Ricardo Salles chega a Washington para amenizar danos das queimadas à imagem do país
Apesar de esta ser uma visita oficial, a assessoria do ministro relutou durante a semana em divulgar os detalhes da agenda
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, chegou a Washington na quarta (18). Na Câmara do Comércio dos EUA, foi recebido por manifestantes de ONGs como Greenpeace, Code Pink e Amazon Watch, que o chamaram de “terrorista” e “traidor”.
“Esse governo precisa saber que, onde quer que vá, vamos protestar”, disse à reportagem Andrew Miller, diretor de advocacia do Amazon Watch. Ele carregava uma caixa de fósforo gigante. “O que acontece na Amazônia importa a todos”, disse Diana Ruiz, do Greenpeace.
Representando um governo em que alguns membros questionam ou negam o aquecimento global, Salles deve aproveitar a viagem para amenizar o dano que as queimadas na Amazônia causaram à imagem do Brasil. No sábado, vai a Nova York e se une à comitiva brasileira na Assembleia-Geral da ONU, com início na terça-feira (24).
Ele fica até o sábado, e a previsão é de que faça calor – dois dias antes de o ministro pousar, a Noaa (Administração Nacional Oceânica e Atmosférica, órgão oficial americano) decretou que este foi o verão mais quente no hemisfério norte desde 1880.
Apesar de esta ser uma visita oficial, a assessoria do ministro relutou durante a semana em divulgar os detalhes da agenda. Uma versão provisória foi encaminhada à reportagem, mas a lista definitiva –com local e horário de seus compromissos– seguiu em sigilo até quase as 14h do horário local (15h em Brasília). A assessoria também não informou à imprensa onde o ministro está hospedado, sugerindo que tal pedido seja feito via lei de acesso à informação. Ademais, todos os encontros são fechados para a imprensa.
Como parte do tour institucional, com a intenção de falar ao público estrangeiro, Salles começou a agenda com uma visita ao jornal Wall Street Journal. Ele pretendia também se encontrar com os meios Reuters e Bloomberg. Sobre os investidores com que se encontrou na Câmara de Comércio dos EUA, Salles disse a repórteres que há “otimismo” em relação ao Brasil. “Nosso papel é responder com políticas públicas adequadas.”
Além da imprensa estrangeira e da EPA (agência americana de proteção ambiental), os demais encontros previstos ao ministro têm um viés de negócio. Ele pode visitar a empresa química Bayer e o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
Por outro lado, foi cancelada a conversa com o líder do Competitive Enterprise Institute, um controverso instituto que questiona o aquecimento global, dizendo haver alarmismo sobre o tema. O ministério diz que havia conflito de horários.
Não há na agenda nenhum encontro com autoridades políticas dos Estados Unidos. Há, no entanto, crescente pressão vinda de legisladores americanos para que o governo de Jair Bolsonaro (PSL) resolva de vez a crise amazônica.
Na terça-feira (17), o deputado democrata Peter DeFazio liderou um grupo de legisladores que enviaram cartas a diversas firmas multinacionais para que pressionem o Brasil a proteger a floresta. As empresas que receberam a missiva incluem Nestlé, Danone, Kellogg’s, L’Oreal e Unilever. DeFazio defende, ademais, que companhias deixem de importar soja e carne brasileira e pede que o Congresso impeça os EUA de negociar um acordo de comércio com o Brasil.
No Senado, o democrata Bob Menendez liderou por sua vez um grupo de senadores pedindo que a administração de Donald Trump ajude o Brasil a combater os incêndios. A carta assinada pelo grupo expressa preocupação em relação às políticas de Bolsonaro. O texto critica, por exemplo, a hostilidade do presidente às leis de conservação existentes.
A crise da Amazônia remonta a 10 de agosto, quando fazendeiros no Pará convocaram um “dia do fogo”. Segundo relatos, produtores rurais se coordenaram para queimar pasto naquela data. As queimadas se espalharam, alarmando ambientalistas dentro e fora do país. Em um dos episódios mais dramáticos, a fumaça das queimadas– somadas à de outros países na região –fez São Paulo anoitecer às 15h. Segundo dados do Deter, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o desmatamento na Amazônia aumentou 222% em agosto deste ano em comparação com o mesmo período em 2018.
Houve duras críticas ao governo Bolsonaro por abrir mão de verbas destinadas àquela região, como o Fundo Amazônia. O discurso de Bolsonaro quanto à fiscalização ambiental e a aproximação de parte de sua equipe, incluindo o ministro Salles, a setores interessados em explorar a Amazônia foram vistos como um maior incentivo a queimadas.
Questionado sobre o tema, o presidente acusou ONGs – sem apresentar provas –de promoverem queimadas. Bolsonaro comprou briga, no meio-tempo, com o presidente francês, Emmanuel Macron, que chegou a sugerir que brasileiros mereciam melhor líder.