O deputado Jovair Arantes (PTB-GO), relator do pedido de impeachment contra Dilma Rousseff, disse em seu parecer lido nesta quarta-feira (6) que há indícios gravíssimos de prática dolosa da presidente da República, em condutas que atentam contra a Constituição (leia abaixo a íntegra do relatório).
Novamente em meio a muita confusão e gritaria, com protestos de ambos os lados e ameaças de recursos à Justiça, Jovair afirmou, em seu relatório de 128 páginas, que as suspeitas contra a petista não representam “meros desvios de tecnicismo”, mas “grave violação de valores ético-jurídicos que fundamentam e legitimam o exercício do poder estatal”.
“Os atos praticados pela denunciada, se confirmados, representam condutas gravíssimas e conscientes de desrespeito a um Poder da República, em uma de suas missões mais nobres e relevantes para a função de representação popular, e, portanto, consistem, à primeira vista, em um atentado à Constituição.”
Para o relator, “a magnitude e o alcance das violações praticadas pela presidente da República, em grave desvio dos seus deveres funcionais e em quebra de grande confiança que lhe foi depositada, justifica a abertura do excepcional mecanismo presidencialista do impeachment”.
Jovair concentrou seu parecer na análise de que Dilma cometeu crime de responsabilidade ao autorizar créditos suplementares sem aval do Congresso Nacional e ao praticar as chamadas pedaladas fiscais, que são empréstimos de bancos federais para cobrir despesas a cargo do Tesouro Nacional.
A denúncia foi protocolada pelos advogados Miguel Reale Júnior, ex-ministro do governo FHC, Hélio Bicudo (ex-PT) e Janaina Paschoal. A defesa da presidente, feita na comissão na semana passada pelo advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, negou que ela tenha cometido crime de responsabilidade.
Sobre os decretos, o deputado do Jovair afirmou ver sinais de “inconstitucionalidade, ilegalidade e irresponsabilidade fiscal” e que “há sérios indícios de conduta pessoal dolosa da presidente da República que atentam contra a Constituição Federal”.
Um dos principais aliados do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que é adversário do governo, Jovair disse que sabe que será chamado de “golpista”, mas que não se preocupa com isso.
“Quando um grupo político está no poder, diz que é golpe. Quando o mesmo grupo era oposição, tratava-se de um processo legítimo. É preciso coerência nesse momento.”
Como era esperado por governistas e pela oposição, o deputado do PTB fez um relatório duro contra Dilma. Segundo ele, os “mais de 54 milhões de votos” recebidos na reeleição da petista não lhe dão “um salvo-conduto para praticar quaisquer atos, ainda que nocivos ao país e, principalmente, contrários à lei e à Constituição.”
“Segundo a minha análise, a magnitude e o alcance das violações praticadas pela presidente da República constituíram grave desvio dos seus deveres funcionais, com prejuízos para os interesses da nação e com a quebra da confiança que lhe foi depositada. Tais atos justificam a abertura do excepcional mecanismo do impeachment. “
Manobras fiscais
Para o relator, os atrasos sistemáticos do Tesouro no pagamento de repasses aos bancos públicos, que ficaram conhecidos como pedaladas fiscais, equivale ao uso, pelos cidadãos comuns, do crédito rotativo do cartão de crédito ou cheque especial em emergências. De acordo com Jovair, assim, caracteriza-se uma operação de crédito, o que é vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
“Dos elementos fáticos trazidos pela denúncia, parece evidente que persistentes atrasos no pagamento de compromissos financeiros do Tesouro Nacional junto ao Banco do Brasil, ou a qualquer outra instituição financeira controlada, não se coadunam com o planejamento, a prevenção de riscos e a transparência, princípios basilares da gestão fiscal”, argumentou o relator.
De acordo com o relator, os atrasos nos repasses de recursos do Tesouro às instituições financeiras oficiais devem ser coibidos por se tratar de uma “prática condenável de gestão fiscal.”
Lava Jato
Jovair Arantes argumenta ainda que a “gestão temerária” da presidenta teve como resultado “uma crise de solução dolorosa, sem precedentes no país”. “A denunciada não pode se eximir de sua responsabilidade, como condutora maior da política econômica e fiscal do país.”
Segundo o deputado, se a Câmara não analisar pelo menos a admissibilidade do pedido de impeachment, não estará contribuindo para a superação da atual crise vivida pelo país. “Embora não tenha utilizado, como fundamento jurídico para a formulação deste parecer as acusações de improbidade direcionadas contra a denunciada, não podemos desconsiderar a perplexidade da população com as constantes revelações das investigações da Operação Lava Jato sobre o maior esquema de corrupção de que se tem notícia. O povo brasileiro demanda e merece uma resposta! E tal resposta somente pode ser dada pelo julgamento da presidente pelo Senado Federal”, diz Arantes.
REAÇÃO
O deputado Wadih Damous (PT-RJ), que comanda a estratégia jurídica do governo na comissão, disse que os deputados aliados a Dilma vão apresentar um voto divergente na próxima segunda-feira (11), dia da votação no órgão.
Segundo ele, o voto será apresentado mesmo se o relatório do deputado Jovair for aprovado. O objetivo é mostrar no plenário que há “outras razões, outras fundamentações, no sentido de que não houve crime de responsabilidade por parte da presidente”.
“Este relatório [de Jovair] está muito fraco”, disse.
A comissão especial da Câmara tem 65 membros titulares. Por enquanto, governistas e oposicionistas avaliam haver uma pequena maioria pró-impeachment. A votação final na Câmara deve começar na sexta-feira (15) e pode ser concluída somente no domingo (17).
Caso pelo menos 342 dos 513 deputados apoiem o impeachment, o Senado fica autorizado a abrir o processo. Se o fizer, Dilma é afastada do cargo.