Motoboy

Motoboy diz ter sido parado 6 vezes pela polícia após jovem ser morto por falso entregador

Marcos Cardoso Alves, 46, diz ter sido parado seis vezes pela Polícia Militar no mesmo dia e na mesma rua no Jabaquara, zona sul, na semana passada

Foto: Mercado e Consumo - Reprodução

A onda de casos de roubo e violência envolvendo falsos entregadores de serviços de aplicativos em São Paulo piorou a vida dos motoboys, segundo profissionais da área.

Marcos Cardoso Alves, 46, diz ter sido parado seis vezes pela Polícia Militar no mesmo dia e na mesma rua no Jabaquara, zona sul, na semana passada. “Me sinto oprimido, constrangido”, disse à reportagem.

Para o motoboy, que é registrado, mas também trabalha como autônomo, as abordagens se devem à morte de Renan Silva Loureiro, 20. No último dia 25, o jovem foi assassinado em uma rua no Jabaquara após reagir a um roubo cometido por um falso entregador.

Alves diz que a polícia se tornou mais “opressora”. Além disso, a seu ver, a população teria passado a desconfiar de todo e qualquer motoboy por não saber distinguir os trabalhadores dos criminosos.

“Sou a favor da polícia, das blitze, mas eu me sinto oprimido”, afirma Alves. “Até ontem, na pandemia, nós éramos anjos, heróis. Agora temos a ingratidão do governo, da população. Viramos vilões. Para levar comida para casa, sobreviver, a gente paga o preço do racismo, da discriminação contra motoboy, da opressão da polícia, do risco dos acidentes, de ser roubado. Tudo sem nenhuma ajuda dos aplicativos.”

Negro, Alves diz ignorar episódios de racismo por não ter tempo de sequer ir à delegacia fazer uma denúncia. “Se o cliente não gosta de preto, não me importa. Eu digo ‘está aqui sua entrega’ e meto a marcha [segue em frente].”

Para o presidente do Sindimotosp, Gilberto Almeida dos Santos, há exagero nas abordagens policiais.

Ele diz temer que o aumento do efetivo policial anunciado pelo governador Rodrigo Garcia cause um aumento de abordagens de trabalhadores sem que haja um retorno em melhora na segurança pública. Para ele, a polícia não consegue distinguir entregadores de criminosos.

Santos atribui o quadro atual à falta do cumprimento da lei municipal 14.491/07. O texto, de 2007, proíbe o uso de “bags” (as mochilas de entrega) em toda a capital paulista.

“Há uns cinco anos apareceu o iFood, dominou o mercado e nunca respeitou a lei. Às vezes, o iFood manda mensagem e diz que vai trocar as ‘bags’, aí aparece com carretas cheias de mochilas e distribui. Parte dessas bags está sendo usada para roubar”, diz Santos.

Santos afirma que os governos estadual e municipal são coniventes com o desrespeito à lei.

“Há uma atividade regulamentada sendo explorada de maneira indevida e [o governo] não faz nada. Coloca policiais na rua para tapar o sol com a peneira.”

A lei 14.491/07 diz que qualquer condutor autônomo ou empregado por pessoa jurídica pode oferecer o serviço caso tenha licença para a operação e tenha o Cadastro Municipal de Transportes. O motoboy deve ter o Condumoto, que permite a prestação do serviço de transporte de pequenas cargas.

Quando o assunto são os equipamentos para o exercício da atividade, a lei municipal lista como obrigatórios: baú, colete de proteção com identificação do condutor e capacete automotivo certificado pelo Inmetro e com identificação do condutor.

Questionada sobre o descumprimento da lei municipal, a prefeitura disse que “estuda a melhor forma de regulamentar o serviço dos aplicativos de entrega, buscando desenvolver uma legislação adequada às inovações tecnológicas e levando em conta a atual questão social e a necessidade de emprego desses entregadores”.

A gestão municipal diz fiscalizar o cumprimento da lei por meio de agentes do Departamento de Transportes Públicos. A prefeitura não respondeu por que não exige o cumprimento da regra por parte de aplicativos de entrega como o iFood, por exemplo, que vende as “​bags” em uma loja virtual.

O Governo de São Paulo afirma, em nota, que a iniciativa da reunião entre autoridades estaduais e representantes dos aplicativos partiu de Rodrigo Garcia.

Além disso, para a gestão estadual, o posicionamento do sindicato em relação à atuação polícia é equivocado. “O patrulhamento reforçado vai beneficiar os próprios entregadores e dar mais segurança aos verdadeiros trabalhadores”, diz o governo.

Quanto à lei municipal, o governo diz aguardar a “adequação das normas locais às inovações tecnológicas e novas modalidades de trabalho, sem prejuízo dos serviços estaduais para fiscalização de trânsito”.

A respeito do uso das “bags”, o iFood afirma, em nota, entender que a “natureza da atividade de entrega intermediada por aplicativos é privada e os entregadores parceiros não se enquadram como motofretistas”.

Para a empresa, nesse caso, aplicam-se as regras de trânsito em linha com a resolução 356 de 2010 do Contran (Conselho Nacional de Trânsito). Entre outras regras, o texto diz que “não há vedação à utilização de equipamento fixado por alça junto ao corpo do condutor, como presente na regulamentação municipal”.

Quanto aos casos de falsos entregadores, a empresa afirma colaborar com o governo estadual para encontrar soluções que levem à identificação dos criminosos. “Este trabalho é essencial para preservar a imagem e o trabalho honesto de milhares de entregadores que atuam com a plataforma, bem como garantir a segurança de clientes, parceiros e da sociedade em geral.”