Para 42% da população, governo agiu mal em crise do óleo no litoral
Outros 31% consideram a ação do governo regular e 23%, ótima ou boa
Para 42% da população, o governo Jair Bolsonaro teve um desempenho ruim ou péssimo para lidar com o vazamento de óleo que atinge o litoral brasileiro desde o fim de agosto. Outros 31% consideram a ação do governo regular e 23%, ótima ou boa. Já no Nordeste, região mais afetada pelas manchas de óleo, a avaliação negativa é maior. Metade da população nordestina considera ruim ou péssimo o desempenho de Bolsonaro em relação à crise.
Manchas de óleo apareceram primeiro na Paraíba e se espalharam por todos os estados nordestinos. No Sudeste, apareceu em quantidades menores no Espírito Santo no início de novembro e mais tarde no norte do Rio de Janeiro. Os dados da pesquisa Datafolha, feita com 2.948 pessoas acima de 16 anos em 176 municípios nos dias 5 e 6 de dezembro de 2019, mostram que a maior parte dos brasileiros (92%) tomou conhecimento do maior desastre ambiental em extensão no litoral do país. O incidente afetou turismo e pesca e fez com que praias paradisíacas ficassem cobertas de grandes manchas negras.
Até o momento, 972 pontos foram afetados, e mais de cem animais morreram após contato com o petróleo –a maioria são tartarugas marinhas. A opinião de empresários em relação às ações do governo para conter o óleo vai no caminho oposto do que pensa os brasileiros em geral. Para 46% dos empreendedores, as respostas de Bolsonaro em relação ao desastre foram consideradas ótimas. Já 60% dos estudantes consideraram-nas ruins ou péssimas.
Além de parte da população, especialistas e ambientalistas veem problemas no desempenho do governo e, durante meses, apontaram erros e cobraram atenção ao caso. “A resposta foi muito aquém da necessária, tanto para a investigação da origem do óleo como nos processos pouco transparentes com que o Brasil conduziu essa gestão”, diz Mauricio Voivodic, diretor-executivo da ONG WWF-Brasil. “A transparência dá segurança para a população, e a falta dela deixou todos nós muito preocupados e inseguros. Estamos assim até hoje.”
O primeiro pronunciamento oficial em rede nacional sobre o vazamento de óleo ocorreu 55 dias após seu início. Um site para centralizar informações foi colocado no ar 56 dias depois. O presidente Jair Bolsonaro não visitou nenhuma das áreas afetadas –em seu lugar, foram o ministro Ricardo Salles (Ambiente) e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), como presidente interino, em outubro.
Enquanto isso, o governo disparava declarações sem provas sobre o assunto. Salles insinuou, sem apresentar provas e usando uma imagem antiga, que um navio do Greenpeace poderia ser o responsável pelo vazamento de petróleo. Bolsonaro também voltou a atacar as ONGs –acusadas por ele de provocar os incêndios na Amazônia de agosto –e reclamou de um suposto silêncio das organizações em relação ao derramamento de óleo.
Enquanto órgãos ambientais estaduais e biólogos recomendavam cautela no consumo de animais e no contato com a água e a areia atingidas pelo óleo, Jorge Seif Junior, secretário de Aquicultura e Pesca, afirmou, em uma das lives semanais do presidente, a frase de repercussão que até apareceu em prova do vestibular da UECE (Universidade Estadual do Ceará): “O peixe é um bicho inteligente. Quando ele vê uma manta de óleo ali, capitão, ele foge, ele tem medo. Então, obviamente, você pode consumir o seu peixinho sem problema nenhum.”.
Segundo reportagem do jornal Folha de S.Paulo, um dos motivos que podem explicar a demora na ação foi a extinção pelo governo Bolsonaro, em abril deste ano, de conselhos responsáveis pela resposta a desastres com óleo. Foram extintos os comitês Executivo e o de Suporte do Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Água (PNC), criado durante a governo Dilma Rousseff (PT).
Um manual para direcionar as ações do governo e colocar ou não o PNC em prática em caso de desastre também aponta a demora da gestão Bolsonaro em agir. Com 35 perguntas, o manual ajuda a avaliar a magnitude do problema e se há necessidade de dar prosseguimento ao plano.
Entre as perguntas estão: a fonte de descarga não foi controlada? Há possibilidade de ampliar a(s) área(s) impactada(s)? Há possibilidade de o óleo causar impactos ambientais de relevante comoção social? Há possibilidade de o óleo afetar área de importância socioeconômica?
As respostas positivas para as questões acima no caso desse último vazamento indicam que o plano poderia ter sido acionado logo nos primeiros dias do desastre.
Quando isso ocorre, um coordenador operacional é designado para acompanhar o vazamento, o que só foi feito em 11 de outubro em ofício interno pelo ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente). Naquela data, 43 dias após o início das manchas, 155 locais e todos os estados do Nordeste já tinham sido afetados.
Outra prova da ação insuficiente do governo é a grande quantidade de trabalho de voluntários empenhados em limpar as praias. Muitos pescadores, moradores e donos de pousadas se arriscaram e tiraram óleo das praias com as próprias mãos, com pouca ou nenhuma proteção para as vias respiratórias e os olhos.
Especialistas alertaram para o risco de intoxicação ao respirar o óleo e ter contato com o material, e voluntários depois foram hospitalizados com ardor nos olhos, dor de cabeça forte, falta de ar, cólica, náusea e coceiras no corpo. Após meses de limpeza, relatos de exaustão e estafa mental eram comuns. É preciso considerar, porém, que o petróleo viajou abaixo da superfície do mar, o que dificultou a sua detecção por satélite e a remoção.
O causador da crise ainda é uma incógnita. Em novembro, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão em uma agência marítima no Rio, e tinha como alvo o navio Bouboulina, de bandeira grega. Ele apareceu como suspeito em análise da empresa privada Hex Tecnologia.
Na última quinta (18), porém, o coordenador-geral do Cenima (Centro Nacional de Monitoramento e Informações Ambientais), Pedro Bignelli, disse em depoimento na Câmara para a CPI do óleo que o Ibama havia rejeitado o relatório da Hex.