Deficiente visual que aprendeu braile em escola pública de Trindade (GO) é aprovada na UFG
A deficiente visual Thais Rodrigues Santos, de 18 anos, realizou o sonho de entrar na…
A deficiente visual Thais Rodrigues Santos, de 18 anos, realizou o sonho de entrar na Universidade Federal de Goiás (UFG), no curso de Musicoterapia. A adolescente foi alfabetizada em braile aos seis anos de idade, na Escola Municipal Messias Bites Leão, em Trindade. A conquista é a realização de um sonho de Thaís, da família e também dos professores que auxiliaram no aprendizado dela.
“Significa muito pra mim porque não foi fácil, mas passei na UFG no curso que era minha primeira opção. Meu sonho é ser cantora”, revela a estudante, sem esconder a alegria da conquista. Thaís se diz realizada e “pronta para novas experiências”. Ao Mais Goiás, ela explica que escolheu o curso de musicoterapia por conta de uma professora, que a inspirou.
“Ela [a professora] me falava muito sobre o curso de musicoterapia e, quando fui pesquisar, acabei me apaixonando. É muito raro ver pessoas com deficiência se formar nestas áreas que cuidam das pessoas. Eu quero deixar um legado no mundo e fazer a diferença”, diz Thaís. A estudante diz também que deseja seguir um caminho que, em geral, as pessoas não escolhem. “Quero que me vejam como superação, para que elas também se superem”.
Por se tratar de uma área que, em muitos aspectos, depende de recursos audiovisuais, Thaís revela que pensou em desistir e sentiu medo de não conseguir aprovação. “Eu cogitei desistir dessa carreira, porque é muito visual a prática de cuidar das crianças. Mas decidi criar a minha própria maneira, minha própria didática”, explica. A adolescente enxerga apenas vultos em um dos olhos.
Sonhos não param
Ambiciosa, Thaís planeja realizar muitos outros sonhos. A garota diz que pretende se formar em mais cursos, como teologia, e que a aprovação em musicoterapia é só o começo.
O maior de seus sonhos é se tornar cantora gospel. Ela se diz muito próxima de Deus e acredita que ele a use através da voz, para mudar a vida de outras pessoas.
Professores foram fundamentais para que deficiente visual conquistasse aprovação
As conquistas de Thaís são, também, conquistas de professores que a auxiliaram durante o processo de aprendizagem. A professora Maria da Glória Silveira de Oliveira Mendes, por exemplo, dispôs-se a aprender braile para ensinar a menina, quando ela tinha seis anos. Na época, Thais era a única entre os alunos deficientes da professora que não enxergava.
“Fiquei transtornada quando vi que só havia uma pessoa na escola que sabia orientar Thais, que era a professora de apoio; e fui fazer um curso de braile em Goiânia. Fui aprender para ensinar”, relata.
Maria da Glória diz que se sentiu muito impotente na época, pois pensava que não conseguiria ensinar da melhor forma. “Eu pensava, ‘mas e se a professora de apoio dela faltar? como vou fazer?”, relembra a professora.
A docente diz que, apesar de ter ensinado à Thaís, também aprendeu com ela. “Eu aprendi com a Thaís e com a família dela a nunca desistir. A mãe dela sempre fez questão que a filha dela fosse tratada como qualquer outra criança. Fora que a Thaís sempre estava a sorrir, nunca se entristecia. Com ela, aprendi a dar mais valor na vida, nas coisas mais pequenas”.
Pandemia
A estudante revela que, nem mesmo durante o período da pandemia da Covid-19, em que as aulas aconteceram de forma online, os professores da rede pública a desampararam. Thaís menciona o professor de matemática, Josivaldo, que fazia questão de descrever as imagens para ela, durante o ensino médio.
“Ele era novo, nem me conhecia, mas sempre era muito atencioso. Quando voltamos ao presencial, ele puxava uma cadeira, sentava-se do meu lado e me explicava tudo com dedicação. E assim, todos. Sempre meus professores fizeram de tudo para que eu não me sentisse rejeitada, ou me sentisse diferente”, diz Thaís.
Deficiência visual não foi o único desafio da vida de estudante
Filha de um borracheiro e de uma dona de casa, Thaís é a irmã mais nova de três garotas e marcou sua chegada na família com uma apreensão distante das conquistas de hoje em dia. Ela nasceu prematura, após seis meses de gestação, e sofreu catarata nos dois olhos.
Segundo a mãe, Carmelita de Souza, de 58 anos, tudo indica que o problema foi causado pela luz forte do berço da UTI neonatal de um hospital onde Thaís ficou internada em Goiânia ao nascer prematuramente, e onde também sobreviveu a uma cirurgia no pulmão, ainda bebê.
Carmelita só notou que Thaís não enxergava bem quando a caçula tinha um ano de nascida. Então veio o diagnóstico de cegueira quase total “que mudou a vida de todos em casa”, lembra.
A família não tinha muitos recursos financeiros, mas o casal buscou sempre os benefícios aos quais Thaís tinha direito por ser deficiente visual. “Do dinheiro da aposentadoria, a tudo mais que ela tivesse direito, revertíamos para não faltar nada a ela”, cita a dona de casa, orgulhosa de ver as vitórias da adolescente.
A família, amigos e professores de Thaís dizem não ter dúvidas de que o mundo é pequeno para a grandiosidade da garota.