PGR extingue Secretaria de Direitos Humanos, responsável por federalização de investigações travadas nos estados
Aras poderá suspender pedidos para que um caso seja federalizado, por 180 dias, para acompanhar "providências" nos estados
O procurador-geral da República, Augusto Aras, extinguiu na noite de sábado (25) a Secretaria de Direitos Humanos e Defesa Coletiva. A estrutura abrigada no gabinete do procurador-geral é responsável, por exemplo, pela análise de ações contra invasões de terras em comunidades tradicionais e também por processos voltados à federalização de investigações travadas nos estados.
A Secretaria de Direitos Humanos é ocupada pelo procurador da República Ailton Benedito de Souza, procurador-chefe do Ministério Público Federal (MPF) em Goiás. Benedito é conservador e bolsonarista, sendo um dos procuradores mais atuantes nas redes sociais em defesa do presidente Jair Bolsonaro. Ele se descreve como “anticomunista” e dá apoio irrestrito à agenda do Executivo federal, embora atue no MPF com assuntos diretamente relacionados ao governo.
A indicação de Benedito para a Secretaria de Direitos Humanos, em setembro do ano passado, foi um dos acenos mais óbvios de Aras em direção ao bolsonarismo. O presidente escolheu Aras para o cargo de procurador-geral da República fora da lista tríplice votada pela categoria de procuradores. A lista não está prevista na Constituição Federal, mas foi uma tradição respeitada, sem interrupções, pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Michel Temer.
Em uma portaria assinada por Aras às 19h40 de sábado, o procurador-geral fez mudanças no funcionamento de seu gabinete e extinguiu as Secretarias de Direitos Humanos e Defesa Coletiva e de Relações Institucionais. Segundo a assessoria de imprensa da PGR, haverá uma incorporação de funções à Assessoria de Articulação Parlamentar. Não fica claro se as funções das duas secretarias — ou somente da Secretaria de Relações Institucionais — serão destinadas à assessoria parlamentar.
A mesma portaria estabelece que o procurador-geral poderá suspender, por até 180 dias, os procedimentos preparatórios para um pedido de federalização — as ações são chamadas de incidentes de deslocamento de competência (IDCs). A suspensão ocorreria para “acompanhamento de providências no âmbito estadual”.
O pedido para a federalização das investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do motorista Anderson Gomes, feito ainda na gestão de Raquel Dodge à frente da PGR, foi elaborado pela Secretaria de Direitos Humanos do gabinete da procuradora-geral. O procedimento ainda não foi julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Todas as áreas do gabinete da PGR devem se adequar ao novo regimento num prazo de 60 dias. A PGR não informou o destino de Benedito. O procurador não respondeu às perguntas da reportagem sobre a extinção da Secretaria de Direitos Humanos.
Pela secretaria tramitam cerca de 60 procedimentos que preparam a federalização de investigações de crimes — a maioria envolve violência policial e execuções com suposta participação de PMs. Em gestões passadas, a secretaria se ocupava também de ações para suspender reintegrações de posse quando comunidades tradicionais são impactadas.
Dentro do MPF, Benedito é o oponente direto da titular da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), a subprocuradora-geral Deborah Duprat. A PFDC é um colegiado que funciona no âmbito da PGR e que expede recomendações ao governo e orientações para atuação do MPF nos estados, na área de direitos humanos. Duprat é, hoje, a integrante da PGR que mais se opõe à pauta conservadora de Bolsonaro.
O mandato de Duprat termina em 22 de maio. Na última quarta-feira, Aras indicou o subprocurador-geral Carlos Alberto de Vilhena para ser o novo titular da PFDC. A indicação foi aprovada pelo Conselho Superior do MPF. Dois dias depois, o procurador-geral extinguiu a Secretaria de Direitos Humanos e Defesa Coletiva e a Secretaria de Relações Institucionais, esta última ocupada por Vilhena.