Coronavírus

Bares reabrem lotados no RJ; clientes descumprem regras de distanciamento

No Leblon, Guarda Municipal determinou que bares fechassem as portas para tentar dispersar cerca de 300 pessoas que insistiam em beber sem máscara na calçada

Na Praça Cazuza, no Leblon, Guarda Municipal determinou que bares fechassem as portas para tentar dispersar cerca de 300 pessoas que insistiam em beber sem máscara na calçada

A primeira noite da reabertura do setor gastronômico da cidade mostrou que a retomada será um desafio para empresários, clientes e poder público. Os bares começaram a ver a boemia de volta depois das 22h, quando alguns pontos tradicionais, como o Pavão Azul, em Copacabana, e o Guimas, na Gávea, ficaram lotados. Na Praça Cazuza, no Leblon, a Guarda Municipal precisou intervir: determinou que bares do entorno fechassem suas portas para tentar dispersar cerca de 300 pessoas que, aglomeradas, bebiam sem máscara e descumpriam as regras de isolamento social na calçada.

Com bares fechados, uma banca de jornal e ambulantes continuaram vendendo bebidas alcóolicas na praça, o que contribui para a permanência das pessoas. A Polícia Militar foi acionada. A aglomeração permaneceu até por volta da meia-noite. Pela regra de reabertura, o horário de funcionamento de bares e restaurantes é até 23h.

Mais cedo, dentro dos bares, segundo a Guarda Municipal, o distanciamento entre os clientes e a regras de segurança foram mantidas. Mas uma das dificuldades para os estabelecimentos é que os clientes precisam usar máscaras enquanto não estiverem consumindo. Ou seja, a cada gole de chope, é preciso retirar a proteção. Depois, recolocá-la para então retirá-la de novo.

Pavão Azul, em Copacabana, teve muito movimento e nenhuma fiscalização Foto: Foto do leitor
Pavão Azul, em Copacabana, teve muito movimento e nenhuma fiscalização Foto: Foto do leitor

As imagens de bares e calçadas lotados no Leblon, na Zona Sul do Rio, repercutem nas redes sociais e são alvo de críticas de internautas que defendem o distanciamento social, em um momento em que a taxa de contágio ainda é alta no Estado. Alguns posts irônicos também surgiram no Twitter como reação à alta procura por bares diante do contexto atual.

Em outro vídeo postado na noite desta quinta-feira no Twitter, é possível escutar um homem dizendo: “Tudo voltando ao normal, graças a Deus”.

A bartender Carolina Gutierrez, que estava bebendo sem a máscara na calçada do Bracarense, se disse confusa sobre a orientação:

— A minha está aqui guardada na bolsa. Não acho possível todo mundo ficar no bar colocando e tirando toda a hora a máscara com a mão suja. Prefiro ficar aqui, afastada e conversando à distância com os amigos, do que contaminar a máscara — conta.

— Os garçons estão usando proteção e há distanciamento nas mesas. É preciso que o lugar faça também a higiene dos copos e dos talheres, para diminuir a transmissão — avalia Carolina.

Entre os inúmeros bares por onde a reportagem passou nas zonas Sul e Norte na noite desta quinta, apenas dona Ester, de 63 anos, estava seguindo todas as recomendações da prefeitura. Sentada sozinha no Buxixo, na Tijuca, entre um gole e outro, a professora de educação física aposentada era a única a colocar a máscara de proteção, que leva as cores e o emblema da Mangueira:

— É para a minha própria proteção né?! Sou frequentadora há anos e estava com muita saudade dos garçons, de bater um papo e tomar um chope. Essa é a terceira vez que eu saio de casa desde março — contou.

Ester Lima foi a seu bar favorito no primeiro dia da retomada do setor na cidade do Rio Foto: Alexandre Cassiano / Agência O Globo
Ester Lima foi a seu bar favorito no primeiro dia da retomada do setor na cidade do Rio Foto: Alexandre Cassiano / Agência O Globo

O começo da noite chegou a assustar alguns donos e funcionários de bares da cidade. Antonio Marques, gerente do Buxixo, esperava um movimento maior no primeiro dia, mas acredita que o final de semana será mais movimentado. Além de só atender os clientes na área externa, o bar conta também com cardápio digital:

— Pelo que a gente via nas redes, achava que o movimento seria melhor. Mas está todo mundo com certo receio e o tempo não ajudou nesse primeiro dia — avalia.

Especialista se diz preocupada com flexibilização

Especialista em saúde pública e professora da UFRJ, a médica Lígia Bahia tem reservas sobre a flexibilização das regras nesse momento para bares e restaurantes. Ela observa que a iniciativa de flexibilizar o uso das calçadas para evitar aglomerações no interior dos estabelecimentos foi adotada em outras grandes cidades, como Paris. Mas que a realidade era muito diferente da que o Rio enfrenta hoje.  Ela diz que o momento é de cautela e recomenda que os frequentadores de bares e restaurantes mantenham o isolamento social.

— Se é para comer e beber, o melhor é ainda fazer isso em casa por algum tempo. A taxa de transmissão do Covid-19 ainda está alta. A questão é que a logística não se limita a acomodar os clientes, que geralmente são de classe média. A operação de um estabelecimento desses  exige uma mobilização de um grande número de profissionais. Geralmente, eles usam transporte público, o que aumenta as chances de contaminação — disse a sanitarista.

Outra dificuldade é a característica das calçadas de alguns bairros. Para liberar mesas e cadeiras, o decreto do prefeito Marcelo Crivella prevê que mesas e cadeiras só podem ser instaladas se a calçada tiver uma largura mínima de 3 metros, o que nem sempre é possível encontrar em algumas ruas de Botafogo e Copacabana, por exemplo, porque as calçadas são estreitas. Além disso, deve ser mantida uma passagem de pelo menos 2 metros de largura para a circulação de pedestres. Nesta quinta-feira, a secretaria municipal de Fazenda regulamentou a concessão dos alvarás. Os comerciantes poderão tirar as licenças , válidas até o fim do ano, preenchendo formulários de autodeclaração, no qual se comprometem a cumprir as exigências.

—  O Baixo Voluntários (bares da Rua Voluntários da Pátria) vão ter muitas dificuldades para cumprir as exigências, pois os recuos dos estabelecimentos são reduzidos. Na prática, deve dar só uma mesa. A realidade é que a prática é que vai determinar como isso será cumprido. Nós entendemos que tem que haver alguma flexibilização nesse momento, pois os comerciantes têm que pagar as contas. Mas é preciso que a prefeitura fiscalize e coiba irregularidades — disse a presidente da Associação de Moradores de Botafogo, Regina Chiaradia.

Fiscalização será o grande desafio

O presidente da Sociedade de Amigos de Copacabana (Sac), Horácio Magalhães, critica o fato de a prefeitura ter deixado para esta quinta a edição da regulamentação. O decreto de Crivella é da semana passada. Ele observa que em algumas ruas internas do bairro, com a Ayres Saldanha, há limitação de espaço nas calçadas para atender as regras. A exemplo de Regina, ele cobra fiscalização pela prefeitura:

— Geralmente, os fiscais do município só trabalham durante o dia. É preciso que a Guarda Municipal atue nesse processo, pois trabalham 24 horas. Não adianta ligarmos para o 1746 fazendo uma reclamação que um estabelecimento permanece aberto durante a madrugada e dizerem que vão agendar uma vistoria. É preciso conciliar a atividade econômica com as necessidades dos moradores. Muitos, mesmo com a abertura dos bares, vão permanecer confinados — disse Horácio.