PF vê suspeita de caixa 2 de fornecedor de Dilma em 2014
Os investigadores apontam contabilidade “atípica” e indícios de caixa 2 com recursos provenientes do PT e de esquemas de desvios na Petrobrás e no Ministério do Planejamento.
A Operação Custo Brasil, desdobramento da Lava Jato, investiga suspeitas de lavagem de dinheiro e sonegação fiscal em negócios do segundo maior fornecedor da campanha da presidente afastada Dilma Rousseff. Relatório da Receita Federal repassado à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal mostra que, entre 2010 e 2014, uma das empresas de Carlos Roberto Cortegoso, a CRLS Consultoria e Eventos, movimentou quase R$ 50 milhões, cinco vezes o valor declarado no período.
Os investigadores apontam contabilidade “atípica” e indícios de caixa 2 com recursos provenientes do PT e de esquemas de desvios na Petrobrás e no Ministério do Planejamento. “A CRLS, segundo a Receita Federal, movimentou em suas contas cerca de R$ 25 milhões de entrada (crédito) e R$ 24 milhões de saída, mas declarou receita bruta de menos de R$ 10 milhões”, afirmam procuradores da República da Custo Brasil.
Cortegoso é proprietário da CRLS e da Focal Confecções e Comunicação Visual, que recebeu R$ 25 milhões na última campanha de Dilma e ficou atrás apenas do publicitário João Santana (R$ 70 milhões), preso preventivamente em Curitiba na Lava Jato. As empresas têm sede em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. O empresário fornece ao PT estruturas de palanques e materiais desde a campanha à reeleição de Lula, em 2006. Ele ficou conhecido como “garçom” do ex-presidente por ter trabalhado em restaurante frequentado por sindicalistas petistas.
Na Custo Brasil, que apura desvio de até R$ 100 milhões de recursos de empréstimos consignados de servidores federais entre 2010 e 2015, a CRLS é citada por ter recebido, a pedido do ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto, R$ 309 mil da Consist Software, responsável por gerenciar os contratos do Ministério do Planejamento. A CRLS foi alvo de buscas ordenada pela 6.ª Vara Federal Criminal de São Paulo no dia 23 de junho.
Embora a empresa não conste na prestação de contas da campanha de Dilma, ela atuou por intermédio da Focal. Investigadores da Custo Brasil e da Lava Jato verificaram que as duas empresas integram um mesmo negócio. Compartilham equipamentos e movimentam recursos entre si, conforme relatórios da Receita Federal e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Documento da Custo Brasil com dados das contas de Cortegoso e das empresas vê ocorrências suspeitas como depósitos e saques em espécie “que apresentam atipicidade em relação à atividade econômica”, “movimentação de recursos incompatível com o patrimônio” e “movimentação de recursos de alto valor, de forma contumaz, em benefício de terceiros”.
Com as transações financeiras entre as duas empresas, a força-tarefa suspeita que propina tenha transitado por suas contas. Parte dos valores movimentos na CRLS, que apontam indícios de ocultação de origem, é de 2014. Naquele ano, a empresa registrou R$ 9,3 milhões de entrada e R$ 8,5 milhões de saída, mas declarou receita bruta de R$ 2,5 milhões.
“A referida empresa é uma produtora, que fazia eventos para o PT e que tinha créditos com o PT. Cortegoso teve evolução patrimonial bastante rápida, tendo sido garçom e atualmente teria até mesmo avião em seu nome”, afirmou a Procuradoria da República.
Parceria
Os pagamentos da campanha de Dilma são investigados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A ação implica a chapa reeleita em 2014, o que inclui o presidente em exercício, Michel Temer (PMDB). Para o ministro Gilmar Mendes, há “indicativos” de que o PT e a candidatura presidencial foram financiados por propina desviada da Petrobrás. A Focal é uma das empresas que passam por perícia técnica por suspeita de incompatibilidade entre serviços ofertados e a estrutura existente.
Fundada em 2005, a Focal tem sede em um galpão. A CRLS foi aberta em 2009, um ano antes de Cortegoso comprar sete imóveis do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula, réu na Lava Jato, acusado de tomar empréstimo de R$ 12 milhões para o PT, em 2004. A transação também está sob investigação.
A Focal está registrada em nome da filha e de um funcionário de Cortegoso, e a CRLS, atualmente em nome do empresário e de sua mulher. A relação de Cortegoso com o PT tem mais de 20 anos e deslanchou após Lula assumir a Presidência em 2003. Os negócios suspeitos com o partido surgiram em 2005, quando Cortegoso e a Focal foram citados por Marcos Valério na CPI dos Correios como destinatários de dinheiro de caixa 2 do mensalão.
Em 2006, a Focal recebeu R$ 3,9 milhões da campanha à reeleição de Lula. Quatro anos depois, já com Dilma, os gastos do partido com a empresa chegaram a R$ 14,5 milhões.
Defesas
Procurado por meio de seu advogado, Márcio Decreci, Cortegoso não quis se pronunciar. Segundo o defensor, o caso está sob sigilo. Sobre os imóveis, a defesa de Bumlai afirma que a venda foi feita dentro da “mais estrita observância da legislação” e não há irregularidade no negócio.
O advogado Flávio Caetano, da campanha de Dilma, informou que a Focal presta serviços de montagens de palanques em todo o País. “O papel da campanha é saber se a empresa existe, se tem capacidade para prestar os serviços no prazo, com a qualidade acertada e preço de mercado”, disse Caetano. “Não cabe à campanha saber da vida privada da empresa. O PT e o Instituto Lula não responderam à reportagem. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.