Meio ambiente

Petrobras retarda pagamentos de R$ 1 bi em compensações ambientais

Um quarto do dinheiro deveria ir para unidades de conservação na amazônia

Petrobras retarda o pagamento de compensações ambientais —previstas em lei, em razão das atividades de exploração de petróleo com grande impacto— no valor de R$ 980 milhões. O dinheiro deveria estar em uso por unidades de conservação em diversas regiões do Brasil.

Folha obteve a relação de todas as compensações que a estatal tem a obrigação de fazer, com o detalhamento de quais projetos estão pendentes de execução.

Os dados foram fornecidos pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), via Lei de Acesso à Informação. O órgão federal é o responsável pela gestão das unidades de conservação.

Ao todo, 45 empreendimentos da Petrobras estão com as compensações ambientais pendentes, segundo as tabelas fornecidas pelo órgão federal.

À reportagem, a estatal diz que cumpre a legislação e suas obrigações. “A verificação da conformidade legal de seus empreendimentos é sistematicamente monitorada pelos órgãos reguladores”, afirma, em nota.

Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), que é o órgão licenciador, define datas para o início das compensações e, sem o pagamento, os valores passam a ser atualizados monetariamente, o que caracteriza pendência no cumprimento da obrigação, aponta o ICMBio.

Não há um prazo fixo para o pagamento, mas orientação para que a obrigação seja quitada “com a maior brevidade possível”, segundo o Ibama. “Quanto a maior a demora em se realizar o pagamento, maior o valor a ser pago”, explica o órgão, em nota.

Na lista fornecida, há os nomes das unidades de conservação definidas para o recebimento de valores, as ações que devem ser feitas —como a própria implementação da unidade, regularização fundiária ou plano de manejo— e os valores a serem repassados, conforme definido pelo Comitê de Compensação Ambiental Federal, integrado por Ibama, ICMBio e Ministério do Meio Ambiente.

Os termos de compromisso referentes a compensações que somam R$ 980 milhões nem chegaram a ser assinados. Houve casos, inclusive, de recusas da Petrobras em assinar termos, conforme a resposta do ICMBio por meio da Lei de Acesso.

“Nos empreendimentos relacionados à Petrobras, as situações identificadas de recusa da celebração do TCCA [termo de compromisso de compensação ambiental] pelo empreendedor ocorridas no curso dos processos foram tempestivamente notificadas ao Ibama para adoção das providências legais cabíveis”, disse o ICMBio.

A Petrobras não se recusou formalmente a pagar compensações ambientais, mas apresentou recursos administrativos e jurídicos contra os índices de correção monetária adotados ao longo do tempo, diz o Ibama. Houve pedidos de revisão de procedimentos.

A empresa, por sua vez, afirma que assina os termos de compromisso assim que os documentos são disponibilizados e que não vê pendências. “Desde 2019, já foram assinados termos de compromisso cujos valores superam R$ 500 milhões.”

Os dados fornecidos pelo ICMBio mostram que, além dos R$ 980 milhões pendentes, há R$ 1,1 bilhão em compensações da Petrobras com termos de compromisso assinados. Já foram depositados R$ 726,4 milhões.

Ainda segundo a tabela fornecida pelo órgão, um processo sem a celebração do termo de compromisso tem o ano de 2004 como o marco para a obrigação —há 20 anos, portanto. Outros têm datas de 2006, 2007 e dos anos seguintes. Os mais recentes são de 2022.

Com base nos dados fornecidos, a reportagem identificou que uma fatia expressiva das compensações devidas —R$ 259 milhões, ou 26% do total— estaria destinada a unidades de conservação na amazônia.

A empresa foi notificada em 2022 sobre a existência de 47 processos de compensação ainda em aberto, segundo o Ibama.

Os questionamentos da estatal diziam respeito a juros durante o uso da taxa Selic na correção monetária, o que foi “pacificado” com a definição do IPCA-E, conforme o órgão. Essa alteração ocorreu em junho de 2023 e foi comunicada ao ICMBio em agosto.

“Desde então, a Petrobras vem cumprindo com as compensações sem maiores questionamentos”, disse o órgão ambiental. “A ausência de respostas a ofícios [sobre tratativas para assinatura de termos de compromisso], ou respostas evasivas, é considerada como postergação intencional, atraso ou recusa, e nesses casos podem ser invocados recursos administrativos contra o empreendedor.”

Entre as medidas que podem ser adotadas estão negativa de novos licenciamentos, suspensão de licenças vigentes e multas por descumprimento de condicionantes, apontou o Ibama.

A legislação prevê que, em casos de empreendimentos com significativo impacto ambiental, deve haver apoio à implantação e manutenção de unidades de conservação, dentro dos processos de licenciamento. A previsão desses aportes costuma ser uma das condições para a emissão das licenças.

Em duas tentativas da Petrobras de explorar petróleo na bacia Foz do Amazonas, na costa amazônica, ficou definida a necessidade de compensação ambiental. A região é vista como estratégica pelo governo Lula (PT), que quer a exploração ainda em 2024 no chamado bloco 59, a uma distância da costa de 160 km a 179 km, na direção de Oiapoque (AP).

O primeiro projeto foi abandonado de vez em 2016, em razão de um acidente durante atividade de perfuração do bloco FZA-4, bem próximo do bloco 59. Para o FZA-4, o Ibama definiu compensação de R$ 140 mil, cujo pagamento foi protelado por mais de nove anos.

O dinheiro deveria ser destinado ao Parque Nacional Cabo Orange, área de conservação de mangues e campos inundáveis na região de Oiapoque. A Petrobras agiu por seis vezes para protelar o pagamento, previsto agora para abril —o valor foi atualizado para R$ 282 mil.

Já o projeto atual de exploração de petróleo na bacia Foz do Amazonas tem grau de impacto ambiental com escala máxima, conforme definição do Ibama. Esse grau impacta no cálculo da compensação, definida inicialmente em R$ 4,3 milhões.

Na lista de empreendimentos com compensações pendentes, está a perfuração da bacia de Campos, referente ao período de 2000 a 2008 e de 2014 a 2021. Segundo a Petrobras, essa bacia responde por 30% da produção nacional de petróleo e gás.