ACESSO AO TRATAMENTO

Associações em Goiás relatam dificuldade de acesso a tratamentos com cannabis

Importação do frasco de óleo pode custar mais de R$ 2,8 mil

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O óleo extraído da cannabis conquista espaço cada vez maior no tratamento de pessoas acometidas por autismo, alzheimer, epilepsia, fibromialgia, entre outras doenças. Porém, associações do meio ouvidas pelo Mais Goiás afirmam que pacientes com receita para uso da cannabis enfrentam dificuldade de acesso ao medicamento, principalmente pelo alto preço com que é vendido o óleo

O frasco de um remédio à base de cannabis pode variar conforme a quantidade e manipulação do composto. O preço alto se deve à logística de importação, e pode chegar a quase R$3 mil por frasco.

O diretor presidente da Associação Goiana de Apoio e Pesquisa à Cannabis Medicinal (Agape), Yuri Tejota, explica que o preço alto é o fator de dificuldade para se adquirir o medicamento. “Se procurar hoje em farmácias, vai ver esses remédios que estão disponíveis, embora sejam limitados. Temos um remédio com alto teor de CBD e que vem de fora do país – por não existir produção nacional – com um preço que pode variar entre R$ 2.500 a R$ 2.800. É, portanto, difícil avançar nessa via de tratamento, porque o acesso do paciente à cannabis é complicado”, afirma.

Vias de acesso para cannabis medicinal

O presidente na Associação Curando Ivo, Filipe Suzin, confirma a informação de Yuri. “Depende muito da capacidade financeira de cada um, já que os valores dos frascos variam e depende da via de acesso. O importado é caríssimo e via farmácia convencional, que já tem alguns produtos circulando – mas são apenas componentes isolados –, existe um custo elevado com uma média de R$ 2.500 o frasco”, explica.

Filipe afirma que o custo cai se o paciente compra o óleo por intermédio de associações especializadas. “Temos associações que trabalham óleo na faixa de R$ 400 a R$ 500; outras possibilitam um valor um pouco mais baixo, na faixa de R$200”. Mas ele pondera que o alto custo não é o único para famílias interessadas em recorrer ao tratamento com cannabis. “Há também a dificuldade de se conseguir prescrição, o que depende da conduta e do conhecimento do médico”, diz.

Tratamento e dificuldades de acesso das famílias

O tratamento com a cannabis medicinal é realizado com o extrato completo da planta. Ou seja: o óleo com o tetra-hidrocanabinol (THC) e demais substâncias presentes na maconha. Isso quer dizer que são produzidos a partir de planta inteira, com toda a química presente. É um óleo que possui efeito psicotrópico; mas, segundo pesquisas, ajuda no tratamento das doenças neurológicas, em sua maioria.

A publicitária, Rochelle Alves é coordenadora administrativa da Associação de Famílias com Crianças com Microcefalia por Zika e Microcefalia por outras patologias em Goiás (Amiz) e mãe de Hickelly Mariáh de 5 anos, diagnosticada com a Síndrome congênita do Zika vírus em lactentes (SCZV). Ela diz que luta que enfrenta para que a filha possa ter acesso ao óleo a base de cannabis.

“Por conta dessa síndrome, ela teve uma série de complicações que foram descobertas após o nascimento dela. Entre elas a epilepsia. A gente fez acompanhamento com neurologista, e as crises não diminuíam mesmo quando mudava a medicação. Foi quando comecei estudar quais possibilidades a gente tinha e o que poderia ser feito. E descobri a cannabis”, conta.

“Tem uma série de empecilhos, não são todos os médicos que prescrevem. Como não produz aqui [no Brasil], o custo para importar é muito alto. Com indicação médica começamos usar um óleo nacional, no começo foi bom, mas depois parece que não estava dando tanto efeito e o médico passou um óleo importado, só que pelo custo ser alto ficou inacessível para mim. Entramos na Justiça para conseguir por meio do Estado, e tive parecer favorável dois anos depois”, completou Rochelle.

A coordenadora administrativa da Amiz, que atende aproximadamente 140 famílias, avalia que a dificuldade maior hoje é o acesso em ter um médico que prescreva juntamente com o preço, por ser alto.

“Cada seringa do óleo com 10ml custava entorno de R$1.200 e eu não tenho condição de comprar esse óleo. Como não conseguimos por ser um valor muito alto, as mães geralmente fazem rifa e pedem ajuda a familiares para a criança não ficar sem o remédio. A dificuldade maior hoje é o acesso em ter um médico que prescreva e pelo preço ser alto”, relatou.

Alternativas para reduzir o alto preço

A Câmara Municipal de Goiânia e a Assembleia Legislativa do Estado de Goiás aprovaram duas leis em relação à utilização de medicamentos à base da maconha. Entretanto, o acesso prático a essas terapias ainda é distante.

As duas leis, uma de autoria do vereador Lucas Kitão (PSL) e outra de Diego Sorgatto (DEM), atribuem ao poder público a obrigação de fornecer medicamentos à base da cannabis, além de distribuir gratuitamente medicamentos prescritos à base da planta nas unidades de saúde conveniadas ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Yuri Tejota, da Agape, afirma que seria necessário lutar pelo cultivo nacional. “Temos que produzir isso no Brasil, dominar essa ciência aqui. O Brasil não insere a cannabis na sua cadeia produtiva e isso nos deixa a mercê de preços, valores caríssimos por algo que poderia estar fazendo aqui no nosso país. Para baratear isso, primeiro temos que nacionalizar essa produção, temos que ter esse acesso”, aponta.

Filipe Suzin, da Associação Curando Ivo, acredita que é preciso apoio do poder público em conjunto com as associações. “A possibilidade que eu vejo é justamente conseguir unir o poder público com a frente das associações. O objetivo é promover o acesso para que tenhamos uma produção a baixo custo coerente com o que é a demanda. É o apoio do município para as associações poderem se estruturar e fazer esse fornecimento para o próprio município não ser tão onerado como seria em um pedido de importação”, avaliou.

Embora a aprovação de leis em nível municipal e estadual aponte avanço é preciso ainda o debate do tema em nível federal. “Enquanto no Brasil não tiver regulamentação para cultivo para fins medicinais o medicamento vai seguir com um alto custo. Esse projeto [de regulamentação] está na Câmara dos Deputados, mas ainda não foi votado”, avalia o vereador Lucas Kitão.

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