Corrida por Reuquinol nas farmácias de Goiânia prejudica pacientes com lúpus
Apesar da falta de comprovação científica, hidroxicloroquina é procurada para combater novo coronavírus
A advogada Amanda Caroline Ribeiro Sobrinho, de 23 anos, esteve em diversas farmácias de Goiânia. Depois de perceber que não havia mais o Reuquinol, remédio cujo composto ativo é a hidroxicloroquina, passou a ligar procurando pelo produto, mas sem sucesso. Ela tem lúpus, uma doença rara que ataca o sistema imunológico, o que culmina na agressão dos rins, sistema nervoso, pele e mais. O medicamento necessário para manter a imunidade, mas muitos têm feito uso do mesmo, sem qualquer comprovação, contra o novo coronavírus.
“Eu só tenho mais cartela, que dá para mais dez dias”, diz ela sem esconder a preocupação. “Não tenho achado mais e as farmácias dizem que não vão mais receber.” De acordo com Amanda, o reumatologista dela já sugeriu a manipulação. Todo esse “caos”, segundo ela, começou depois de Donald Trump [presidente dos Estados Unidos], mencionar a hidroxicloroquina, como possível remédio para a combater o Covid-19. “Não precisa de receita, eu mesmo compro sem. Agora terei que manipular. Pagar caríssimo, sem saber quanto fica pronto”, teme a advogada, que classifica as pessoas que tem buscado essa solução sem orientação de “irresponsáveis”.
“Extramente egoístas. Pensam em se salvar prejudicando outras vidas. Irresponsáveis de se automedicarem. É um remédio forte que pode até prejudicar a saúde delas. Deveriam pensar, hoje mais do que nunca, no próximo.”
Mesmo problema
A mesma situação é vivida por Bruna Fernandes Ribeiro, 23 anos, bacharel em direito. “Já liguei em mais de dez farmácias e me disseram que o estoque acabou depois da informação passada da TV de que o remédio combate o coronavírus. Informaram também que está tendo recolhimento do Ministério da Saúde para enviar para hospitais para usar no tratamento de pacientes de covid-19”, relatou.
Ela adverte ser importante para as as pessoas que não precisam do remédio não o comprarem. “Ela é de uso contínuo e não trata só lúpus. Trata artrite e outras doenças também”, relata. “Antes eu comprava por R$ 70, R$ 85 e, às vezes, R$ 95, dependendo da farmácia. Agora não estou nem achando, mas creio que o preço deve ter aumento por conta dessa procura gigante”, relata Bruno, que tem estoque para um mês. “Mas tenho uma amiga que não tem mais. Se ela não achar vou dividir com ela”, se solidariza.
E essa não é a única situação. Existem aqueles que tem tomado, também, remédios destinados a animais, na expectativa de se verem livres de uma possível contaminação pelo vírus. Flúvia Amorin, Superintendente de Vigilância em Saúde de Goiás, conversou brevemente com o Mais Goiás em relação as duas situações.
“Não façam isso”, disse ela, que se comprometeu a enviar uma nota ao portal, posteriormente, com todas as recomendações. “Acerca da hidroxicloroquina, ela afirma que a própria Organização Mundial de Saúde (OMS) já declarou que os estudos são muito preliminares e, portanto, não dá para recomendar o uso contra o Covid-19.” O texto oficial, quando enviado, será utilizado para atualizar e complementar essa matéria.
Anvisa
Em nota, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também reforçou que não há estudos que comprovam o uso desses medicamentos para o tratamento do novo coronavírus. “Diante das notícias veiculadas sobre medicamentos que contêm hidroxicloroquina e cloroquina para o tratamento da Covid-19, a Anvisa esclarece que: esses medicamentos são registrados pela Agência para o tratamento da artrite, lúpus eritematoso, doenças fotossensíveis e malária”, reforça a nota técnica.
Além disso, o texto informa que, apesar de promissores, “não existem estudos conclusivos que comprovam o uso desses medicamentos para o tratamento da Covid-19. Portanto, não há recomendação da Anvisa, no momento, para a sua utilização em pacientes infectados ou mesmo como forma de prevenção à contaminação pelo novo coronavírus; e a automedicação pode representar um grave risco à sua saúde”.
Farmácias
O Mais Goiás ligou para três farmácias, em Goiânia – em setores distintos. Em nenhuma delas havia o remédio citado pelas fontes. A resposta sempre a mesma: a procura foi grande e não há previsão de reposição. Além disso, foi dito, ainda, que as próximas remessas irão direto para os hospitais – não são informadas as unidades de saúde.
“Só vão distribuir a nível hospitalar. Não deram mais detalhes”, relata um atendente, que repete as mesmas informações das demais farmácias.