MPF diz que governo não tem intenção de combater garimpos e critica Salles
Ministro do Meio ambiente se reuniu com garimpeiros em Jacareacanga (PA), município onde ocorriam as operações de fiscalização no Pará
O Ministério Público Federal no Pará criticou suspensão das operações de combate a garimpos ilegais na Terra Indígena Munduruku, no Oeste do Pará, anunciada nesta quinta-feira pelo Ministério da Defesa após protestos de garimpeiros ontem. Em documento obtido pelo GLOBO, o MPF classificou a situação como “surreal” e ainda criticou a reunião entre o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, com garimpeiros em Jacareacanga (PA), município onde ocorriam as operações.
A suspensão das operações foi anunciada um dia após um grupo de garimpeiros protestar e pedir ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que elas fossem suspensas. Salles esteve na quarta-feira em Jacareacanga fazendo sobrevoos na região em que fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) atuavam.
Os garimpeiros invadiram o aeroporto da cidade e impediram a decolagem de uma aeronave militar que dava suporte à operação. Um dia depois, o Ministério da Defesa, que coordena a operação Verde Brasil 2, disse que as operações na TI Munduruku haviam sido suspensas porque as atividades estavam em “reavaliação” e que traria uma comitiva de representantes da região para uma reunião em Brasília.
Em um trecho do documento, os procuradores dizem que a postura da União revela que ela não tem “interesse” em coibir os garimpos.
“A postura da União, por meio de seus agentes, demonstra que não há interesse em coibir, voluntariamente, a prática da garimpagem ilegal e inconstitucional na Terra Indígena Munduruku”, diz a manifestação.
Em um trecho da manifestação, os procuradores classificam a suspensão das operações de combate a garimpos na TI Munduruku como uma situação “surreal”.
“Por mais incrível e surreal que pareça, a União, que tem o dever de preservar o meio ambiente, após o encontro do Ministro com os indígenas, interrompeu a Operação Verde Brasil 2 na TI Munduruku e ainda levou os infratores confessos em seu avião para Brasília, onde participarão de reunião para discutir a possibilidade de realização de prática vedada na Constituição Federal”, diz a manifestação.
O documento ao qual O GLOBO teve acesso é uma manifestação feita pelo MPF e entregue à Justiça Federal do Pará durante a realização de uma audiência de conciliação. Uma decisão judicial obrigou o governo a realizar ações de combate a garimpos ilegais em diversas terras indígenas, entre elas a Munduruku.
Após a notícia da suspensão das operações, os procuradores classificaram a audiência marcada para hoje como “inócua”.
Críticas a Salles
Os procuradores também criticaram a postura de Salles durante sua viagem a Jacareacanga, na quarta-feira. Ele sobrevoou as clareiras abertas pelos garimpos ilegais e, ao chegar à cidade, foi recebido por um grupo de garimpeiros que pediram a suspensão da operação. No local, ele defendeu que a mineração em terras indígenas fosse discutida “de forma aberta”.
Na avaliação dos procuradores do MPF no Pará, a reunião de Salles com os garimpeiros aconteceu ao “arrepio das leis”.
“No encontro, o representante máximo do órgão ambiental realizou articulação política, ao arrepio das leis ambientais e da Constituição Federal, com os garimpeiros acerca da possibilidade de exercício da atividade garimpeira em Terras Indígenas”, diz um trecho do documento enviado à Justiça Federal.
“Após ouvir o discurso que reconhece a prática de infrações ambientais, o Ministro do Meio Ambiente manifestou-se em apoio aos infratores”, diz outro trecho documento, mencionando a declaração de Salles na ocasião.
— Esse debate, essa discussão precisa ser feita. A vantagem de você tá aqui no meio de televisão, de jornais etc., é poder falar diretamente pras pessoas, pessoas de outras regiões do Brasil e de outros países do mundo, que querem saber do povo indígena, afinal de contas, tão impondo a vocês essa questão do garimpo ou são vocês mesmos que querem — disse Salles
Na avaliação dos procuradores, a ida de Salles a Jacareacanga não teve o objetivo de combater os garimpos na região, mas apenas o de passar uma imagem positiva à opinião pública nacional e internacional.
“A ida do Ministro Ricardo Salles à região não teve por objetivo combater a prática do garimpo ilegal, mas apenas passar a imagem de que estão sendo tomadas medidas para proteção da Amazônia, como forma de resposta à pressão econômica nacional e internacional de investidores e ambientalistas”, diz o documento.
A reportagem pediu posicionamentos sobre as críticas feitas pelo MPF ao Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Defesa e ao vice-presidente Hamiltou Mourão, que preside o Conselho da Amazônia. Até o momento, nenhuma resposta foi enviada.