Processo de Jefferson contra Bolsonaro foi tática para presidente atacar STF
Após prisão de aliado, Bolsonaro disse que esse processo era uma prova da inimizade com seu aliado
No esforço para se descolar de Roberto Jefferson, o presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou neste domingo (23) que não poderia ser amigo de uma pessoa que o processa.
“Agora em meados de setembro ele entrou com uma queixa-crime contra o Superior Tribunal Militar, contra minha pessoa e do senhor ministro da Defesa, por prevaricação. Ou seja, quem me processa não pode alguém achar que ele é meu amigo”, disse o presidente em entrevista à TV Record.
Bolsonaro se referia a uma queixa-crime apresentada por Jefferson ao STM (Superior Tribunal Militar) em 16 de setembro. O objetivo do processo, no entanto, era dar munição para o presidente agir com medidas mais duras contra o STF (Supremo Tribunal Federal), segundo aliados.
No documento, o ex-deputado diz que Bolsonaro e o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, foram omissos em suas funções militares ao não acionarem as Forças Armadas contra o STF pela “insistência no cometimento de ilegalidades”.
O processo está sob sigilo, e a Folha teve acesso à inicial apresentada pelo ex-deputado.
Segundo Jefferson, a prevaricação de Bolsonaro e Nogueira decorre da omissão do Senado, que tem a atribuição de analisar pedidos de impeachment de ministros do STF.
“Ressalte-se de que não pretende a presente inciativa, (sic) ruptura com o regime democrático, (sic) com o fechamento das instituições como se deu no passado, no Ato institucional nº05, mas, (sic) a devida imposição de dever de polícia dos poderes das forças armadas, diante de Magistrado [Alexandre de Moraes] maculando todo ordenamento jurídico nacional, com o silêncio, omissão, prevaricação, conjuntamente do SENADO FEDERAL, órgão do Estado responsável pelo CONTROLE das atividades de magistrados da Suprema Corte Federal, restando a função subsequente das forças armadas, na realização do estabelecimento da ordem legal e do regular funcionamento das instituições do Estado”, diz o texto assinado pelo advogado de Jefferson, André Henrique Pimentel Lucena.
O ex-deputado ainda defende na ação que não seja aberto inquérito contra o ministro Alexandre de Moraes ou demais ministros do STF, mas que seja garantido que as Forças Armadas “jamais venham a se eximir de seu dever perante sua função Magna, de manutenção da ordem legal”.
O documento ainda é assinado por duas testemunhas: o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) e o senador Eduardo Girão (Podemos-CE).
À época da apresentação da queixa-crime, aliados de Roberto Jefferson afirmaram à Folha que o objetivo não era atacar Bolsonaro ou integrantes do governo com a ação no STM, mas dar sustentação para que o presidente tomasse medidas mais duras contra o que considera excessos do STF.
Jefferson foi preso neste domingo por decisão de Alexandre de Moraes. O ex-deputado, no entanto, reagiu à ordem judicial, disparou mais de 20 tiros de fuzil e lançou duas granadas contra os agentes da Polícia Federal. Dois deles ficaram feridos, sem gravidade.
O ex-deputado já estava em prisão domiciliar e foi alvo de decisão de Moraes por ter descumprido medidas impostas no âmbito de uma ação penal em que é réu por incitação ao crime e ataques a instituições.
Em vídeo publicado nas redes, Jefferson xingou a ministra Cármen Lúcia, do STF, e a comparou a “prostitutas”, “arrombadas” e “vagabundas”.
Razão inicial para a ordem da prisão, os ataques foram feitos em comentário à decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que concedeu três direitos de resposta a Lula que deveriam ser veiculados em canais da rádio Jovem Pan.
“Fui rever o voto da bruxa de Blair, a Cármen Lúcifer, na censura prévia à Jovem Pan. Olhei de novo, não dá pra acreditar. Lembra mesmo aquelas prostitutas, aquelas vagabundas arrombadas, que viram para o cara e diz: ‘Benzinho, nunca dei o rabinho, é a primeira vez’. Ela fez pela primeira vez. Ela abriu mão da inconstitucionalidade pela primeira vez”, diz Jefferson.
Em nova decisão neste domingo, Moraes reforçou a ordem de prisão e mencionou a possibilidade de enquadrar o ex-deputado no crime de tentativa de homicídio. A pena varia de 6 a 20 anos.
Ao longo do domingo, Bolsonaro deu diversas declarações em repúdio ao ex-aliado, chamando Roberto Jefferson de “criminoso” e “bandido”. Na tentativa de negar vínculo com o dirigente do PTB, Bolsonaro chegou a dizer que não havia sequer uma foto dos dois —o que é mentira.
“Nós não somos amigos, não temos relacionamento. E tratamento para pessoas que são corruptas ou agem dessa maneira como Roberto Jefferson agiu, xingando uma mulher e também recebendo a bala policiais, o tratamento dispensado pelo governo Jair Bolsonaro será de bandido”, disse o presidente durante sabatina da Record TV.