Segurança

Césio 137: “Lições de Goiânia foram aprendidas pelo mundo”, diz especialista da Cnen

Chefe da divisão de rejeitos da Comissão Nacional de Energia Nuclear explica que controle se tornou muito mais rígido depois do incidente

Em 13 de setembro de 1987, portanto há exatos 30 anos, tinha início em Goiânia o incidente mundialmente famoso do Césio 137. O caso resultou na morte de quatro pessoas, segundo registros oficiais, e pelo menos 1,6 mil pessoas teriam sido afetadas pela exposição direta ao material, pelos cálculos da Associação de Vítimas do Césio 137.

O chefe da divisão de rejeitos da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), Walter Mendes Ferreira, que estava em Goiânia naquela época e identificou o acidente, explica que o ocorrido provocou mudanças profundas nas políticas de manejo e descarte de materiais radioativos. “O acidente em Goiânia mudou a concepção com relação a toda a parte de segurança. Rejeitos, proteção ambiental, a parte regulatória: tudo foi alterado”, afirma.

Segundo ele, logo após a repercussão do acidente em Goiânia, foi feito um pente fino em todo o Brasil para analisar a situação dos equipamentos que utilizavam materiais radiológicos. “Foi apurada a condição de armazenamento das fontes, e aquelas antigas, que estavam inseguras, foram recolhidas no País inteirinho”, destaca.

A segunda providência adotada foi o aprimoramento no controle das fontes radioativas. Conforme Walter, se antes já havia uma fiscalização rigorosa sobre o uso desses materiais, o sistema regulatório se tornou ainda mais rígido. Em seu entendimento, Goiânia serviu de lição para diversos países, que também adotaram medidas mais rigorosas. “O sistema de controle da segurança radiológica adotado hoje é equivalente aos padrões internacionais”, comenta o físico.

Ele explica que, atualmente, quando alguma entidade demonstra interesse em adquirir uma fonte radiológica – o que geralmente ocorre para fins industriais ou de pesquisa –, a Cnen é acionada automaticamente por um sistema online. Posteriormente, o potencial usuário passa por um rígido processo de verificação, que avalia o uso que será feito do material e se a instalação segue os critérios técnico-normativos estabelecidos.

Riscos

Conforme o especialista, o grande problema que ocasionou o incidente em 1987 foi o descuido dos responsáveis pelo material. “A fonte era cadastrada na Cnen, tinha proteção e os médicos sabiam da sua existência”, diz Walter. “A questão é que o instituto tinha duas fontes: uma de césio e outra de cobalto. Eles retiraram a fonte de cobalto e encaminharam para uma nova clínica, e deixaram a de césio para trás”, destacou.

O físico esclarece que, atualmente, quase não há fontes de césio utilizadas na medicina. A funcionalidade que o material tinha antigamente hoje cabe aos aceleradores lineares, que geram radiação por meio de ondas eletromagnéticas. “Neles não existe uma fonte de radiação. Seu funcionamento é semelhante ao de um aparelho de raio-x: ao ser desligado, cessa a radiação”, explica Walter.

Apesar disso, materiais radioativos ainda são utilizados principalmente em pesquisas e para fins industriais. Nesses casos, os rejeitos descartados são levados a depósitos da Cnen em São Paulo (SP), no Rio de Janeiro (RJ), em Recife (PE) e em Belo Horizonte (MG). Em Goiânia existe um depósito provisório, de onde os rejeitos são encaminhados para suas destinações finais.

Todo a rigidez no controle exigida pela legislação faz com que a probabilidade de um incidente como o Césio 137 acontecer novamente seja muito pequena, avalia Walter. “Do nível de Goiânia, não acredito que ocorra. Acidentes de trabalho podem acontecer, mas hoje há um controle muito mais rígido. As lições de Goiânia foram aprendidas pelo mundo”, conclui.