Twitter mantém no ar publicações falsas mesmo após denúncia de conteúdo
Agência Lupa denunciou 198 tuítes falsos; plataforma diz ter tomado medidas naqueles que violavam suas regras
No último dia 17 de janeiro, o Twitter implementou recurso que permite que usuários denunciem conteúdos desinformativos que circulam na plataforma.
Na quinta-feira (20), a Lupa denunciou 198 links de tuítes que continham publicações que foram classificadas como falsas pela agência no mês de janeiro.
Até a manhã da quarta-feira seguinte (26), porém, nenhum dos tuítes havia sido removido ou marcado com um aviso de que conteúdo seria falso ou estaria fora de contexto.
Na terça-feira, a Lupa contatou o Twitter para questionar por que as denúncias não estavam sendo respondidas e forneceu a lista de conteúdos denunciados. Depois disso, 76 tuítes receberam marcações ou foram removidos. Outros 122, porém, continuavam circulando livremente na plataforma.
Em agosto de 2021, a plataforma passou a permitir que usuários denunciassem conteúdos por desinformação —da mesma forma que é permitido denunciar um tuíte que contenha, por exemplo, racismo ou intolerância religiosa.
Inicialmente, o recurso estava disponível somente nos Estados Unidos, Austrália e Coreia do Sul. Em janeiro, usuários da plataforma protestaram contra a exclusão do Brasil. No dia 17, a ferramenta anunciou que implementaria essas denúncias no mercado brasileiro.
Em seu blog oficial, a empresa afirma que utiliza as denúncias para revisar os tuítes denunciados e verificar se existem possíveis violações e também para identificar narrativas e tendências relacionadas a desinformação.
Ao denunciar um tuíte, o usuário é informado de que a plataforma usará a denúncia “para desenvolver novas formas de reduzir informações enganosas” ainda “que não seja tomada nenhuma ação por conta desta denúncia”.
Depois de contatado pela Lupa, o Twitter afirmou que “analisou os conteúdos encaminhados e tomou medidas naqueles que violavam suas regras […] e que não tinham sido revisados anteriormente por sua equipe”.
Eles ainda frisaram que “como informado no anúncio do experimento de denúncia de desinformação, nessa fase de teste podemos não avaliar todas as denúncias e não poderemos responder a cada uma delas.”
Conteúdos enganosos
Na quinta-feira (28), depois de serem contatados pela Lupa, o Twitter marcou 28 dos 198 tuítes denunciados como ‘enganosos’ e impediu que eles pudessem ser respondidos, compartilhados ou curtidos.
As informações que foram marcadas com esta etiqueta variavam desde a falsa afirmação de que a Pfizer teria adicionado um “ingrediente secreto” —a trometamina— à vacina para tratar ataques cardíacos, que o Japão teria declarado que a ivermectina seria mais eficaz que a vacina e que um estudo australiano teria comprovado a eficácia da ivermectina. As três afirmações são falsas.
Ao clicar no link apresentado junto da etiqueta, o usuário é levado a uma compilação de tuítes de sites de checagem de fatos independentes que desmentem a afirmação, além de informações de órgãos de saúde.
De acordo com a política de informações enganosas sobre a Covid-19 do Twitter, conteúdos que promovam tratamentos não aprovados para a Covid-19, que incitem o medo ou que deturpem os ingredientes das vacinas, entre outros, são passíveis de receberem a etiqueta.
Já conteúdos que tragam alegações falsas sobre a Covid-19, como sugerir que a pandemia não existe, que as vacinas são perigosas ou que a imunização faria parte de um plano para dizimar a população, seriam passíveis de remoção do tuíte.
Entretanto, um dos conteúdos denunciados à plataforma é um vídeo que, supostamente, mostra que a vacina contra a Covid-19 estaria causando mal súbito em atletas.
A Lupa verificou esse vídeo e concluiu que a maioria das pessoas mostradas —incluindo o jogador de futebol Christian Eriksen— estavam vacinadas, e os outros casos não tinham nenhuma suspeita de relação com o imunizante.
Mesmo assim, as publicações com a gravação e a falsa legenda continuam disponíveis no Twitter.
Conteúdos fora de contexto
Outros 42 tuítes denunciados pela Lupa à plataforma receberam o selo com o texto “Mantenha-se informado: Está mídia está apresentada fora de contexto”.
De acordo com a política de mídia do Twitter, “não é permitido compartilhar mídia sintética, manipulada ou fora de contexto que possa enganar ou confundir as pessoas e causar danos”.
Os conteúdos que receberam essa etiqueta incluem um suposto vídeo do presidente chileno Gabriel Boric encontrado bêbado no parque, imagens que afirmavam que Lula teria feito um passeio de barco durante a crise de enchentes de Santa Catarina em 2008 e fotografias da abertura das Olímpiadas de Londres que fariam referências a pandemia.
Todas as afirmações são falsas. Assim como nos conteúdos que receberam o selo de ‘enganoso’, o usuário pode clicar no selo ‘fora de contexto’ e ser levado a uma página com uma compilação de tuítes que desmentem a afirmação.
Um dos tuítes marcados como ‘fora de contexto’ mostra um vídeo de um pai chorando a morte do filho.
A legenda falsa diz que a criança teria morrido após receber a vacina contra a Covid-19. Na verdade, a criança foi morta em um bombardeio na Síria. Porém, outro link com o mesmo vídeo e com uma legenda ligeiramente diferente não recebeu nenhuma marcação.
Seis tuítes foram excluídos porque “violaram as regras do Twitter”. Quatro deles eram de usuários que haviam compartilhado vídeos de protestos no Cazaquistão afirmando que eram causados pela rejeição à vacina quando, na verdade, tinha relação com o preço da gasolina.
Conteúdos sobre política
Ao denunciar um tuíte, o usuário pode escolher três opções: “política”, “saúde” ou “outra coisa”. O Twitter possui uma política de informações enganosas sobre a Covid-19 bem estruturada.
Porém, ao falar sobre política ou outros assuntos, a plataforma ainda tem pouca transparência sobre o que será de fato considerado falso e quais serão as ações tomadas em relação aos conteúdos.
Diversas publicações afirmavam que o recém eleito presidente do Chile Gabriel Boric, de esquerda, teria posado com uma fotografia de “jesus travesti”. A informação é falsa.
A fotografia mostra, na verdade, a cantora americana Taylor Swift. Os tuítes denunciados que contém a informação falsa continuam no ar sem nenhuma etiqueta.
Outras publicações falsas envolvendo políticos brasileiros, como uma publicação afirmando que o presidente Jair Bolsonaro (PL) estaria usando as Forças Armadas para fabricar lanchas de transporte escolar, também foram denunciadas e continuam disponíveis sem etiquetas.
No total, 122 dos 198 tuítes denunciados continuam disponíveis sem nenhuma marcação no Twitter.
Entre eles estão as informações falsas afirmando que Bolsonaro teria instalado placas de energia solar sobre o canal de transposição do rio São Francisco, que Drauzio Varella teria escrito um texto ensinando a socorrer crianças em caso de mal súbito e que um desenho animado de 1930 previu a pandemia como uma trama para ditadores assumirem o controle do mundo.