País chega à véspera da eleição com cenário incerto sobre segundo turno para presidente
Diante das limitações impostas pela legislação eleitoral para as horas que antecedem a eleição, a última grande cartada dos candidatos por votos ocorreu no debate da TV Globo
O país nunca chegou à véspera de uma eleição presidencial em um cenário tão indefinido a respeito das chances de realização de um segundo turno. Favorito, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conta com a preferência da metade da população na contagem dos votos válidos, segundo Datafolha divulgado quinta-feira. O placar é numericamente mais incerto do que de 12 anos atrás, quando Dilma Rousseff (PT) chegou à reta final com 51% de intenção de votos. Na ocasião, a sucessão de Lula foi definida em segundo turno, com a petista superando José Serra (PSDB). A contagem considera apenas os votos válidos — ou seja, excluindo os brancos e nulos na pesquisa estimulada — do penúltimo levantamento do instituto antes do pleito.
Na mesma medida em que deixa aberta a possibilidade de a fatura ser liquidada amanhã, a pesquisa expõe que, na prática, hoje há dois desfechos em perspectiva: vitória de Lula no primeiro turno ou um confronto direto entre ele e o presidente Jair Bolsonaro (PL), dono de 36% dos votos válidos no Datafolha. Atrás da dupla, em empate técnico, Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) duelam pela terceira colocação, com 6% e 5% das intenções, respectivamente. Desde 2002, o presidente do país é definido em dois turnos.
Na última corrida por votos às vésperas das urnas, os postulantes ao Palácio do Planalto decidiram investir os últimos dias de campanha em eventos e locais com os quais se sentem mais à vontade ou tiveram reduto eleitoral em pleitos anteriores. A partir de hoje, já não é mais permitido comícios e atos com aparelhagem de som de grande porte. Eles ainda podem, contudo, participar de caminhadas e passeatas.
Bolsonaro preparou calendário de motociatas em estados onde foi bem votado em 2018. Participou de uma ontem em Poços de Caldas (MG) e fará outra hoje, em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, ao lado do seu ex-ministro e candidato ao governo estadual Tarcício de Freitas (Republicanos), um dos seus poucos apadrinhados com chances reais de ir a um segundo turno competitivo.
O titular do Palácio do Planalto sairá de São Paulo para Joinville, em Santa Catarina. Lá, ele vai cumprir compromissos ao lado de dois correligionários, Jorginho Mello (PL), que concorre ao governo estadual, e Jorge Seif (PL), postulante ao Senado. Ao organizar motociatas, Bolsonaro tenta aglutinar seus apoiadores nas ruas com o intuito de demonstrar força e empurrar a eleição para o segundo turno.
Já Lula voltou os seus esforços para praças onde lidera a corrida eleitoral. Na garimpagem pelos votos que podem lhe dar a vitória antecipada, cumpriu uma maratona e visitou três estados ontem. Aproveitou que amanheceu no Rio, após participar do debate da TV Globo na noite de quinta-feira, e esteve com o seu candidato ao governo fluminense, Marcelo Freixo (PSB), numa espécie de último esforço para ajudá-lo a encostar no governador e postulante à reeleição, Cláudio Castro (PL), o favorito.
Na sequência, Lula seguiu para Salvador (BA), atendendo a um pedido do senador Jaques Wagner (PT), para impulsionar a candidatura do correligionário Jerônimo Rodrigues (PT), que concorre ao Executivo local. Depois, estava prevista ida a Fortaleza também para trabalhar por aliados: Elmano Freitas (PT), candidato ao governo, e Camilo Santana (PT), ao Senado. O último ato de campanha do ex-presidente será hoje, com um caminhada em São Paulo.
Repercussão do debate
Ciro ficará no Ceará, seu domicílio eleitoral. Ontem, ele esteve em Sobral, cidade governada por seu irmão, Ivo Gomes (PDT). O pedetista chega ao estado com o pior desempenho ali nas quatro vezes em que disputou a Presidência. As pesquisas apontam que corre o risco de sofrer derrota em casa. Segundo o último Ipec, levantamento que aferiu a corrida presidencial entre os cearenses, o Ciro está em terceiro lugar, com 10%, atrás de Lula, com 63%, e Bolsonaro, 18%.
Encostada em Ciro, a senadora Simone Tebet (MDB) vai a São Paulo e ao Mato Grosso do Sul, seu estado. Trata-se de uma tentativa de manter a estratégia que tem surtido efeito. Tebet intensificou as agendas em cidades paulistas, o maior colégio eleitoral do país. A mais recente pesquisa Ipec mostrou que ela aparece um ponto à frente de Ciro Gomes no estado. Hoje pela manhã, ela participa de um ato na Zona Norte de São Paulo ao lado do governador e candidato à reeleição Rodrigo Garcia (PSDB), seu aliado, e à tarde segue para Campo Grande.
Diante das limitações impostas pela legislação eleitoral para as horas que antecedem a eleição, a última grande cartada dos candidatos por votos ocorreu no debate da TV Globo, que terminou no início da madrugada de sexta-feira, sem um vencedor inconteste. A campanha de Bolsonaro acredita, porém, que a atuação do presidente foi suficiente para conter uma onda de última hora que possa garantir a vitória de Lula neste domingo.
Aliados próximos ao ex-presidente apostam que ele foi bem em temas sensíveis e conseguiu se contrapor a Ciro, de quem tenta atrair eleitores. Admitem, porém, que Lula viveu o pior momento ao demonstrar irritação com Padre Kelmon (PTB).
A campanha de Tebet também avaliou o programa como favorável para ela. Internamente, acredita-se que a emedebista conseguiu marcar posição e mostrar suas diferenças para Bolsonaro e Lula, confrontando ambos. Ciro e seus aliados traçaram diagnóstico semelhante em reação à participação do pedetista. Dizem que, mais de uma vez, conseguiu se destacar como o que mais apresenta propostas concretas a respeito dos temas discutidos.
Desde a redemocratização, outros candidatos chegaram à metade da semana decisiva das eleições na iminência de vencer, como o próprio Lula, que em 2006 angariava 53% dos válidos na penúltima pesquisa. Para chegar ao segundo mandato, entretanto, o petista precisou de uma segunda rodada contra Geraldo Alckmin (PSDB), hoje seu vice. Quatro anos antes, o petista também vivia incerteza se venceria ou não Serra logo na primeira votação, assim como Fernando Henrique Cardoso na mesma altura da corrida presidencial, em 1994.
Tanto Datafolha quanto o Ipec, formado por ex-executivos do Ibope, vão divulgar a última pesquisa presidencial do primeiro turno hoje.