A arte do movimento: dança como fator de transformação da sociedade
Celebra-se nesta segunda-feira (29) o Dia Internacional da Dança, data que foi instituída pelo Comitê…
Celebra-se nesta segunda-feira (29) o Dia Internacional da Dança, data que foi instituída pelo Comitê Internacional da Dança da Unesco, em 1982. Apesar desse marco figurar no calendário artístico por 37 anos, muitas pessoas ainda desconhecem a sua existência. Nesta série de duas reportagens, o Mais Goiás irá mostrar a interpretação de artistas e profissionais da área sobre o contexto atual da dança e sua conexão com o público. Alguns, por exemplo, consideram a modalidade uma forma de transformação da sociedade, uma vez que, com a expressão corpórea, é possível transmitir, sem palavras, mensagens a quem acompanha os espetáculos.
Uma dessas profissionais é Joisy Amorim, de 38 anos. Formada em Educação Física pela Universidade Estadual de Goiás (UEG), a bailarina teve seu primeiro contato com a dança aos nove anos de idade, após se render as insistências de familiares. Desde então, nunca mais parou. Ela lembra que, com 19 anos, começou a fazer cursos de férias em São Paulo (SP) para se capacitar com o intuito de dar aulas.
“Eu tinha contato com ‘n’ professores, pois, como era um curso de férias, vinha muita gente da dança contemporânea, muita gente diferente do balé. Era um lugar que ficava 15 dias e conseguia entrar em contato com muita gente”, relembra.
Joisy lembra que conciliava as aulas que ministrava com as apresentações em competições pelo antigo grupo Energia. Por acreditar que a dança poderia falar muito mais do que uma apresentação de cinco minutos de coreografia, a até então professora decidiu criar a própria companhia de dança. Nascia em 2012 a Giro 8, um grupo independente em que a bailaria pôde mostrar seu lado de coreógrafa.
“Eu acredito que [a dança] é uma arte com poder muito grande de modificação. A dança é uma linguagem. A missão da Giro 8 é da gente conseguir levar mensagens que sejam ditas através dessa linguagem poderosa”, conta.
Atualmente, a companhia conta com quinze funcionários, entre bailarinos, iluminação, figurinista, músico e outros. Com sete anos de existência, a companhia já se apresentou por diversas cidades brasileiras e em dois países da Europa: Portugal e Espanha. Neste último, por duas vezes, onde, em uma das ocasiões, foi realizada uma turnê que passou por várias cidades espanholas. No portfólio, a companhia já conta com quatro espetáculos: Retrato em Preto e Branco, Entre o Eu e o Mundo, Sr. Will e Antes Que.
Desafios
Joisy conta que o cenário da dança atualmente é preocupante, tanto pela sociedade em si quanto pela falta de incentivos à cultura em geral. Ela destaca que no processo coreográfico dos espetáculos é levado em consideração o atual momento que a sociedade vivencia.
“Estamos em uma sociedade difícil, preconceituosa, num momento de muito embate, de muita polarização, ou é oito ou oitenta. As pessoas estão perdendo o que é ser humano e eu acredito que a dança seja capaz de ressignificar isso. Então, quando eu vou fazer um espetáculo, penso em algumas mensagens que, se um ou duas pessoas forem atingidas com o que a gente quer dizer, é de grande valia para mim. Porque as pessoas estão ali para consumir esses espetáculos, então é o momento dar gente dar umas cutucadas”, afirma.
Outro obstáculo é informalidade. De acordo com Joisy, dança ainda não é vista como profissão, paradigma que para ela precisa ser deixado no passado. “A dança precisa ser vista como uma profissão e ser respeitada como qualquer outra. Ela não pode ser bico”, destaca.
Ela explica que a companhia sobrevive da venda dos próprios espetáculos e que os seis bailarinos presentes vieram de outros estados e recebem uma forma de “bolsa auxílio”. Para isso, Joisy conta que também trabalha dando aulas em uma escola pública e em uma academia.
“A maioria dos profissionais que vivem só da dança estão tendo muitas dificuldades financeiras mesmo. Por mais que a gente consiga financiamento público para algum espetáculo, a participação privado direto para a praticamente inexiste. Por isso ela necessita de aporte público para se manter. A dança não consegue se vender como o cinema, por exemplo “, conta.
Gerações Futuras
Formada em Dança Contemporânea pela Escola Bolshoi, em Brasília, Isabel Mamede, de 24 anos, está há quatro anos na Giro 8. Após ingressar na companhia por meio de audição, ela viu uma oportunidade para dar início em sua carreira profissional. Ela conta que teve pouco contato da cultura brasiliense e que, após sair da cidade, com 16 anos, foi para Santa Catarina, onde ela aponta um melhor cenário sobrevivência do que em Goiás.
Isabel também afirma que o aspecto financeiro é algo que trava o desenvolvimento da dança para a sociedade goiana. “[Produção] no teatro é bom, música também tem muita produção. Mas eu vejo que, em relação a dança, o cenário é bem pequeno e percebo que tem poucos incentivos financeiros para a gente poder se manter e, por isso, muitos grupos estão fechando, principalmente, nesses últimos dois anos”, revela.
Apesar das dificuldades, Isabel celebra suas conquistas. Para ela, o espetáculo mais marcante que apresentou foi o Sr. Will pelo fato de poder representar uma bailaria intérprete. “Eu estava participando dessa composição coreográfica e, no sentido de trazer elementos da dança contemporânea para este cenário é que a gente muda como profissional para tornar o contexto do espetáculo mais atual. O bailarino está sempre se adaptando e encontrando novos lugares dentro dessa perspectiva de quotidiano”, afirma.
Pra mim, dança é…
Ambas as entrevistadas são diretas em dizer que, apesar dos pesares, a dança foi a profissão que elas escolheram e chegam a caracterizá-las como vida. “A dança é o que eu mais gosto de fazer e com o que eu quero viver. É onde eu quero estudar, pesquisar e me aprofundar sempre e assim que eu espero chegar até o final da minha vida”, conta Isabel.
Joisy conta que se sentiu realizada quando conseguiu apresentar espetáculos em periferias da cidade, para pessoas que não tinham acesso a essa cultura. Esse momento foi crucial para que ela tivesse mais certeza de que foi “escolhida pela dança”. “Eu escolhi viver da dança e a dança me escolheu também, pois eu não sei se conseguiria fazer outra coisa. Eu conto que todo o trabalho é muito árduo. Algumas pessoas pensam que é drama, mas não é. É muito trabalho, mas não só meu. Eu queria pessoas interessantes para agregar no pilar central que é a Giro 8 e eu consegui”, finaliza.