SUS tem fila com mais de 1 milhão de cirurgias eletivas paradas no país
O plano de redução de filas em todo o país foi instaurado por meio de uma portaria de 3 de fevereiro deste ano
Mais de 1 milhão de procedimentos cirúrgicos eletivos estão travados na fila do SUS em todo o Brasil, aponta relatório do Ministério da Saúde divulgado na última sexta-feira (2). Os dados foram repassados por todos os estados e pelo Distrito Federal para a pasta por causa de um programa que busca diminuir essa fila.
No total, o ministério pretende repassar cerca de R$ 600 milhões aos governos estaduais e do DF. Segundo as estimativas, esse investimento deve reduzir em cerca de 45% o total dos procedimentos. Por enquanto, a pasta direcionou um terço do orçamento total.
O plano de redução de filas em todo o país foi instaurado por meio de uma portaria de 3 de fevereiro deste ano. O ministério optou por dividir o orçamento total do programa proporcionalmente entre os estados com base na população estimada pelo IGBE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) para 2021.
Para receber o montante, cada estado deveria enviar um plano com o número de cirurgias eletivas identificadas na fila, quantas poderiam ser realizadas com o investimento do governo federal e os hospitais que fariam as operações.
As relações de todos os estados foram divulgadas na última sexta (2), já que alguns estados, como São Paulo, demoraram mais para enviar as informações. Com a atualização de todo o país, o total de cirurgias eletivas no SUS ultrapassou 1 milhão de operações aguardando serem feitas.
O levantamento também possibilitou observar os números em cada estado. Goiás é o que tem a maior fila: são cerca de 125 mil procedimentos travados. Em seguida, aparece São Paulo, com 111 mil, e em terceiro lugar, o Rio Grande do Sul, com 108 mil.
A primeira fase do programa, que será feita durante 2023, é voltada às cirurgias eletivas. No entanto, o plano também envolve consultas especializadas e exames complementares, partes que devem ser priorizadas nas próximas etapas.
Se o projeto correr como o planejado, cerca de 487 mil cirurgias serão feitas, mas ainda sobrarão mais de 595 mil na fila de todo o Brasil.
Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), afirma que a iniciativa é importante. “Desde os últimos tempos, isso é inédito, porque a gente não tinha noção do tamanho dessa fila.”
No entanto, ele chama a atenção para alguns aspectos. O primeiro é de que a medida parece ter um caráter mais paliativo. É importante adotar esse tipo de ação porque são pessoas que precisam de atendimento, “mas essa fila volta se medidas também de médio prazo não forem adotadas”.
O professor explica que um dos problemas que precisa ser melhor abordado é a formação de especialistas: embora o país tenha visto um aumento de cursos de graduação em medicina, isso não se converteu nas especialidades.
Alguns estados poderão ter dificuldade em cumprir a intenção de diminuir a fila mesmo recebendo [recursos]
“Alguns estados poderão ter dificuldade em cumprir a intenção de diminuir a fila mesmo recebendo recurso porque esbarra [no problema da quantidade de especialistas]”, continua.
O Ministério da Saúde afirmou à Folha “o programa é um incremento em relação à produção cirúrgica habitual do SUS”. Por isso, durante o período em que o plano estiver em vigor, o número de cirurgias feitas deve ultrapassar o esperado para o programa, já que as cirurgias feitas normalmente também devem ser realizadas.
O órgão também disse que os R$ 400 milhões –parte do orçamento ainda não enviada aos estados– devem ser encaminhados “mediante a apuração da realização das cirurgias pelos estados e municípios, tendo como prazo inicial de execução o ano de 2023, podendo ser ampliado por mais um ano”. O ministério ainda indicou que irá acompanhar o uso do recurso nos estados em “todas as suas dimensões”.
Catarata
A cirurgia de catarata é a que deve ter o maior contingente de procedimentos realizados. Atualmente, são cerca de 167 mil pacientes em todo o país na espera pelo procedimento, o que representa cerca de 15% de todas as operações travadas. Com o programa de redução, devem ser performadas 88 mil –ou seja, cerca de 52% do total.
Cesar Motta, diretor da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO), afirma que houve um aumento da incidência de pessoas com catarata. “O envelhecimento da população está cada vez maior. Com esse envelhecimento, a incidência de catarata também se torna cada vez maior.”
O problema ocular faz com que o paciente fique com uma visão embaçada. A complicação pode progredir, levando até mesmo a cegueira, que é normalmente reversível. “A gente tem uma queda na qualidade de vida muito grande quando o paciente se mantém com catarata”, diz Motta.
Para ele, isso é um sinal de que, além do investimento em um programa como este que busca a redução de forma mais imediata, é necessário um plano melhor estruturado para tratar a condição no decorrer dos anos.
“Tirou o investimento, ela vai voltar novamente. É uma coisa que tem quer ser contínua, porque o envelhecimento da população é contínuo também”, conclui.
Sobre a catarata, o Ministério da Saúde afirmou que “historicamente é a mais realizada nos programas de cirurgias eletivas organizados” pela pasta. O ministério também indica que o novo programa “pretende produzir um impacto positivo na capacidade de resposta do SUS a essa demanda cirúrgica específica”.