DINHEIRO CONGELADO

Suíça mantém confiscados R$ 2 bi de corrupção de suspeitos da Lava Jato

Cooperação entre o Brasil e a Suíça levou as autoridades em Berna a inicialmente congelar 1,1 bilhão de francos suíços em mais de 40 bancos diferentes

Banco suíço em Genebra (Foto: reprodução/UOL)

Bancos suíços ainda mantêm congeladas dezenas de contas relacionadas com suspeitos de corrupção em casos envolvendo as investigações iniciadas pela Operação Lava Jato no Brasil. De acordo com o Ministério Público da Suíça, um total de 310 milhões de francos suíços (cerca de R$ 1,9 bilhão) aguarda ainda uma definição jurídica ou a condenação dos suspeitos.

Iniciada em 2014 e tendo sido aprofundada a partir de 2015, a cooperação entre o Brasil e a Suíça levou as autoridades em Berna a inicialmente congelar 1,1 bilhão de francos suíços em mais de 40 bancos diferentes. Ao longo dos anos, uma parte substancial desses recursos foi devolvida aos cofres públicos, não apenas no Brasil, mas também a outros países e instituições lesadas pela corrupção.

Volumes importantes foram restituídos graças aos acordos de delação premiada. Nas negociações, os suspeitos concordavam em dar informações sobre como o mecanismo de corrupção funcionava e devolverem o dinheiro desviado e, em grande parte, depositado em contas na Suíça.

Uma parcela dos recursos não fez parte das delações e suspeitos continuam lutando nos tribunais para evitar que o dinheiro seja repassado ao estado brasileiro ou outras partes que poderiam ser vítimas da corrupção.

Para que os bancos suíços possam fazer a devolução, os suspeitos precisam ter sido condenados em última instância em seu país de origem. Além disso, os recursos bloqueados precisam ter uma relação direta com o crime.

Fontes no Brasil consideram que alguns desses casos podem levar uma década para serem concluídos.

Entre os atores envolvidos, a percepção é de que o encerramento institucional da Força Tarefa da Lava Jato pode ter um impacto na recuperação dos ativos. Nos casos que já estão em andamento, a esperança é de que o processo de recuperação continue. No restante, o temor é de que a cooperação seja mais lenta.

Um dos instrumentos capazes de impedir que o dinheiro seja liberado e devolvido aos suspeitos é um envio praticamente trimestral por parte do Brasil aos suíços sobre os andamentos dos processos, justamente para mostrar que o trâmite não foi abandonado. A dúvida no Ministério Público é se o desmonte da força tarefa permitirá que esses relatórios possam ser elaborados.

Há ainda entre juristas suíços a percepção de que o Brasil poderia ampliar seus benefícios financeiros se optasse por entrar com processos contra operadores financeiros e mesmo contra os bancos que facilitaram a fuga dessas fortunas ao país europeu. No final de 2020, depois de anos de tratativas e negociações, o Brasil contratou um escritório de advogados em Genebra para liderar o processo de recuperação de recursos.

A contratação foi alvo de um questionamento legal. O TCU apresentou um recurso e, entre os argumentos, o que procuradores alertam é que a iniciativa não traria vantagens reais. Um dos pontos levantados se refere ao fato de que, mesmo que esses advogados atuem em nome do Brasil, eles não poderiam ter acesso aos documentos que são produzidos pelo Ministério Público da Suíça.

Enquanto isso, na Suíça, o MP se concentra em investigar não apenas quem pagou e quem recebeu propinas mas também quem foram os intermediários. No total, a agência reguladora dos bancos do país (Finma) já multou cinco instituições financeiras diferentes por conta de sua participação na lavagem de dinheiro promovida pelos acusados na Lava Jato.

Investigações criminais também foram lançadas contra bancos e gerentes de contas. Num dos casos que já foi julgado, o suíço-brasileiro Bernardo Freyburghaus foi condenado no ano passado por ter contribuído por lavar US$ 60 milhões de acusados na Lava Jato, mas não pegou nem um só dia de prisão.

De acordo com documentos do Ministério Público da Suíça, ele “manifestou arrependimento sincero” e colaborou com as investigações. Sem ele, diz o MP, informações valiosas sobre a operação de corrupção envolvendo suspeitos na Lava Jato não teriam sido obtidas. O brasileiro ainda “reconheceu os fatos e participou plenamente do processo penal, colaborando de forma ativa com o MP”.

Ele ainda admitiu “reconhecer erros” e afirmou estar disposto a manter colaboração com a Justiça para outros processos. A Justiça o condenou a uma multa de 1,6 milhão de francos suíços. Ele também será detido por 16 meses se eventualmente voltar a cometer algum crime. “Meu cliente está feliz por ter virado a página e retomar uma vida normal”, disse na época o seu advogado, Christian Luscher.

No total, desde 2015, os suíços receberam 210 pedidos de informações de governos estrangeiros, principalmente do Brasil, em relação especificamente aos casos apurados na Operação Lava Jato. Cerca de 70 deles, porém, continuam aguardando por uma troca de dados.