PCC quis imitar ataque nas Torres Gêmeas com carro-bomba em Bolsa de SP
O carro-bomba já estava preparado. Era um Gol cinza roubado. Foi montado em outubro de…
O carro-bomba já estava preparado. Era um Gol cinza roubado. Foi montado em outubro de 2002 com 30 kg de dinamite a mando do PCC (Primeiro Comando da Capital) por um integrante da facção criminosa, especialista em explosivos, para ser usado em um atentado em São Paulo.
As polícias, o Ministério Público e o Poder Judiciário tinham informações sobre o plano terrorista. Mas não sabiam onde nem quando seria o ataque. Faltava uma semana para o segundo turno da eleição presidencial. As forças de segurança ficaram em choque.
A ideia da facção era explodir o veículo na porta do prédio da então Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo), na região central da capital paulista. O ato terrorista seria um protesto pela remoção dos líderes do PCC para o recém-inaugurado CRP (Centro de Readaptação Penitenciária) de Presidente Bernardes (SP).
O presídio foi construído com 160 celas individuais para isolar em RDD (Regime Disciplinar Diferenciado) integrantes de facções criminosas. Nesse sistema não há visita íntima. O preso fica trancado 22 horas por dia sem direito a rádio, TV, jornais e revistas. O banho de sol é de duas horas.
Os presos César Augusto Roriz Silva, o Cesinha, e José Márcio Felício, o Geleião, dois fundadores da facção, eram os chefes do PCC à época. Cesinha foi amigo de adolescência de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, atual líder máximo da organização. Ambos eram trombadinhas.
Segundo fontes policiais, Cesinha assumiu ter escolhido o edifício da Bolsa por dois motivos: Primeiro porque considerava a Bolsa de Valores o símbolo do capitalismo no Brasil e do sistema econômico responsável —na opinião dele— pela riqueza de poucos e pela pobreza de milhões.
O segundo motivo era a localização do prédio. No coração, praticamente no marco zero da cidade de São Paulo. O local é de grande movimentação de pessoas. E a intenção do PCC era causar o maior número de baixa possível e matar dezenas, centenas de vítimas.
Os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos estavam frescos na memória mundial. Segundo a polícia, o PCC se inspirou no ataque às Torres Gêmeas, em Nova York, símbolo do capitalismo norte-americano, e escolheu o prédio da Bolsa de São Paulo como alvo.
A Polícia Civil, o Ministério Público e o Poder Judiciário uniram forças para descobrir o local e tentar impedir o ataque. A desembargadora Ivana David Boriero era na ocasião juíza-corregedora do Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária).
“Naquela época não tinha recursos tecnológicos como hoje. Não existia delegacia especializada em investigar facções criminosas. O Gaeco [Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado], do Ministério Público, havia sido criado alguns anos antes. Tudo era mais difícil”, explicou Ivana David.
A pedido do Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais), Ivana David autorizou, no primeiro momento, a realização de interceptações telefônicas envolvendo suspeitos pelo planejamento do atentado, classificado por ela de “terrorismo urbano”.
“Todos nós ficamos muito assustados com o possível ataque. Os grampos telefônicos e os cruzamentos de informações do serviço de inteligência das forças de segurança foram decisivos para identificar os autores. O PCC já mostrava a cara naquela época. Era terrorismo urbano”, afirma.
A desembargadora contou ao UOL que o PCC tirou o sono das autoridades e, além de planejar o ataque ao edifício da Bolsa, ameaçava também explodir estações do metrô no horário de pico, principalmente a do Jabaquara, na linha 1-azul, uma das mais movimentadas.
“Muitas vezes, na madrugada, eu tinha de autorizar a entrada de policiais nos trilhos do metrô para rastrear as linhas à procura de explosivos. Havia essas denúncias”, relembra a desembargadora. As varreduras eram feitas pelo GER (Grupo Especial de Resgate) unidade de elite da Polícia Civil.
O alívio das autoridades veio no dia de 20 de outubro, um domingo, quando a mulher de um dos chefões do PCC foi presa na saída do CRP de Presidente Bernardes. Ela tinha ido visitar o marido e foi acusada de repassar aos comparsas as ordens para a montagem do carro-bomba e o atentado.
No dia seguinte à prisão da mulher do líder do PCC, o Deic recebeu telefonema anônimo informando o local onde o Gol cinza com os explosivos tinha sido abandonado. O veículo foi encontrado no acostamento do Km 91 da rodovia Anhanguera, em Campinas (SP).
Ivana David expediu mandados de busca e apreensão em endereços dos suspeitos de envolvimento na ação terrorista. Os acusados pela montagem do carro-bomba foram identificados, presos, processados e condenados. “Felizmente o ataque foi abortado”, comemora ela até hoje.
A eleição presidencial transcorreu tranquilamente. Não houve incidentes. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi eleito. Porém, em março de 2002, sete meses antes do encontro do Gol cinza, o PCC já havia montado seu primeiro carro-bomba. .
Um Escort branco com 40 kg de dinamite foi deixado no pátio do Fórum Criminal da Barra Funda, zona oeste da capital. O complexo judiciário era também a sede do Dipo, onde Ivana David era juíza-corregedora.
O local recebia milhares de pessoas diariamente e teve de ser evacuado às pressas. O Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) unidade da Polícia Militar especialista em explosivos, desarmou o artefato. Ninguém ficou ferido. O PCC assumiu a autoria do plano de atentado terrorista.