado pela Folha, ao longo da pior crise econômica enfrentada pelo país e sua resultante de 13 milhões de desempregados. Não há, porém, estatística com critério uniforme para avaliação.
Com o frio de julho, os problemas enfrentados por essas pessoas se acirram, sobretudo em capitais como Curitiba e Porto Alegre. Na segunda (8), quando fazia 3°C, um morador de rua de Curitiba, sexagenário, foi recolhido por policiais com sinais de hipotermia e acabou morrendo.
Em Porto Alegre, em uma noite em que a temperatura em chegou a 2°C, Edson Luís Barbosa, 50, viu seu barraco no centro pegar fogo acidentalmente e perdeu o abrigo. “Uma mulher nos entregou dois cobertores, mas ainda assim foi congelante”, diz Barbosa, que há seis anos deixou com a mulher o bairro onde morava para fugir do tráfico.
No Rio, o número de moradores de rua contados pela prefeitura quase triplicou de 2013 a 2016, para 14.279 pessoas. Depois, a gestão Marcelo Crivella (PRB) mudou a metodologia e contou menos de 5.000 pessoas nessa situação -especialistas contestam. As marquises do centro ficam lotadas, com fila para a sopa levada por voluntários, e até na praia se dorme.
Em Porto Alegre, a prefeitura estima em 4.000 as pessoas nas ruas, o dobro do registrado em 2016. Em Curitiba, o avanço foi de 50% em três anos, para 2.186 neste ano. Não há levantamento anual em Belo Horizonte, Recife, Salvador e Fortaleza, mas ONGs que atuam com pessoas em situação de rua confirmam o aumento recente.
Na capital baiana, a prefeitura tem cadastradas 5.900 pessoas. Contudo, um estudo feito em 2017 pela ONG Projeto Axé aponta de 14 mil a 17 mil pessoas nas ruas de Salvador.
O problema também avança no Recife. “Um termômetro é o número de quentinhas que distribuo em um dia. Mais de 3.000”, diz a assistente social Renata Cavalcanti Damasceno, da ONG Missão Solidária.
A prefeitura estima 1.220 pessoas nas ruas, mas usa dados de 2016. Entre os cadastrados não está Janaína de Santana, 36, que no ano passado deixou o barraco em uma comunidade da zona norte em busca de comida e dinheiro com os dois filhos pequenos. Com um colchão e algumas roupas, vivem diante do Tribunal de Justiça de Pernambuco.
Marcos Cândido, cofundador do Projeto Axé, que atende crianças em situação de rua na Bahia há 30 anos, afirma que a mitigação do problema passa por acolhimento, educação e oportunidade. “É uma população que tem a mesma demanda que qualquer outro ser humano, trabalhar e produzir. Elas vão para a rua pela sobrevivência.”
As prefeituras afirmam trabalhar no acolhimento. No Rio, as abordagens a moradores de rua triplicaram desde 2015, para 140 mil no ano passado, com 2.400 pessoas acolhidas por mês nesse período.
A de Belo Horizonte diz ter equipes com 97 profissionais para o atendimento, e a de Salvador afirma ter 9 unidades de acolhimento e a meta de chegar a 14 neste ano, com 700 vagas. Recife anunciou um abrigo noturno para 200 pessoas e três restaurantes populares.
Curitiba dispõe 1.200 vagas em casas de acolhimento, e Porto Alegre diz manter 415 vagas em albergues e 37 pessoas com Aluguel Solidário. Florianópolis afirma ter intensificado a abordagem com a oferta de abrigo, refeições e passagens de ônibus para que migrantes retornem. A de Fortaleza não informou ações.