CRICIÚMA

Professor é demitido ao exibir clipe de Criolo: ‘Não permitiremos viadagem’

Um parada LGBTQIA+ foi marcada para sábado (28), às 14 horas, no parque da Prefeitura

Professor é demitido ao exibir clipe de Criolo: 'Não permitiremos viadagem' (Foto: prefeitura de Criciúma)

“Não permitiremos viadagem em sala de aula”. Com essas palavras, o prefeito Clésio Salvaro (PSDB), anunciou (em vídeo) a demissão de um professor da Rede Municipal de Ensino de Criciúma (SC). O motivo alegado para o desligamento do profissional foi a exibição do clipe da música “Etérea”, do cantor Criolo, que, segundo o prefeito, é erotizada e “inapropriada”.

Na manhã desta quinta-feira (26), a cidade passou por uma série de protestos, amanheceu com prédios públicos pichados, além de ter a administração criticada nas redes sociais. Uma edição extraordinária da parada LGBTQIA+ foi convocada para este sábado (28). A canção “Etérea”, que aborda uma mensagem social e de diversidade, chegou a concorrer ao Grammy Latino de melhor canção em Língua Portuguesa em 2019.

O fato se tornou público depois que os pais de alguns alunos teriam denunciado a exibição do vídeo a seus filhos durante uma aula de artes na Escola Municipal Pascoal Meller, na manhã de terça-feira (24). Ao tomar conhecimento do caso, ontem, o prefeito da cidade gravou um vídeo determinando a imediata exoneração do educador (que não teve a identificação divulgada). “Nós não permitimos, nós não toleramos. Está demitido este “profissional”, disse.

O prefeito completou afirmando que nas escolas de Criciúma, enquanto ele estiver na cadeira de prefeito, fatos como este não serão tolerados. “Essa viadagem na sala de aula, nós não concordamos. E se os pais souberem de algo parecido, que foi exposto para os seus filhos, por favor, entrem em contato com o Município de Criciúma, que o professor que apresentou esse tipo de vídeo ou comportamento inapropriado, será exonerado, sem chance de continuar sendo funcionário da prefeitura”, completou.

O UOL entrou em contato com Clésio Salvaro na manhã de hoje e o prefeito manteve o discurso feito no dia anterior, mesmo questionado quanto ao vídeo em questão ser reconhecido no Brasil e no exterior. “Eu mantenho o que eu disse no vídeo. E mais, se alguém tem que se retratar (pelo que fez) é o professor, que de forma inadequada está apresentando aquele material aos alunos. Em Criciúma, isso não vai acontecer, pronto e ponto”.

Em nota conjunta, a Prefeitura e a Secretaria de Educação afirmaram que a prática pedagógica de professores da rede de ensino, é orientada a partir das Diretrizes Curriculares, por meio do Plano de Ensino Unificado e esse plano reúne os conteúdos que deverão ser ministrados junto aos estudantes em cada ano letivo. O que, na avaliação da pasta, não foi seguida pelo professor e motivou a demissão.

“Ressaltamos que o episódio recente, envolvendo conteúdo inapropriado em vídeo apresentado por um dos professores, além de não constar no Plano de Ensino da Rede, estando, portanto, em desacordo com a proposta do Conselho Nacional de Educação, não será tolerado pela Administração Municipal de Criciúma”, justificou.

Reações

Na manhã desta quinta-feira (26), protestos foram feitos na cidade contra as falas do prefeito, tidas como homofóbicas, e uma “Parada LGBTQIA+” foi marcada para sábado (28), às 14 horas, no Parque da Prefeitura. Também houve pichações em igrejas com frases contra a homofobia, contra o prefeito e contra o presidente Bolsonaro.

Sobre as pichações, Clésio Salvaro disse à reportagem do UOL que a prefeitura fez um boletim de ocorrência na Polícia Militar (PM) e está tomando providências. Ele também declarou que a atitude “retrata o nível dessas pessoas”.

Em publicação nas redes sociais, a vereadora Giovana Mondardo (PCdoB) destacou que existem muitas coisas que não podem ser toleradas, uma delas é a violência contra a população LGBT. “Em busca de atenção e oportunismo eleitoral para agradar o conservadorismo, o Prefeito de Criciúma Clésio Salvaro (PSDB) se declarou intolerante, preconceituoso, baixo e infeliz ao externalizar, sem nenhuma vergonha, falas homofóbicas”.

A vereadora afirmou ainda que grupos da cidade vão apresentar denúncia no Ministério Público contra o Prefeito Clésio Salvaro. Em nota oficial, o PT de Criciúma, também condenou o que chamou de ataque à liberdade de cátedra do educador, agressividade e homofobia.

“É de se lamentar a atitude do prefeito ao se debater temas tão importantes para a sociedade, como os levantados na música do Criolo e de fomentar ainda mais o preconceito num país em que mais se mata a população LGBTQIA+. Infelizmente vivemos em um Estado em que parlamentares e políticos se sentem à vontade para perseguir professores e intervir em sua liberdade de cátedra. Isso é inadmissível”, justificou.

“Espaço para debate”

O cantor Criolo usou as redes sociais para lamentar a demissão do professor, publicando o documentário novamente. “Mais uma vez, desde seu lançamento, o clipe e o documentário da música Etérea [com a participação de representantes de coletivos LGBTQIA+ nacionais] abrem espaço para o debate na sociedade brasileira, após a lamentável demissão de um professor depois de exibir o projeto em sala. Tanto o clipe como o doc, ambos sem nenhum tipo de restrição pelas diretrizes do YouTube, já foram exibidos em diversos festivais de cinema e instituições de arte, música e dança, ao longo dos quase dois anos de suas trajetórias internacionais”, escreveu.

A publicação do documentário foi feita, segundo o cantor, na esperança de que ele possa chegar mais longe, com mais pessoas entendendo e refletindo sobre o que acontece em nosso território e como o Brasil se tornou o país que mais mata sua população LGBTQIA+ em todo o planeta.

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