STF estuda criar restrições a quem não se vacinar, em vez de imunização obrigatória
Quem se recusar a ser imunizado não poderia, por exemplo, realizar viagens nacionais e internacionais em transportes públicos ou entrar em estabelecimentos comerciais
Uma solução intermediária está sendo cogitada no Supremo Tribunal Federal (STF) para resolver a polêmica sobre a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19. Um dos ministros deve propor, em plenário, que tomar a vacina seja opcional. No entanto, quem não quiser ser imunizado, ficaria sujeito a uma série de restrições – não poderia, por exemplo, realizar viagens nacionais e internacionais em transportes públicos, ou entrar em estabelecimentos comerciais.
Segundo esse ministro, não se pode obrigar ninguém a ser submetido a determinado procedimento médico. Porém, a opção individual não poderia sacrificar o direito coletivo à saúde, previsto na Constituição Federal. Portanto, quem não quiser tomar vacina, não poderia colocar em risco o restante da população.
Nessa solução intermediária, o STF poderia criar a condição de vacinação para viagens, por exemplo. E deixar a cargo dos comerciantes a exigência da carteira de vacinação atualizada dos clientes. Segundo o ministro que conversou reservadamente com O GLOBO, os donos de bares e restaurantes teriam interesse na obrigatoriedade da vacinação, para evitar eventual segunda onda da Covid-19, com necessidade de “lockdown” e comprometimento da atividade comercial.
Essa posição, no entanto, não é unanimidade no STF. Outro ministro revelou reservadamente que é a favor da vacinação obrigatória. Para ele, não existe livre arbítrio quando o ato de uma só pessoa coloca em risco a saúde de toda a coletividade.
O ministro Marco Aurélio não adiantou a posição dele, destacando que ainda é tudo muito precoce nessa discussão, sendo necessário esperar a posição do relator das ações. Mas ponderou que o STF é a “última trincheira da cidadania”.
— É um tema em aberto, para saber se vinga a autodeterminação de cada cidadão ou se há um bem a ser protegido, coletivo, que é a saúde pública. Isso é que o Supremo terá que decidir, se realmente for colocada a matéria. Então temos valores. De um lado o valor individual, a autodeterminação de cada qual. Do outro, nós temos saúde pública, que aí o interesse é coletivo — disse Marco Aurélio.
Na semana passada, o ministro Ricardo Lewandowski, relator das ações relacionadas às vacinas de Covid-19, pediu informações à Presidência da República, à Advocacia-Geral da União (AGU) e à Procuradoria-Geral da República (PGR). Depois de receber os esclarecimentos, ele deve liberar os processos para julgamento em plenário. A expectativa é que isso ocorra na primeira quinzena de novembro. Em seguida, o presidente do STF, Luiz Fux, agendaria data para o julgamento.
‘Lei da quarentena’
Há um debate sobre a obrigatoriedade ou não da vacinação, que poderá começar a ser aplicada no ano que vem, caso haja aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O presidente Jair Bolsonaro já disse ser contra. Mas a lei nº 13.979 de 2020, sancionada por ele mesmo no começo da pandemia, a chamada “lei da quarentena”, autoriza vacinação compulsória, além de outras medidas preventivas para enfrentar uma emergência de saúde pública de importância internacional, caso da Covid-19.
Já há quatro ações sobre o tema no STF, todas relatadas por Lewandowski. Uma, de autoria do PTB, quer suspender o trecho da lei sancionada por Bolsonaro. Outra, do PDT, tem por objetivo declarar que estados e municípios também podem exigir vacinação compulsória, uma forma de driblar a resistência do presidente da República.
As outras duas ações, uma do partido Rede Sustentabilidade, e outra dos partidos Cidadania, PSB, PSOL, PT e PCdoB, são mais amplas. Entre outras medidas, tentam garantir que o governo federal não impeça a aquisição de doses da vacina CoronaVac, do laboratório chinês Sinovac, que, no Brasil, firmou uma parceria com o Instituto Butantan, ligado ao governo de São Paulo. O Ministério da Saúde chegou a dizer que compraria doses da vacina, mas foi depois desautorizado por Bolsonaro.
Por questões processuais, os prazos dados foram diferentes. No caso das ações do PTB e do PDT, são dez dias para a Presidência da República se manifestar. Já na ação do Rede Sustentabilidade, são cinco dias.
Nesta segunda-feira o PTB fez um pedido para que Lewandowski não libere logo as ações para julgamento no plenário. O partido, que é contra a obrigatoriedade da vacina, quer que seja realizada primeiramente uma audiência pública, com a participação de especialistas.