Marielle Franco

Um dia após sugerir PF no caso Marielle, Jungmann elogia polícia do Rio

"Passados 150 dias do crime, entendemos que deveríamos colocar a PF para ajudar ou assumir o caso. Isso não é desqualificar as investigações da divisão de homicídios", afirmou

Um dia após sugerir que a Polícia Federal poderia assumir a investigação do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (Psol), o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, voltou a dizer que isso só poderia ocorrer a pedido da intervenção federal ou do Ministério Público do Estado.

Em agenda na manhã desta segunda-feira (13) no Rio, o ministro evitou fazer críticas ao trabalho da Polícia Civil e também da intervenção federal na segurança, que têm prestado poucos esclarecimentos sobre a morte da vereadora, que completará cinco meses sem solução.

Jungmann chegou a elogiar o trabalho da equipe da divisão de homicídios da Polícia Civil do Rio, que investiga o caso. O ministro se disse compelido a colocar novamente a Polícia Federal à disposição para assumir o caso justamente devido ao tempo decorrido e à repercussão do crime. Segundo Jungmann, a elucidação da morte de Marielle é uma “questão de honra” para o governo de Michel Temer.

Jungmann afirmou que a PF já teria uma equipe com delegados e agentes pronta para assumir o caso. O ministro reafirmou que o caso é complexo e que envolve políticos e agentes públicos do Rio, ainda que não tenha citado nomes.

“Passados 150 dias do crime, entendemos que deveríamos colocar a PF para ajudar ou assumir o caso. Isso não é desqualificar as investigações da divisão de homicídios. A PF é uma excelente polícia investigativa”, disse Jungmann, que participou de reunião sobre financiamento para construção de cadeias com recursos do BNDES, no Rio.

O ministro admitiu também que não tem uma linha direta com as autoridades do estado do Rio envolvidas nas investigações. Ele disse que tudo o que sabe sobre o caso -inclusive as informações que baseiam seus comentários sobre a possibilidade de políticos envolvidos no crime- são oriundas dos setores de inteligência do governo federal.

“A equipe da Civil não me repassa informações sobre o crime, mas temos nossos setores de inteligência, com a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e outros órgãos”, disse.
Há pelo menos duas linhas de investigação que apontam para a suposta participação de políticos no assassinato da vereadora.

A primeira, surgida a partir do relato de uma testemunha, sugere que o vereador Marcello Siciliano (PHS) e o ex-PM e miliciano Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica, seriam os mandantes do assassinato.

Marielle teria contrariado interesses do grupo que atua na zona oeste do Rio ao tentar promover regularização fundiária de imóveis na favela Cidade de Deus. Colegas de partido da vereadora negam que ela estaria atuando em questões do tipo. Já Siciliano e Orlando negam serem mandantes do crime.

A polícia investiga, contudo, se essa testemunha teria sido plantada por alguém interessado em atrapalhar as investigações ou incriminar o vereador. Há em curso uma disputa política entre o grupo de Siciliano e a família dos políticos Chiquinho Brazão, vereador, e seu irmão Domingos Brazão, ex-deputado estadual e ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio, ambos do MDB.

Siciliano, vereador em primeiro mandato, estaria avançando em áreas historicamente dominadas pela família Brazão e há suspeita que a testemunha teria ligado o político ao caso como efeito dessa disputa. Os Brazão negam relação com o caso.

Já uma segunda possibilidade, levantada em uma reportagem da revista Veja na semana passada a partir de relato do deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), apontaria uma suposta participação de três deputados estaduais do MDB do Rio no crime: o presidente afastado da Assembleia Legislativa do Rio, Jorge Picciani, e os deputados Edson Albertassi e Paulo Mello, todos do MDB, presos em novembro passado sob suspeita de integrarem esquema de recebimento de propinas de empresas de ônibus, algo que eles negam. Segundo Freixo, a morte seria uma represália à oposição feita pelo deputado estadual à tentativa do grupo de colocar Albertassi no conselho do Tribunal de Contas do Estado do Rio.

Jungmann negou que a motivação de incluir a PF no caso estivesse ligada ao surgimento entre o rol de suspeitos de políticos com prerrogativa de foro.”Não comento nomes. Sabemos que existem políticos e agentes públicos envolvidos nessa morte. Lá atrás a PGR chegou a sugerir federalizar as investigações”, disse.

Federalização

A ideia de “federalizar” as investigações do crime esbarra em questões jurídicas e na oposição do Ministério Público do Rio.

No dia seguinte ao assassinato, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, sugeriu a federalização das investigações, mas o pedido encontrou resistência no Ministério Público do Rio, que protestou contra o deslocamento de competência no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).

Para “federalizar” um crime de homicídio, é necessário que a PGR (Procuradoria Geral da República) promova uma ação no STJ (Superior Tribunal de Justiça) chamada de incidente de deslocamento de competência. Criado há 14 anos, o instrumento foi usado poucas vezes no país.

Levantamento de 2015 apontou apenas quatro pedidos do tipo pela PGR, com duas rejeições e dois acolhimentos pelo STJ.

Presídios

Jungmann esteve no Rio para lançar programa para a construção de presídios com apoio do BNDES.

O banco irá estruturar projetos de estados que queiram construir cadeias em parceria com a iniciativa privada via PPPs (Parcerias Público Privadas).

A ideia é que os estados paguem a empresas privadas pela construção e operação de novas unidades prisionais.

As prisões entram no programa de “desestatização” do banco, que tem fomentado a celebração de PPPs no setor de infraestrutura, como saneamento e esgoto.

Pelo modelo desenhado, o BNDES desenvolve modelo de contrato que busque o menor custo de construção e operação das cadeias. A ideia é que os projetos tenham economia de escala e que possam ser replicados.

A empresa privada construiria a unidade e faria o que foi chamado de “hotelaria” da cadeia. Ou seja, ficaria responsável pela operação do equipamento e por tudo que envolve a acomodação do preso, como alimentação, educação no cárcere e até trabalho.

A “gestão” do preso continuará sendo feita pelo Estado, que irá manter agentes penitenciários nos locais.

As concessionárias receberão do estado uma quantia pelo serviço prestado. O BNDES não explicou como será a remuneração do agente privado, mas garantiu que haverá contrapartidas sociais que as empresas que forem gerir cadeias precisarão atender.

Para evitar risco de calotes por estados quebrados financeiramente, os contratos serão garantidos com recursos do Funpen (Fundo Penitenciário Nacional). Segundo o BNDES, o primeiro estado que se interessou no modelo foi o Maranhão.