Surto de dengue é o pior da década no DF e em cinco estados
Atual surto de dengue no Brasil mostra é o pior da década no Distrito Federal e em Goiás, Piauí, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins
Além de em apenas quatro meses já ter superado o número de casos registrados durante todo o ano passado, o atual surto de dengue no Brasil mostra a chegada do mosquito Aedes aegypti a novos locais e é o pior da década no Distrito Federal e em Goiás, Piauí, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins.
Os governados estaduais mais afetados e o governo federal apontam a pandemia de Covid-19 como uma das causas que dificultaram o combate à disseminação da doença.
Além da conhecida rotina de prevenção, a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz, vinculada ao Ministério da Saúde) diz ter obtido resultados promissores no uso da bactéria Wolbachia, cuja eficácia é testada desde 2014, mas o método é aplicado em poucas cidades.
Para combater o surto, os gestores de saúde em todos os níveis intensificam uma rotina já conhecida. Aplicação de larvicida, conscientização da população para que evite criar lugares propícios para a reprodução do mosquito e treinamento de agentes de saúde, entre outras atividades.
Apesar disso, o mosquito tem chegado a regiões que antes não tinham esse problema.
Esses são os casos de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Ambos têm um surto recorde de dengue.
Em Santa Catarina, foram 56 mil casos notificados no primeiro quadrimestre. É o terceiro ano seguido de crescimento. Antes de 2019, o recorde era de 4.800 casos entre janeiro e abril de 2016.
No Rio Grande do Sul, houve 41,4 mil casos. A explosão é similar à observada no estado vizinho, com um crescimento paulatino desde 2019, atingindo números muito maiores do que os registrados nos anos anteriores.
Entre as causas, a Secretaria de Saúde catarinense apontou “alterações nas condições climáticas, que permitem a reprodução do mosquito ao longo de todo o ano”. O frio impede a reprodução do mosquito. Com o aumento das temperaturas, o clima fica mais favorável para o Aedes aegypti.
Outro problema foi a pandemia. O Ministério da Saúde disse ter havido redução das visitas de agentes de saúde às residências “devido à dificuldade encontrada durante a emergência sanitária da Covid-19 para controlar a proliferação do mosquito”.
A Secretaria de Saúde de Tocantins, outro estado com número recorde, listou “o diagnóstico tardio pelos profissionais que estavam focados na Covid-19” e a “redução das ações de controle do vetor devido o direcionamento dos profissionais para o Covid-19”.
Em Niterói, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Campo Grande e Petrolina, a Fiocruz testa há alguns anos o uso da Wolbachia, paralelamente a pesquisas que estão sendo realizadas sobre o método em 11 países.
Essa bactéria está presente naturalmente dentro da célula de diversos insetos, mas não no mosquito que transmite a dengue, a zika e a chikungunya.
De acordo com Luciano Moreira, líder do WMP (sigla em inglês para Programa Mundial do Mosquito, que coordena o projeto em âmbito mundial) e pesquisador da Fiocruz, o primeiro passo do método, que por ora é complementar, consiste na introdução da bactéria nos ovos de Aedes aegypti.
Isso acontece em uma fábrica da Fiocruz no Rio de Janeiro e outra em Belo Horizonte, cidade que também já teve liberações de mosquitos. Depois disso, há duas opções: liberar os ovos ou o mosquito adulto.
Na natureza, o mosquito se reproduz e passa a bactéria para seus descendentes. Com o tempo, a tendência é que ele se torne dominante no local, dificultando assim a transmissão do vírus.
Em Belo Horizonte, os mosquitos foram liberados entre outubro de 2020 e janeiro de 2021. Os resultados só devem ser medidos daqui a quatro anos.
O primeiro local que recebeu mosquitos com a bactéria foi Niterói e alguns bairros do Rio de Janeiro, ainda em 2014. Ao analisar os dados coletados depois do experimento, a Fiocruz constatou uma redução de 70% no número de casos na comparação com bairros que não tinham recebido o método.
Campo Grande (MS) e Petrolina (PE) também já participam do programa. Além deles, mais de 20 municípios pediram adesão, porém a Fiocruz não tem capacidade para atender novas solicitações.
Para resolver o problema de oferta do mosquito com a bactéria, o plano é construir uma nova fábrica com capacidade de produzir 50 milhões de ovos por semana. Hoje, a capacidade é de 8 milhões. Caso haja a expansão, negociada entre Ministério da Saúde, Fiocruz e WMP, o “cálculo bastante conservador é de em dez anos cobrir 67 milhões de habitantes no Brasil (32% da população)”, diz Moreira.
Um estudo conduzido por pesquisadores das universidades de São Paulo (USP) e de Cambridge (Reino Unido) mostrou que moscas da espécie Drosophila melanogaster -comuns em qualquer cozinha- são infectadas por menos espécies de vírus e contêm menor carga viral quando são colonizadas por bactérias do gênero Wolbachia.
O trabalho, apoiado pela Fapesp e pela Royal Society, foi publicado na revista Communications Biology.