Redução da pensão por morte na reforma será desafio para as idosas
EDUARDO CUCOLO SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Aprendam a fazer o bem, busquem o direito,…
EDUARDO CUCOLO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Aprendam a fazer o bem, busquem o direito, socorram o oprimido, façam justiça ao órfão, defendam a causa da viúva.” Foram muitos os deputados, favoráveis e contrários à reforma da Previdência, que recorreram à citação do Livro de Isaías para defender regras menos rígidas na concessão de pensões por morte ao votar na quinta-feira (11) destaques ao texto principal, aprovado na véspera em primeiro turno na Câmara.
A preocupação se justifica. As novas regras para pensões são um dos pontos mais polêmicos da reforma e representam um desafio financeiro para as mulheres, principalmente as idosas.
Viúvas, ex-cônjuges, filhas, irmãs e mães respondem por 83% dos que recebem pensão por morte do INSS, segundo o Anuário Estatístico da Previdência. Entre as pensionistas, 71% têm 60 anos ou mais.
Sob as novas regras, o pagamento para o principal beneficiário será de 60% do valor original da aposentadoria do INSS, mais 10% por dependente adicional.
A viúva com dois filhos receberá 80% do que era pago a quem morreu. Hoje, o valor corresponde a 100% do benefício, independentemente do número de pessoas na família.
Com a nova regra, ela poderá receber menos de um salário mínimo, algo que não ocorre hoje. O piso será de R$ 598,80 no regime geral.
A reforma também limita o acúmulo de pensão e aposentadoria. Serão pagos 100% do benefício de maior valor, mais a soma dos demais aplicada a limitação de 80% na faixa até 1 salário mínimo; 60% acima de 1 até 2; 40% acima de 2 até 3; 20% acima de 3 até 4; e 10% na faixa acima de 4 mínimos.
Na quinta, os congressistas fizeram uma alteração para permitir que a pensão não seja menor que o salário mínimo (R$ 998) se for a única renda do dependente principal –independentemente da dos demais membros da família.
Essa alteração teve o apoio da bancada evangélica, que se juntou a partidos de esquerda nas 130 citações às viúvas, aos órfãos e à Bíblia. A oposição, aliás, tentou manter as regras atuais, mas foi derrotada.
As pensões por morte previdenciárias representam um quarto dos benefícios do regime geral. O governo estima uma economia em torno de R$ 130 bilhões em dez anos com as mudanças, quase 15% do impacto total da reforma.
Como a Câmara irá votar a proposta em 2º turno em agosto e a reforma também precisa do aval do Senado, as regras podem mudar. Além disso, para especialistas em direito previdenciário, a questão será judicializada.
Diego Cherulli, diretor do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), diz que, em muitos casos, mesmo com um filho completando 21 anos, os gastos da família continuam os mesmos. Por isso, para ele, seria mais justo que ao menos parte da cota desse dependente fosse revertida para outros familiares.
“O salário mínimo é o mínimo existencial para o núcleo familiar. A pensão também é um benefício substituidor de renda. Sendo aprovado, provavelmente virão ações de inconstitucionalidade”, afirma.
“Um benefício abaixo do salário mínimo viola um direito fundamental. É um tema para o Judiciário. A pessoa não vai ter uma Previdência mínima, que foi o que o segurado custeou”, diz João Badari, especialista em direito previdenciário e sócio da Aith, Badari e Luchin Advogados.
Ele cita como positiva a exceção criada para pessoas com deficiência ou incapacidade, que receberão o valor integral.
O advogado afirma que outro aspecto negativo é que foram mantidas regras diferenciadas para servidores públicos, o que contraria o discurso do governo de que a reforma acaba com privilégios.
Não se alterou, por exemplo, a regra de pensões de servidores estaduais e municipais. Além disso, há benefícios para funcionários federais.
Embora mantenha a mesma regra do INSS que permite receber menos de 100% do benefício original, o novo texto da reforma excluiu o desconto de 30% da parcela que excede o teto do RGPS (R$ 5.839,45) para o servidor.
No setor público federal, o valor médio do benefício é de R$ 5.195 no Poder Executivo e chega a uma média de R$ 21.167 no Legislativo. No regime geral, é de R$ 1.687.
“Sobrou quase tudo para o regime geral”, afirma Badari ao apontar os trabalhadores do setor privado como os mais afetados pelas mudanças. “É uma reforma que está criando privilégios.”