polêmica

Por princípio religioso, hospital se recusa a colocar DIU em mulher, em São Paulo

"Vocês acham que é fácil ser mulher?", questionou paciente

Um hospital de São Paulo se recusou a colocar um dispositivo intrauterino (DIU) em uma mulher e gerou um debate no Twitter nesta semana. Em uma publicação feita na última terça-feira (23), a paciente contou que, durante uma consulta no Hospital São Camilo, ouviu a negativa da médica diante do método contraceptivo, sob a alegação de que o procedimento é “contra os valores religiosos da instituição”. A unidade de saúde confirmou que, “por ser uma instituição confessional católica” não realiza procedimentos contraceptivos, em homens ou mulheres, exceto em casos que envolvam riscos à manutenção da vida.

“Vocês acham que é fácil ser mulher?”, questionou Leonor Macedo na postagem. Muitas outras mulheres se indignaram. Uma chegou a ironizar a situação: “Em 2024, teremos carros voadores” e comparando à realidade reforçada em “2024: não pode contracepção”.

Colocado dentro do útero, o DIU é um dispositivo que evita a fecundação de óvulos por espermatozoides. E é considerado um dos métodos contraceptivos mais seguros atualmente, podendo também ser retirado a qualquer momento.

Na publicação de Leonor, muitos internautas também se perguntaram se um hospital ou um médico pode ou não se recusar a realizar o procedimento. Mas a resposta não é tão simples.

Mesmo entre comissões da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) São Paulo, não há acordo.

Hospitais podem negar procedimento?

Para Juliana Hasse, presidente da Comissão de Direito Médico, a recusa pode acontecer. Ela justifica que, em situações que não envolvem risco imediato à vida da paciente, como em emergências, um hospital privado tem a liberdade de aderir a princípios religiosos.

— Essa prática é comumente baseada em princípios éticos e morais associados à religião da instituição — avalia: — É importante notar que, mesmo em locais onde hospitais religiosos podem se recusar a realizar procedimentos contraceptivos, geralmente existem outras opções de saúde disponíveis onde esses serviços podem ser obtidos. Pacientes em busca de procedimentos contraceptivos podem precisar procurar outras instituições de saúde que não tenham tais restrições.

O presidente da Comissão de Bioética, Henderson Furst, discorda. Segundo ele, apesar de um hospital privado ter alguma autonomia, para escolher ser uma unidade especializada, por exemplo, uma vez que o Hospital São Camilo se propõe a ser um hospital geral, deve atender os direitos dos pacientes.

— O DIU é um mecanismo de planejamento familiar. E o planejamento familiar está previsto na Constituição e é regulado por uma lei que diz que ele deve ser fornecido em instituição pública ou privada, filantrópica ou não. Se o hospital se propõe então a fazer a atenção generalista à saúde, tem o dever de respeitar as diretrizes de planejamento familiar.

‘São Camilo’ orienta buscar outra rede

Ainda segundo o advogado, no caso da recusa da colocação de DIU, a paciente pode entrar com ação judicial para obrigar a realização do procedimento no São Camilo. E, pelo interesse coletivo, os conselhos de Medicina, em defesa da autonomia dos médicos, e a Defensoria Pública, em defesa dos cidadãos, podem representar contra a decisão do hospital.

Procurado, o Conselho Federal de Medicina preferiu não comentar o caso, por ser “uma instância de julgamento em grau de recurso” e explicou que cabe ao Conselho Regional de Medicina do estado analisar a situação. O Conselho de São Paulo não se posicionou até o momento.

A Rede de Hospitais São Camilo afirmou que os pacientes que não justificam risco à saúde para a colocação do DIU “são orientados a buscar na rede referenciada do seu plano de saúde hospitais que tenham esse procedimento contratualizado”.

O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) reforçou que “é obrigatória a cobertura de atendimentos relacionados a ações de planejamento familiar, conforme a Lei de Planos de Saúde. Além disso, o implante do DIU — tanto o hormonal, quanto o não hormonal — consta do Rol de Cobertura Obrigatória da ANS”.

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