Procuradoria abre apuração sobre denúncia de propina em compra de vacinas no governo Bolsonaro
Representante de empresa afirmou à Folha que proposta partiu de Roberto Dias, então diretor do Ministério da Saúde
A Procuradoria da República no Distrito Federal abriu uma apuração preliminar sobre o suposto pedido de propina por parte de Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde.
Tecnicamente conhecida como notícia de fato, a apuração consiste no levantamento de informações iniciais sobre o ocorrido e pode levar a desdobramentos nas áreas criminal e administrativa.
O trabalho está a cargo da procuradora Melina Montoya Flores. De acordo com a Procuradoria, a apuração tramita sob sigilo. O prazo é de 30 dias, prorrogáveis. A reportagem entrou em contato com a defesa de Dias, mas não houve resposta até a conclusão deste texto.
Em entrevista à Folha, o policial militar Luiz Paulo Dominghetti Pereira, representante da empresa Davati Medical Supply, disse que Dias cobrou a propina em um jantar em um restaurante de Brasília em dia 25 de fevereiro.
Dominghetti afirmou que recebeu de Dias pedido de propina de US$ 1 por dose em troca de fechar contrato com o Ministério da Saúde. Dias foi demitido do ministério horas após a publicação da entrevista de Dominghetti.
Após a publicação da reportagem, o líder da minoria na Câmara, Marcelo Freixo (PSB-RJ), o líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ), e demais líderes de partidos de oposição ao governo Jair Bolsonaro enviaram uma representação ao Ministério Público Federal. O documento foi protocolado no dia 2.
Na CPI da Covid no Senado, Dominghetti repetiu as acusações e disse que esteve no ministério três vezes para tratar da proposta da venda. A Davati buscou a pasta para negociar 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca com uma proposta feita de US$ 3,50 por cada (depois disso passou a US$ 15,50).
Ele ressaltou aos senadores que se surpreendeu ao saber que o então secretário-executivo Elcio Franco, braço direito do ex-ministro Eduardo Pazuello, não sabia de uma oferta grande como aquela, envolvendo 400 milhões de doses.
Também na CPI, Dias confirmou à CPI o jantar no dia 25 de fevereiro com Dominghetti, mas negou ter cobrado propina de US$ 1 por dose para negociar vacinas ao governo federal.
O diretor exonerado logo após a denúncia de propina disse aos senadores que não tratava da compra dos imunizantes, apesar de reconhecer que conversou por mensagens de celular e por email com representantes da Davati Medical Supply.
O ex-diretor afirmou à CPI que se encontrou por acaso com o policial no restaurante Vasto, em um shopping na região central de Brasília (DF). “Não era um jantar com fornecedor, era um jantar com um amigo”, disse.
Dias ainda jogou sobre a Secretaria-Executiva da Saúde, área dominada por militares durante a gestão de Eduardo Pazuello, responsabilidades por definir preços, volumes e as empresas contratadas nas negociações por vacinas.
Em mensagem por áudio veiculada durante a sessão da CPI, obtida do celular de Dominghetti, que foi apreendido, o PM afirmou a um interlocutor que teria uma reunião com Dias no dia 25 de fevereiro, o dia do jantar no restaurante de Brasília.
Em meio a contradições e lacunas no depoimento, Dias foi levado preso pela Polícia do Senado após ordem do presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM). Ele foi liberado no mesmo dia, após o pagamento de fiança no valor de R$ 1,1 mil.