Construtoras investigadas na Operação Lava Jato, da Polícia Federal, por suspeita de desvios e outros crimes na Petrobras agora são alvo de nova investigação em negócios fechados com estatais.
O Tribunal de Contas da União (TCU) está de olho em Sociedades de Propósito Específico (SPE) formadas pelo grupo Eletrobrás em parceria com companhias de engenharia. Apesar da participação estatal nessas sociedades, elas funcionam como empresas privadas. Por isso, o TCU só consegue fiscalizar os gastos realizados pelas empresas públicas nas sociedades, sem ter acesso a informações centrais do negócio.
A investigação dessas SPEs da Eletrobrás é tida como uma prioridade pela corte de contas. Em acórdão no qual estabelece as principais fragilidades da estatal, ainda de 2011, o TCU destaca “a má gestão dos recursos públicos aplicados por meio de Sociedades de Propósito Específico”. No documento, ao qual o Broadcast, serviço de informação em tempo real da Agência Estado teve acesso, o tribunal ressalta ainda “a falta de transparência na gestão de tais recursos”.
“Quanto menos fiscalizado, mais o negócio é passível de irregularidade”, afirmou o ex-ministro do tribunal José Jorge. Ele era o relator das investigações, mas se aposentou em novembro compulsoriamente, após completar 70 anos.
Neste ano, o TCU abriu duas frentes de fiscalização das Sociedades de Propósito Específico da Eletrobrás. Primeiro, determinou à Controladoria-Geral da União (CGU) que, ao analisar as contas do grupo de 2013, avalie com lupa essas empresas. O próprio TCU está realizando uma investigação detalhada dos negócios de Furnas em sociedade com construtoras. Ao todo, a Eletrobrás investiu R$ 9,7 bilhões nos últimos cinco anos em projetos geridos por esse tipo de figura jurídica, segundo o relatório financeiro da empresa de 2013.
Negócios específicos
As SPEs são um modelo de negócio no qual duas ou mais empresas unem recursos e tecnologia em torno de uma nova personalidade jurídica para desenvolver negócios específicos. Essas empresas têm características e obrigações próprias, independentemente dos seus sócios.
Furnas, por exemplo, possui 76 negócios do tipo – de um total de 150 em todo o grupo Eletrobrás – nas áreas de geração e transmissão de energia. A empresa de maior dimensão que tem Furnas como sócia é a SPE Madeira Energia, criada para gerir a hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira, negócio compartilhado com a Odebrecht, investigada na Lava Jato.
Apenas em 2013, o grupo Eletrobrás investiu R$ 3,98 bilhões em projetos geridos em parcerias por SPEs. O dinheiro foi gasto, principalmente, nas hidrelétricas de Jirau (R$ 1 bilhão), Santo Antônio (R$ 700 milhões) e Belo Monte (R$ 900 milhões), na Região Norte do País, e Teles Pires (R$ 400 milhões), em Mato Grosso. Furnas participa de Santo Antônio e Teles Pires.
O acesso às informações foi pedido pelo TCU em outubro ao conselho fiscal da Eletrobrás, segundo uma fonte. A empresa, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que “todas as informações solicitadas pelo órgão de fiscalização estão sendo enviadas, como sempre ocorre quando há solicitações do TCU”.
A constituição de empresas ligadas a projetos específicos foi a solução encontrada pela Eletrobrás para continuar investindo em grandes projetos de infraestrutura em posição minoritária, sem comprometer tanto o seu caixa. O governo utiliza o conhecimento da estatal no setor para atrair investidores privados para os projetos, uma alternativa especialmente favorável neste momento em que as empresas do grupo passam por dificuldades financeiras, com a redução das tarifas de geração e transmissão de energia e retração de receita.
‘Governança’
Em nota oficial, a Eletrobrás afirma que as SPEs são “importantes formas de alavancar investimentos privados em projetos estruturantes” e que elas “obedecem a todas as normas de governança da Eletrobrás e às melhores práticas de mercado”. Com a instituição desse tipo de sociedade, por meio da Lei 11.079, de 2004, foram atraídas para o setor de energia grandes empreiteiras.
Desde então, elas passaram a liderar os investimentos no setor, principalmente na construção de hidrelétricas. Na SPE Norte Energia, formada para administrar a hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, a Queiroz Galvão, a Galvão Engenharia e a OAS integraram o consórcio vencedor para a construção da usina, mas venderam suas participações, em seguida, para as distribuidoras Cemig e Light.
Na SPE Madeira Energia, Furnas investe junto com a Odebrecht e outros sócios, modelo repetido na SPE Teles Pires.
As construtoras citadas são apontadas por réus, delatores e investigados da Lava Jato como recebedoras e pagadoras de propina para serem favorecidas em contratos com a Petrobrás. Elas negam envolvimento em irregularidades e alegam que são vítimas de extorsão. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.