O desenvolvimento de distúrbios do espectro autista por crianças cujas mães usaram antidepressivos durante a gravidez é objeto de muitas controvérsias entre os cientistas, mas agora um novo e amplo estudo realizado no Canadá parece reforçar esta hipótese.
Segundo pesquisadores liderados por Anick Bérard, professora da Universidade de Montreal e uma das mais reconhecidas especialistas do mundo na área de segurança de fármacos na gestação, o consumo destes remédios, particularmente os da classe conhecida como inibidores seletivos de recaptação de serotonina (SSRIs, na sigla em inglês) — que inclui marcas como Prozac, Zoloft e Lexapro —, no segundo e terceiro trimestres da gravidez pode aumentar em até 87% os riscos do surgimento deste tipo de distúrbios em seus filhos.
Para chegar a esta conclusão, Anick e seus colegas usaram dados da Coorte de Gravidez do Québec, que acompanhou mais de 186 mil gestações e a saúde das mães e crianças delas resultantes na província canadense entre 1º de janeiro de 1998 e 31 de dezembro de 2009. Destas, quase 146 mil se encaixaram nos critérios da pesquisa, do nascimento a termo de uma única criança. Os cientistas cruzaram então estes dados com informações sobre a prescrição de antidepressivos para as mulheres e eventual diagnóstico de distúrbios do espectro autista de filhos no sistema de saúde do Canadá, ajustando para fatores como idade materna e histórico de doenças mentais delas e na família.
No estudo, 1.054 crianças, ou 0,72% do total, foram diagnosticadas com algum distúrbio do espectro autista em média aos 4,5 anos de idade. Além disso, a prevalência destes males teria subido de quatro a cada 10 mil crianças em 1966 para 100 em cada 10 mil hoje.
Outros especialistas, no entanto, recomendam receber com cautela os resultados do estudo, publicado na edição de ontem do periódico científico “JAMA Pediatrics”. Para eles, antes de chegar a qualquer conclusão definitiva sobre os riscos para os bebês, é preciso buscar replicá-lo, de preferência de forma multicêntrica, isto é, em vários lugares com populações diversas. Além disso, eles apontam que não tratar uma gestante com um quadro de depressão grave pode ser ainda mais perigoso tanto para a mulher quanto para a criança. (Do jornal O Globo)