CHINA

Xi Jinping quer China a liderar o mundo até 2049 e promessa assusta mercados; entenda

O presidente da China, Xi Jinping, lançou as bases para governar o país por pelo menos mais…

O presidente da China, Xi Jinping, lançou as bases para governar o país por pelo menos mais uma década e, possivelmente, por toda a vida. A questão agora é o que o líder chinês fará com todo esse poder.

Por um lado, Xi deixou claro para onde quer levar a China. Na abertura do congresso do Partido Comunista na semana passada, repetiu a meta de tornar a China uma potência socialista moderna até 2035, prevendo um aumento do PIB per capita até o padrão de países de renda média e a modernização das Forças Armadas.

Então, até 2049, no 100º aniversário da República Popular da China, o presidente chinês quer que a nação “lidere o mundo em termos de força nacional e influência internacional”.

Como Xi pretende atingir este objetivo é que deixou os investidores assustados. As Bolsas chinesas tiveram fortes quedas no início da semana depois que foi conhecido a nova composição do Politburo, o seleto grupo de políticos que comandam o Partido Comunista da China (PCC).

Ao garantir para si próprio um inédito terceiro mandato, Xi se cercou de aliados, com destaque para Li Qiang, antigo chefe do PCC em Xangai que vai assumir como premier apesar de nunca ter tido uma experiência no governo central.

Xi também sinalizou uma mudança de prioridades, do foco anterior no desenvolvimento econômico para uma maior atenção às questões de segurança, o que deixou investidores ansiosos sobre como o líder chinês, agora com poder quase irrestrito, conduzirá o país.

– Ele quer deixar um legado na História com essa meta para 2049 – afirmou Charles Parton, ex-diplomata britânico e membro do Conselho de Geoestratégia e do Royal United Services Institute: – Se você traduzir essa meta a partir da linguagem adotada pelo partido, significa se tornar o líder, derrubar os EUA do seu pódio e ordenar o mundo para que se adapte melhor aos interesses e valores da China.

Mas o roteiro de Xi está repleto de contradições: impulsionar o crescimento econômico enquanto decreta lockdowns em cidades sob a política de Covid Zero; garantir a autossuficiência tecnológica enquanto seu cerco regulatório levou a perdas de US$ 1,5 trilhão nas empresas do setor; se abrir mais para o mundo enquanto restringe a liberdade de expressão e limita os fluxos de investimentos para o país.

E, talvez a maior de todas as contradições, alcançar essa grande visão e ao mesmo tempo arriscar entrar numa rota de conflito catastrófica com Taiwan para completar uma “missão histórica” e “uma exigência natural para alcançar o rejuvenescimento da nação chinesa”.

– Ele está de olho em ter uma posição de destaque nos livros de História. Muitas coisas, incluindo a questão de Taiwan, fazem parte da narrativa que poderá ser usada para justificar seus esforços extraordinários em assumir este terceiro mandato e, quem sabe, até um quarto mandato. Se você quer violar uma regra, precisa de um motivo – disse Liu Dongshu, professor assistente da Universidade da Cidade de Hong Kong, em referência à regra implícita até então vigente de que os presidentes chineses ficariam no cargo por no máximo dois mandatos.

Dongshu acrescentou:

– No passado, se algo estivesse em contradição com desenvolvimento econômico, muitas pessoas sabiam que a China não levaria isso adiante. Mas, agora, parece que a China está disposta a sacrificar o desenvolvimento econômico e a confiança do mercado em um nível muito mais amplo.

Mais poder para o Partido Comunista da China

Quando Xi assumiu o poder em 2012, havia esperanças de que ele seguiria seu pai reformista, Xi Zhongxun, na tentativa de liberalizar a China no mercado doméstico e se abrir ainda mais para o resto do mundo.

Pouco depois de assumir o cargo, Xi foi para Shenzhen em uma viagem que parecia ecoar a ida ao sul de 1992 do ex-líder Deng Xiaoping, cuja política de “reforma e abertura” deu início ao milagre econômico da China.

Em vez disso, Xi acabou aumentando o papel do partido na administração da economia e centralizando o controle para se tornar o líder mais poderoso da China desde Mao Tsé-Tung. Ele encerrou a era da China de se esconder no cenário mundial, esmagou a dissidência de Xinjiang a Hong Kong e erodiu quatro décadas de compartilhamento de poder nos níveis mais altos do Partido Comunista.

Xi adotou um tom desafiador em seu discurso de abertura do congresso do Partido Comunista neste mês, dizendo que a China não mudaria de rumo, mesmo que enfrente “tempestades perigosas” em um mundo mais hostil.

Pelo contrário, ofereceu vigorosamente o modelo da China como uma alternativa aos EUA e aliados, em essência, ao prometer suprimir os esforços do governo do presidente americano Joe Biden para frear o desenvolvimento do país, privando o mercado chinês de chips e de outras tecnologias avançadas.

– A modernização chinesa oferece à humanidade uma nova opção para alcançar a modernização – reforçou Xi.

Investidores cautelosos

Por enquanto, investidores não estão confiantes de que possa fazer isso. Depois que Xi apresentou o novo Comitê Permanente do Politburo, a Bolsa de Hong Kong teve, na segunda-feira, seu pior dia desde a crise financeira global de 2008 e o yuan atingiu a mínima em 14 anos. Desde então, os ânimos do mercado esfriaram um pouco, a medida que autoridades chinesas tentaram tranquilizar os investidores.

O congresso do partido acabou com as esperanças entre os investidores de que Xi estivesse transformando a China em “um modelo híbrido de capitalismo contido e uma filosofia comunista reformista”, disse Gary Dugan, diretor executivo do Global CIO Office.

– Os eventos da semana passada apenas reforçam o medo de que Xi esteja levando a política chinesa de volta ao comunismo. Sua visão de abertura não se alinha com a do Ocidente – acrescentou Dugan.

Os otimistas veem a consolidação do poder de Xi ajudando a suavizar a implementação de políticas. Em sua equipe, Li como primeiro-ministro é conhecido por ter apoiado empresas como Alibaba e Tesla ao liderar Zhejiang e Xangai.

Ao mesmo tempo, no entanto, Li também supervisionou o lockdown de dois meses para os 25 milhões de habitantes de Xangai no início deste ano. E a China ainda não tem um caminho claro para sair da política de Covid Zero, que prejudicou ainda mais uma economia já castigada por uma crise no setor imobiliário e um confronto tecnológico com o Ocidente.

– A segurança nacional provavelmente será a principal prioridade da China, dado o ambiente internacional instável – disse Vivian Zhan, professora associada de política chinesa na Universidade Chinesa de Hong Kong.

A única coisa com que Xi não precisa se preocupar é com a estabilidade política, já que ainda não há ninguém nas principais posições de liderança da China que possa ficar em seu caminho. Mas isso não significa que seu trabalho será mais fácil: os maiores problemas em torno da Covid, propriedade, chips, Taiwan e uma batalha ideológica com os EUA não têm soluções fáceis.

– Há uma contradição entre o quão autoconfiante a liderança parece ser, por um lado, e o quão ansiosa ela parece estar com as preocupações de segurança, por outro – disse Jean-Pierre Cabestan, professor emérito de ciência política da Universidade Batista de Hong Kong.

– Os próximos cinco anos serão mais difíceis para Xi Jinping do que os últimos cinco anos – completou.