Suprema Corte do México descriminaliza o aborto no país
Tribunal decide que penalizar a prática é inconstitucional; estados precisam regular a prática
A Suprema Corte do México descriminalizou o aborto no país em um julgamento nesta terça-feira (7). Os magistrados decidiram que são inconstitucionais os artigos do Código Penal que penalizavam a interrupção voluntária da gravidez.
A prática já é legalizada nos estados de Oaxaca, Veracruz e Hidalgo e na capital federal, a Cidade do Mexico —nos quatro casos, até a 12ª semana de gestação. Nos demais, só é permitido realizar o aborto em casos de estupro e risco de morte da mãe.
A decisão desta terça permite que os demais estados também legalizem a prática. No México, são os entes subnacionais que definem como devem funcionar as legislações sobre os direitos civis. Ou seja, para que o aborto seja permitido em todo o país, ainda é necessário que os legislativos regionais regulamentem a legislação; o julgamento da Suprema Corte facilita que eles avancem na formulação desses textos.
“Não tem cabimento dentro da doutrina jurisprudencial deste tribunal um cenário no qual uma mulher e as pessoas com capacidade de gestar não possam decidir se continuam ou não com a gravidez”, disse o juiz Luis María Aguilar ao votar.
Os debates sobre o tema na Suprema Corte tiveram início na segunda-feira (6), a partir de episódios nos estados de Coahuila e Sinaloa. Duas ações questionavam a constitucionalidade de condenações de três anos de prisão a mulheres que fizeram abortos de modo clandestino nesses locais.
México descriminaliza o aborto apõs longo debate
No debate no tribunal, que adentrou a noite, 8 dos 11 juízes se manifestaram contra as penas. Diante do quadro de maioria, outros dois se juntaram a eles na votação nesta terça.
Desde a noite anterior, houve manifestações contra e a favor da medida diante do prédio da Suprema Corte. Os que se posicionavam contrários ao aborto levavam cartazes dizendo “Salvemos as duas vidas”, além de imagens religiosas e rosários.
Entre os países-membros da OCDE, o México é o que tem a maior taxa de gravidez entre adolescentes, com 77 nascimentos por cada mil mulheres entre 15 e 19 anos. A estimativa do Ministério da Saúde é que sejam praticamos mais de 800 mil abortos clandestinos todos os anos no país.
De forte tradição católica, o México tem como presidente Andrés Manuel López Obrador, que, apesar de mais à esquerda, é conservador em termos de costumes e havia se posicionado contra a descriminalização. Em público, AMLO, como é conhecido, dizia que o tema, por ser “muito delicado e polêmico”, deveria ser resolvido por meio de um plebiscito, sua forma preferida de debater e legislar sobre diferentes assuntos.
O presidente vem sofrendo pressão do movimento feminista mexicano, que tem ganhado voz. A nova onda ganhou ainda mais força com a atual configuração do Congresso, agora com 50% de legisladoras mulheres.
As feministas enfrentam López Obrador em outros assuntos, como os feminicídios. No último ano, foram assassinadas 3.952 mulheres, aumento de 13% em relação a 2019. As marchas feministas que vêm sendo realizadas no país têm no direito ao aborto e na luta contra o assassinato de mulheres suas principais bandeiras.
Com a descriminalização nesta terça, agora o México depende das leis estaduais para se juntar a outros países da América Latina que permitem a interrupção da gravidez pela vontade da mulher. Em dezembro de 2020, a Argentina aprovou uma lei nesse sentido, autorizando a prática até a 14ª semana de gestação —decisão criticada pelo presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, que disse que, enquanto ele estiver no poder, não aprovará uma medida do tipo.
O aborto também está legalizado, dentro do mesmo prazo, no Uruguai, em Cuba e na Guiana.