MOBILIZAÇÃO NACIONAL

Semana de combate ao trabalho escravo terá atividades online

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) iniciou hoje (11) a Semana de Comunicação em Combate…

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) iniciou hoje (11) a Semana de Comunicação em Combate ao Trabalho Escravo, organizada anualmente na Bahia, e que se tornou uma mobilização nacional na edição deste ano. Tradicionalmente, as atividades – que abrangem oficinas, palestras em escolas e panfletagens de materiais educativos -, são realizadas em um período que coincide com a data de abolição da escravatura, 13 de maio de 1888, quando a Lei Áurea foi assinada.

No entanto, com a pandemia de covid-19 neste ano, a programação foi adaptada para transmissão online de conteúdos e inclui uma live, na quarta-feira (13), com o tema “O trabalho escravo ainda tem cor?”. A programação pode ser conferida no site da comissão e nas páginas da CPT no Facebook.

Definição

A legislação brasileira classifica como trabalho análogo à escravidão toda atividade forçada, desenvolvida sob condições degradantes ou em jornadas exaustivas (que levam ao esgotamento do trabalhador e coloquem em risco sua saúde ou mesmo sua vida). Também é assim designado qualquer caso em que o funcionário seja vigiado constantemente, de forma ostensiva, por seu patrão.

O trabalho forçado se configura quando uma pessoa é obrigada a desempenhar uma função mediante ameaças e violências físicas ou psicológicas. Outra estratégia ilegal e passível de denúncia é a servidão por dívida, que ocorre quando o funcionário tem seu deslocamento condicionado ao pagamento de determinada quantia de dinheiro.

Esses elementos podem estar associados ou serem praticados de forma isolada pelos empregadores. Conforme consta do Artigo 149 do Código Penal Brasileiro, patrões que submetam seus funcionários a atividades laborativas similares à escravidão estão sujeitos a uma pena de dois a oito anos de reclusão e multa, além da pena correspondente à violência praticada.

Vítimas

Segundo Hamilton Luz, membro da campanha da CPT “De olho aberto para não virar escravo!”, somente neste ano, 15 pessoas foram resgatadas de situações análogas à escravidão, na Bahia. No estado, a maioria dos 13 empregadores relacionados na lista suja de trabalho escravo, divulgada pelo Ministério da Economia em meados de abril, é de proprietários de fazendas de criação de boi e cultivo de milho, cacau ou café.

O representante da CPT ressalta, porém, que o trabalho escravo não acontece apenas na zona rural, mas também em espaços urbanos. Em entrevista à Agência Brasil, ele relatou que os trabalhadores resgatados durante as fiscalizações deste ano eram de uma equipe de manutenção de parques de diversão e destaca que o perfil das vítimas varia, embora haja um elemento em comum: integram a parcela da sociedade que já se encontra sem a proteção do Estado. A avaliação que faz é de que o alto índice de desemprego no país pode ocasionar, inclusive, a revitimização de trabalhadores.

“Já foi encontrado trabalhador em construção civil, fábrica de calçados, confecção. Muitas vezes, encontram-se crianças, adolescentes. Tudo isso, a gente acredita que, com o aumento do desemprego, a falta de reforma agrária, a concentração de terra, é um meio de fazer com que trabalhadores não pensem duas vezes quando recebem proposta de emprego, porque pais e mães de família, estando desempregados, vendo filho passar necessidade, quando recebem a primeira proposta, aceitam”, diz.

“A prática, hoje, não recai somente sobre a população negra. Claro que é a mais sofrida dentro dessa realidade, mas o empregador se aproveita principalmente de pessoas mais pobres, desempregadas. E, agora, com a flexibilização das leis trabalhistas, vai se tornando quase normal e o trabalhador fica mais vulnerável”, acrescenta.

Fiscalização

Em nota publicada em abril, o Ministério Público do Trabalho (MPT) destaca que a pandemia provocou mudanças no esquema de fiscalização, na Bahia. Atualmente, as inspeções estão sendo feitas a cada dois meses.

Perguntado sobre a importância da atuação dos fiscais, Hamilton Luz pondera que, mesmo quando se nota uma diminuição na quantidade de resgates, isso não significa que o trabalho escravo contemporâneo está acabando. Ele alerta que, muitas vezes, os trabalhadores não se dão conta de que estão sendo vítimas desse tipo de crime e exemplifica: “Teve um grupo de jovens que foi levado para o Pará, com proposta de emprego, carteira assinada, para poder enviar dinheiro para a família e tal. Foram e não conseguiram nem pagar a passagem de volta. Perceberam que estavam vivenciando essa prática quando ligaram pras famílias e elas tiveram que fazer uma vaquinha para mandar dinheiro para eles pagarem a dívida que tinham com a fazenda e poder voltar.”

Luz argumenta, ainda, que o fato de trabalhadores não se perceberem como vítimas faz com que deixem de denunciar as violações a seus direitos. E, sem denúncia, prossegue o representante da CPT, não há fiscalização, já que muitos locais onde os crimes são cometidos não podem ser facilmente rastreados.

“O problema é a denúncia, porque são setores muito escondidos, de difícil acesso. Muitas vezes, os trabalhadores nem sabem para onde estão indo. A fiscalização depende da denúncia, e o medo é uma das coisas que ainda fazem com que eles não formalizem a denúncia. Muitas vezes, são resgatados e voltam para a mesma situação, porque não têm algo de concreto que possa permitir que vivam longe dessa realidade.”

De 1995 a 2019, 54.687 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão, na contagem do Ministério da Economia. O ano de 2019 foi encerrado com um total de 1.054 pessoas resgatadas e 267 estabelecimentos fiscalizados.