Artistas de circo retomam atividades em meio a futuro incerto
Sem auxílio cultural e em meio a decretos de fechamento das atividades, circos sofrem com o impacto financeiro causado pela pandemia
Fechados desde março de 2020 por causa da pandemia da Covid-19, os circos de Goiânia, sejam eles grandes ou pequenos, agora tentam reerguer suas lonas. Há cerca de duas semanas, alguns já retomaram as atividades e se reinventam para enfrentar um futuro incerto, em meio a decretos e normas de proteção contra o vírus e sem auxílio cultural. Os bastidores e preparação para a retomada foram registrados pelas lentes das câmeras do fotográfo do Mais Goiás, Jucimar de Sousa.
O Circo Khronos é um deles. O “caçula” dos espetáculos foi criado há apenas oito anos, mas conta com artistas que vieram de outros circos. Lucas Rangel, 23 anos, que divide as funções de gerente de marketing e mágico do local, conta que o momento atual é difícil, mas que a esperança de colocar novamente o sorriso no rosto das famílias é maior.
“Não tivemos nenhum auxílio cultural nesse período. Todos aqui dependemos somente da bilheteria, então quando tudo parou, precisamos nos virar”, explica. Segundo ele, atualmente 25 pessoas trabalham no Khronos, que já visitou cidades como Uberaba (MG), Cuiabá (MT) e Aparecida de Goiânia (GO).
“Alguns artistas foram para a rua vender algodão doce, maçã do amor e brinquedos. Tentamos nos virar como foi possível. Agora estamos voltando gradativamente, mesmo com todas as dificuldades”, acrescenta.
Nas palavras do mágico, o espetáculo não pode parar. E ele torce para que, realmente, não “pare” novamente.
“Levantamos a lona, só que infelizmente ainda é algo muito incerto. Não sabemos como vai ser o dia de amanhã, pois o que temos visto é decreto atrás de decreto. Estamos trabalhando agora, mas podemos fechar semana que vem”, continua Lucas, que afirma que o “respeitável público” está carente de entretenimento.
Dificuldade de sustento
Um mapeamento publicado pela Fundação Nacional de Artes (Funarte) em 2020 listou 651 circos no Brasil responsáveis por garantir sustento para cerca de 9.579 pessoas. Por causa da pandemia, o cenário mudou. Em uma entrevista à Rádio CBN, a presidente Rede de Apoio ao Circo, Sula Mavrudis, afirmou que muitos estabelecimentos precisaram fechar as portas e milhares de artistas em todo país ficaram sem renda.
Rosa Maria da Costa, 68 anos, atualmente trabalha na lanchonete do Khronos. Há 54 anos vivendo “das alegrias do circo”, ela afirma que não se lembra de outro momento tão complicado para os artistas quanto nos meses que tiveram de fechar as portas em razão da Covid-19.
“É triste não poder trabalhar. Passamos por dias difíceis, mas o pessoal aqui é muito batalhador e vai à luta. Agora estou numa alegria imensa de poder retomar, mostrar nossa arte, ver as crianças sorrindo”, diz ela, que durante toda a trajetória no circo, também já foi trapezista, acrobata, equilibrista e cantora.
Impacto financeiro
O setor cultural foi um dos primeiros a sentir o impacto da pandemia. Lugares que antes eram sinônimo de alegria, como cinemas, teatros, casas de shows, circos e outros locais voltados para a arte, ficaram impossibilitados de reunirem público.
Mesmo diante desse fechamento, dona Rosa nunca perdeu a esperança de logo voltar a ver o circo cheio, além de escutar as risadas e palmas do público.
“Mesmo com o pouco que ganhamos, esse é nosso ganha pão, a gente tira o sustento do nosso suor. Trabalhamos nossos espetáculos para levar um pouco de diversão para as pessoas, ainda mais nesses tempos tão difíceis. É um alegria ver o circo armado”, afirma.
De pai para filho
Como em boa parte do mundo, o circo no Brasil tem uma dimensão familiar. Ofícios como os de palhaço ou acrobata, são passados de pai para filho, mantendo a tradição sempre viva. Assim, o espetáculo atravessa as gerações, atingindo de idosos a crianças.
E por falar em criança, Leonardo Jorge Sousa Santiago, de apenas 9 anos, é o malabarista mais jovem do Brasil. Com o nome artístico ‘Leo Gamer’, o artista mirim se apresenta no Circo Khronos desde os quatro anos de idade. O pequeno tem orgulho de falar que aprendeu tudo com o pai, o também artista circense, Gerald Santiago.
“Levei uns três anos para aprender o malabares, porque é uma das artes mais difíceis do circo”, explica Leo, que além de malabarista é o palhaço ‘Bisnaguinha’.
“Um dia, quando minha mãe foi se apresentar, o boneco dela sumiu. Eu estava no berço, tinha só quatro meses, então ela me pegou para fazer o papel do boneco. Assim começou a minha história no circo”, conta o pequeno.
Para ele, a vida no circo é motivo de muita alegria. “Gosto muito de viajar e conhecer novas cidades, novos coleguinhas”, explica o jovem, que estuda pela manhã, treina cerca de uma hora durante a tarde e depois tira um tempo para brincar.
“O que eu mais gosto é de jogar video game, fazer vídeos para o meu canal no Youtube e brincar com os meus amigos”, conclui Leo Gamer.