COP26

Mundo caminha para aquecer 2,4°C se COP26 não ousar mais, diz levantamento

As promessas anunciadas até agora em Glasgow, durante a COP26, Conferência das Nações Unidas para…

As promessas anunciadas até agora em Glasgow, durante a COP26, Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, podem ser insuficientes para impedir que a temperatura global aumente no mínimo 2,4°C em relação à era pré-industrial.

A conclusão está em estudo do CAT (Climate Action Tracker), principal coalizão de análise climática do mundo, divulgado nesta terça (9).

“É muito bom para os líderes afirmarem que têm uma meta líquida de zero, mas se eles não têm planos de como chegar lá e suas metas para 2030 são tão baixas quanto muitos deles, então, francamente, essas metas líquidas de zero são apenas falas para uma ação climática real. Glasgow tem uma grande lacuna de credibilidade “, disse Bill Hare, presidente da Climate Analytics, uma organização parceira do CAT.

O órgão fez na COP26 uma apresentação de suas revisões anuais. De acordo com os cálculos, considerando todas as promessas de curto prazo feitas até agora, as emissões de gases que provocam o aquecimento global serão ainda quase o dobro do necessário para conter o aquecimento até 2100 em 1,5°C, compromisso feito pelos países que assinam o Acordo de Paris.

Em números absolutos, ainda haverá um excesso de emissões de entre 19 e 23 gigatoneladas de gás carbônico equivalente, afirmou Claire Stockwell.

De acordo com o instituto, no último ano, líderes e governos fracassaram em se comprometer com metas mais ambiciosas de curto prazo. Os novos anúncios corresponderam a uma queda, até 2030, de apenas 17% do necessário.

O Brasil foi um dos países que piorou suas metas, mesmo depois da “revisão” apresentada nesta COP, que, segundo o governo, recuperaria o recuo realizado em 2020. No ano passado, o governo Bolsonaro elevou a base de cálculo para os cortes de emissões sem alterar a porcentagem de corte de 43%, o que, na prática, reduziu os cortes.

Nesta COP, o governo revisou a porcentagem prometida para 50%, o que ainda significa uma redução menor que a acordada em 2015, disse Claire Stockwell, da Climate Analytics, em entrevista durante a apresentação dos novos números.

“A nova meta anunciada pelo Brasil para 2030 só é mais forte no papel e, na melhor das hipóteses, só reverte alguns dos danos causados pela atualização de 2020. A falta de clareza nas referências utilizadas torna o nível-alvo de emissões incerto”, afirma o documento.

O México também piorou sua oferta, e Austrália, Indonésia, Rússia, Singapura, Suíça, Tailândia e Vietnã não alteraram suas metas de 2015, de acordo com a análise.

Para Niklas Höhne, do New Climate Institute, outra organização parceira do CAT, as promessas de neutralidade de carbono não devem servir como desculpa para que os países “sentem e relaxem”: “A situação em que estamos é tão grave que não adianta fazer uma mudancinha aqui, outra ali. Isso move quase nada a agulha do aquecimento. Todos os países devem olhar urgentemente para o que mais podem fazer”.

A situação global é ainda pior, de acordo com o CAT, nas projeções de resultados das políticas efetivamente implantadas, e não das promessas: nesse caso, houve no ano passado uma melhoria de apenas 0,2°C , e a temperatura se elevará em 2,7°C sem medidas mais drásticas.

Segundo Maria José de VillaFranca Casas, do New Climate Institute, o progresso é inaceitavelmente lento e não se deve a novas políticas abrangentes sendo implantadas, e sim a mudanças nos inventários (bases de cálculos) e nas expectativas de crescimento da economia.

Iniciativas do setor privado, não computadas nessa análise, foram também observadas pelo CAT. “Seu acréscimo na redução de emissões é pequeno, mas bem-vindo, porque a lacuna é tão grande que não será possível fechá-la apenas com governos federais”, disse Höhne.

De acordo com o CAT, se todos os anúncios de neutralidade climática (emissão líquida zero de carbono) feitas em Glasgow de fato se concretizarem, o “cenário otimista” seria de uma elevação de 1,8 °C em 2100.

O instituto ressalva, porém, que esse cenário é bastante improvável, porque, além da lacuna ainda grande na redução do aquecimento até 2030, muitas das metas de longo prazo são vagas.

“A grande maioria das ações e metas para 2030 são inconsistentes com as metas líquidas zero: há uma lacuna de quase um grau entre as políticas atuais dos governos e suas metas líquidas zero”, disse Hare.

Segundo os cálculos apresentados hoje, as chances de que o mundo chegue ao final do século um aquecimento superior a 2,4°C são de 16%.

O CAT analisou as promessas de neutralidade climática de 40 países, que cobrem mais de 85% das emissões, e classificou como aceitáveis apenas quatro: Chile, Costa Rica, Reino Unido e União Europeia. De acordo com o relatório, há planos reais em vigor para zerar apenas 6% das emissões globais.

O Brasil entra na lista dos que têm metas com informações incompletas, que inclui também alguns dos maiores poluidores do mundo, como Índia, Indonésia e Rússia.

No total, mais de 140 governos anunciaram metas de neutralidade de carbono em Glasgow, o correspondente a 90% das emissões globais.

“Dada essa situação, nos estágios finais de Glasgow, os governos precisam se concentrar em fechar a lacuna de credibilidade”, afirma o CAT, algo que só acontecerá se eles elevarem sua ambição para 2030 e fecharem o acordo de financiamento, “essencial para muitos países em desenvolvimento” pagarem os custos da transição.

Na análise do CAT, carvão e gás são os principais motivos da inação. Segundo Hare, apesar da expectativa de que o carvão seja abandonado na produção de energia até 2030 nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e globalmente até 2040, “ainda há muito carvão nos planos de desenvolvimento”.

Grandes países carboníferos, como China, Índia, Indonésia e Vietnã, planejam substituir o carvão por gás, o que, de acordo com o CAT, não será uma solução, já que ambos são combustíveis fósseis.

Segundo o CAT, anúncios para reduzir o metano e o desmatamento feitos na semana passada em Glasgow contribuem na prática pouco ou nada para o cumprimento da redução de emissões, porque muitas das iniciativas já estavam incluídas nas metas anunciadas pelos países.

Assim, de acordo com Hare, é pouco provável que nos próximos dias os países consigam melhorar suas ofertas e ações para de fato conter o aquecimento global. “O foco deve ser sair com um processo robusto para os próximos anos.”

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