TCU acusa governo de ‘abuso de poder’ e omissão com kit intubação em postos
Abuso de poder, ineficácia e omissão são alguns dos termos utilizados pelo TCU (Tribunal de…
Abuso de poder, ineficácia e omissão são alguns dos termos utilizados pelo TCU (Tribunal de Contas da União) para se referir à atuação do Ministério da Saúde no combate à pandemia de Covid-19 no Brasil. De acordo com relatório do tribunal concluído em abril, o governo alterou documentos para se eximir da responsabilidade de liderar as ações ao ponto de não monitorar o fornecimento de remédios de intubação em postos de saúde.
A análise do relatório do TCU será uma das prioridades da CPI da Covid, instalada no Senado na última terça-feira (13). As primeiras sessões devem convocar os ex-ministros Eduardo Pazuello (Saúde), Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Fernando Azevedo (Defesa).
Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu até a publicação desta reportagem.
Intubação
Segundo o relatório, o TCU se reuniu com o ministério em 19 de março para tratar da falta de medicamentos de IOT (intubação orotraqueal) aos pacientes em estado grave. Os fiscais relatam que o “acompanhamento do órgão baseava-se exclusivamente (…) nos medicamentos utilizados para intubação de pacientes internados em hospitais públicos”.
“Deixando de levar em conta a necessidade de abastecimento de medicamentos para as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades de Pronto Atendimentos (UPA), que também estariam realizando procedimento de intubação em pacientes graves, conforme relatado na própria reunião”, aponta o relatório do TCU.
“Outro ponto que chamou atenção”, dizem os fiscais, “foi o envio linear a todos os estados” de dois medicamentos para intubação, o propofol e atracúrio, “desconsiderando a diferença no número de leitos entre os estados”.
“Os trabalhos de controle e monitoramento do MS [Ministério da Saúde] para os medicamentos de IOT foram ineficazes por falta de controle em tempo real e de sistema apropriado e, principalmente, por desconsiderarem o agravamento da crise, as condições sanitárias do país e as reais necessidades das secretarias de saúde”, destaca o relatório.
Diante das constatações, o tribunal deu prazo de 15 dias para que a pasta elaborasse um “plano estratégico detalhado” para viabilizar “medidas relacionadas à gestão e assistência farmacêutica”.
Abuso de poder
A “ineficácia” do ministério no monitoramento do kit intubação exemplifica o que o TCU classificou de “omissão” e “abuso de poder” por parte da pasta, que, para se eximir de suas responsabilidades, teria aberto mão de assumir a liderança nas ações da pandemia ao delegar essas funções a estados e municípios e não realizar as campanhas publicitárias recomendadas pelo tribunal em relatórios anteriores.
Os fiscais escrevem que os países com melhores resultados no controle da covid-19 “compartilham, ao menos, uma característica em comum: a adoção de medidas planejadas e coordenadas centralmente para o controle da disseminação do vírus, além da preparação do sistema de saúde para cuidar adequadamente das pessoas infectadas”.
As ações da pasta, contudo, “implicaram exclusões de responsabilidades relacionadas ao monitoramento”, diz o relatório, que cita o Decreto 7.616/2011, onde estão “expressas as atribuições do representante do MS designado para coordenar as medidas a serem executadas durante a Emergência em Saúde Pública [Espin]: planejar, organizar, coordenar e controlar”.
“Esse dever é irrenunciável e a omissão configura abuso de poder, levando à consequente responsabilização da Administração e/ou do seu agente”, relatório.
“Havia a expectativa de que o Plano Nacional de Contingência tivesse sido aprimorado (…) por critérios que pudessem fortalecer a atuação do órgão central na liderança e na coordenação nacional da crise”, escrevem. “Porém, ao reverso, a modificação do plano representou a exclusão de competências do Ministério da Saúde relacionadas à coordenação da Espin (…) o que, na visão desta equipe, não deve ser tolerado por esta Corte de Contas.”
Em resposta, o governo afirmou “que o SUS é tripartite e que, por esse motivo, o MS não poderia determinar as ações de comunicação das secretarias estaduais de saúde”.
“Entretanto”, responde o tribunal, “não se trata de determinar ações para as secretarias estaduais de saúde, mas de o MS, como coordenador nacional do SUS, assumir a liderança no processo (…) buscando a adesão das secretarias no discurso baseado em práticas reconhecidas e apoiando estados com menor capacidade de desenvolver campanhas publicitarias”.
“Todavia, verificou-se que o Ministério da Saúde não tem liderado esse processo. Ao reverso, excluiu do Plano de Contingência Nacional a ação que lhe atribuía essa responsabilidade”, destaca o relatório.
Ao afirmar que “as ações verificadas não apresentaram o grau de transparência e rapidez esperada”, o tribunal decidiu em 7 de abril que o Ministério deveria:
- Retomar a realização das coletivas de imprensa diárias;
- Articular com as secretarias estaduais, municipais e distrital de saúde para a realização de campanhas conjuntas.
O Ministério da Saúde reconheceu a necessidade de aprimorar a comunicação na pandemia, mas respondeu ao TCU que a definição de uma periodicidade para as coletivas diárias “poderia não ser conveniente em razão da possível falta de temas” e que “há um custo para a pasta para realizar as coletivas”, como estrutura física.
Diante dos argumentos, a fiscalização sugeriu “coletivas de imprensa com a frequência mínima de três vezes por semana”.