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Queda de contribuintes, que hoje é de 4 para cada aposentado, ameaça Previdência

País terá quase um beneficiário da Previdência para cada contribuinte em 2070

O envelhecimento mais rápido da população brasileira, acompanhado por uma redução no universo de pessoas com idade para trabalhar, vai impactar diretamente as contas da Previdência do país. Em 2070, a razão entre o número de contribuintes do sistema de aposentadorias e o número de pessoas que recebem o benefício deve chegar a 1,3. Atualmente, essa proporção é de quatro para cada beneficiário.

A projeção é do especialista Rogério Nagamine, ex-secretário do Regime Geral da Previdência, com base nos dados do IBGE divulgados no fim de agosto, e considera o regime de aposentadorias tanto de trabalhadores públicos como do setor privado no cálculo.

Nos últimos 40 anos, o universo de contribuintes para a Previdência, considerando aqueles com idade entre 15 e 59 anos, em relação à quantidade de aposentados — com 60 anos ou mais — caiu mais da metade. Em 1980, a proporção era de nove pagantes para cada pessoa que recebia o benefício. A expectativa é que essa razão continue caindo. Em 2034, por exemplo, deve baixar para três e chegar a dois em 2048.

As estimativas de Nagamine foram atualizadas com base na pesquisa de projeção da população, divulgada pelo IBGE no fim do mês passado — a primeira com base no Censo de 2022.

O pesquisador afirma que a fotografia coloca em xeque a sustentabilidade do regime de aposentadoria do país, de repartição, pelo qual os trabalhadores ativos contribuem para um bolo, que é repartido entre os beneficiários — e que hoje já tem pesados aportes da União porque as receitas não cobrem as despesas.

— Haverá um forte crescimento dos potenciais beneficiários e redução dos potenciais contribuintes ou da base contributiva — afirmou o especialista.

População idosa vai dobrar

Em 2054, a população de idosos deverá dobrar, dos atuais 34,2 milhões para 68,9 milhões. No mesmo período, a base de potenciais contribuintes deverá cair 13%, de 136,4 milhões para 118,6 milhões.

Já em 2070, o universo de pessoas com mais 60 anos deverá alcançar 75,3 milhões e o de brasileiros que contribuem com a Previdência deverá cair a 100 milhões, nas contas de Nagamine.

Para ele, a necessidade de fazer uma nova reforma da Previdência vai se impor em 2027, quando a última grande mudança no sistema, em vigor desde 2019, terá seus principais efeitos consolidados.

Ele mencionou que, além do regime de aposentadoria, o universo de idosos do país vai pressionar também outros serviços, como saúde e educação, o que exigirá políticas públicas adequadas.

Atualmente, a idade mínima de aposentadoria é de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, mas há regras especiais e de transição que permitem requerer o benefício com menos idade.

Dados do IBGE revelam que 81,8% dos aposentados e pensionistas têm menos de 60 anos. Trabalhadores entre 15 anos e 59 anos representam 94,4% do total de contribuintes da Previdência. Por isso, o estudo considera essa idade na comparação entre contribuintes e beneficiários.

O economista Fábio Giambiagi, que há vários anos se dedica ao tema previdenciário, alertou que a cada revisão dos dados populacionais pelo IBGE, há uma piora nas projeções. Ele destacou o encolhimento no número de crianças e no universo de adultos em idade de trabalhar.

Na projeção de 2018, a estimativa de adultos ativos era de 136,5 milhões em 2060. Na revisão feita em 2024, a expectativa é que, em 2060, o número de pessoas em idade de trabalhar caia para 126,1 milhões. São 10 milhões de trabalhadores a menos, destacou Giambiagi.

— Haverá cada vez menos pessoas para sustentar o conjunto de aposentados — afirmou.

Giambiagi lembrou que, em 2018, o IBGE projetou que haveria 43,8 milhões de crianças em 2024 e que esse número cairia para 33,6 milhões em 2060. Nessa última revisão, o número de crianças baixou para 41,1 milhões, devendo reduzir para 26,8 milhões em 2060.

O demógrafo Carlos Turra, que estuda o processo de envelhecimento há 30 anos, observou que a dinâmica é estrutural e se move ao longo de décadas.

— O problema é que a Previdência consome muitos recursos do Orçamento e não sobra para investir em outras frentes, como o cuidado com o idoso. O risco que enfrentamos, já conhecido, é a combinação de baixo crescimento econômico com custos crescentes devido ao envelhecimento populacional. É importante lembrar que as políticas de transferência de renda e o sistema de saúde pública já existentes são insuficientes para lidar com esse processo de envelhecimento.

Impacto na produtividade

Para o economista-chefe da Leme Consultores, José Ronaldo de Souza Júnior, a evolução da população no Brasil terá impactos na produtividade. Como a população total será maior do que o número de pessoas em idade de trabalhar, será preciso produzir mais para que a renda per capita cresça.

Além de ter que melhorar a qualidade da educação, será preciso investir em cursos técnicos profissionalizantes e formar nas universidades profissionais demandados pelo mercado.

Segundo Giambiagi, além de ajustes no regime previdenciário, como aumento da idade de aposentadoria dos trabalhadores rurais, hoje em 55 anos, será preciso discutir a indexação do salário mínimo aos benefícios para garantir a sustentabilidade do sistema.

— No caso da política do reajuste do salário mínimo, quanto mais tempo durar, maior será o sarrafo para o futuro — afirmou.

Mudanças trabalhistas

Para os analistas, a ampliação dos contribuintes para a Previdência depende do mercado de trabalho. Além do crescimento da atividade econômica, eles avaliam que é preciso mexer nas leis trabalhistas para reduzir o custo da contratação, ainda elevado no Brasil, apesar da Reforma Trabalhista, aprovada em 2017.

Segundo especialistas, o regime específico do Microempreendedor Individual (MEI) poderia servir como instrumento para ampliar a base de contribuintes da Previdência, mas o problema é que o percentual de contribuição previdenciária é baixo, de apenas 5%. Combater a informalidade das empresas e criar alternativas para quem não contribui, e para quem contribui pouco podem ajudar, disse o economista José Ronaldo.

— Isso tem estimulado as pessoas a migrarem da contribuição como autônomo para MEI, o que reduz a arrecadação em nível individual e amplia o déficit atuarial — disse o economista José Ronaldo.

Segundo ele, um dos grandes desafios é regulamentar os prestadores de serviço das plataformas como Uber e iFood, pois a maioria é informal. O Ministério do Trabalho enviou um projeto ao Congresso para regulamentar os motoristas, mas ainda não conseguiu acordo para fazer a proposta avançar.

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*VIA O GLOBO