Depoimentos dão novos detalhes em caso de PMs do COD acusados de forjar confronto
Testemunha confirmou que uma das vítimas era informante da PM há duas décadas
A execução do autônomo Junio José de Aquino, de 40 anos, e do corretor Marines Pereira Gonçalves, 42, por policiais militares do Comando de Operações de Divisa (COD) da Polícia Militar de Goiás ganhou novos detalhes. Depoimentos de testemunhas da defesa e da acusação no processo corroboram a tese do Ministério Público de Goiás (MPGO) e da Polícia Civil de que as mortes têm relação com a prestação de serviços ilegais para PMs por uma das vítimas.
Durante depoimento, o comandante do Batalhão Rural da PM, tenente-coronel Fábio Francisco da Costa, disse que o autônomo Junio José de Aquino dava informações a policiais há cerca de duas décadas. Ele, inclusive, era conhecido como “Pirata”. Ele foi ouvido, pois a defesa dos acusados disse que eles estavam envolvidos no caso de uma extorsão violenta cometida por Junio, Marines e um terceiro (não identificado oficialmente) contra uma pessoa em uma fazenda de Petrolina, em 31 de março. A ocorrência começou no Batalhão Rural.
A mulher de Junio também disse que ele trabalhava com policiais militares. Contudo, ela só soube de um caso há cinco anos, época em que ele passou a responder pela morte de Yuri Heeymbeck, 20, e Laryssa Eduardo dos Santos, 17. “Neste tempo, ele dizia que era informante da polícia, trabalhava junto, andava com eles.” Investigações apontaram que PMs e Aquino estariam extorquindo Yuri. Ela também relatou que, há cerca de anos, antes de conhecê-lo, Junio se envolveu em um caso de estelionato com um policial, mas não soube dizer o que houve com o processo.
A suposta vítima do caso de extorsão em Petrolina, respondeu já ter visto Marine, na feira da Marreta, em Goiânia, em 2015 – informação que não costa em depoimentos ao Batalhão Rural e depois. Antes, ele havia dito que não estava na fazenda quando o trio apareceu. Contudo, mudou a versão durante interrogatório do MPGO. Destaca-se, não existe processo criminal na Justiça sobre o suposto caso de extorsão.
Os acusados acompanharam o interrogatório: os tenentes Allan Kardec Emanuel Franco e Wandson Reis dos Santos, os sargentos Wellington Soares Monteiro e Marcos Jordão Francisco Pereira Moreira, e os soldados Pablo Henrique Siqueira e Silva e Diogo Eleutério Ferreira. Atualmente, o processo está em fase de audiência de instrução e julgamento, momento de oitiva às testemunhas e aos réus por um juiz que decidirá ou não pela pronúncia (envio dos acusados para júri popular).
Sobre o caso
Junio José Aquino Leite, de 40 anos, e Marines Pereira Gonçalves, de 42 anos, são os dois homens que morreram na ação do COD, no começo de abril deste ano. Segundo a ocorrência relatada pelos militares envolvidos na abordagem, a dupla havia sido denunciada por um foragido da Justiça, que teria sido procurado por eles dias antes, em uma chácara em Petrolina, cidade que fica na região metropolitana de Goiânia.
Quando não encontraram este suposto foragido por lá, Junio e Marines, ainda conforme o relato feito pelos PMs do COD, foram até a casa dele, em Trindade, e, após invadirem o imóvel, furtaram vários aparelhos eletroeletrônicos. A ocorrência diz, ainda, que o denunciante afirmou que a dupla estaria se passando por policiais civis e extorquindo pessoas com antecedentes criminais na zona rural de cidades próximas à capital.
Procurados pelo Serviço de Inteligência do COD, os dois suspeitos, que estavam em um carro modelo HB20, teriam sido vistos trafegando pelo Setor Jaó. Nas proximidades do Centro de Treinamento do Vila Nova, eles foram abordados por uma equipe fardada.
Os policiais relataram que, quando abordado, o suspeito que estava no volante do carro desceu e usou uma pistola para atirar contra a equipe, que revidou. O tenente e os dois sargentos, então, efetuaram nove tiros de fuzil e outros nove de carabina contra a dupla. O soldado que estava com a equipe e que dirigia a viatura não efetuou nenhum disparo.
Um dos abordados morreu na hora e o outro foi socorrido ainda com vida, mas não resistiu. Durante o registro da ocorrência, os PMs entregaram uma pistola e um revólver para a equipe da Delegacia Estadual de Investigação de Homicídios (DIH) e afirmaram que as armas haviam sido usadas por eles contra a equipe.
Vídeo mostra que motorista se rendeu e foi retirado do carro desarmado
As imagens captadas pelo celular de um dos mortos, porém, mostram quando um dos abordados, que estava no volante, foi retirado do veículo com as mãos para cima, sem nenhuma arma. Posteriormente, um policial, que empunhava um fuzil, ordena que ele coloque as mãos na cabeça e se vire para frente. Na sequência, o PM efetua dois disparos e a sirene da viatura, que não aparece nas imagens, é ligada.
Após os dois disparos, outro PM aparece na filmagem empunhando uma pistola e dando dois tiros para o chão. Segundos depois, outro militar, também fardado, retira um revólver que estava dentro de um saco plástico do colete, limpa a arma, e dá dois tiros.
Depois que o ocupante do banco do carona é retirado do carro, já baleado, por um homem sem farda, que seria um PM do Serviço de Inteligência, o celular dele é pego e desligado. No dia 3 de abril, os seis policiais envolvidos na ocorrência, quatro que estavam fardados na viatura e dois do Serviço Reservado, que vestiam roupas comuns, foram ouvidos na Corregedoria da corporação.
Ficha criminal dos mortos
Segundo a PM, os dois mortos já possuíam extensa ficha criminal. Junior José Aquino Leite, que tinha 40 anos, já respondeu por extorsão, estelionato, tráfico de drogas, ameaça e lesão corporal. Já Marines Pereira Gonçalves, que tinha 42 anos, ostentava passagens por porte ilegal de arma de uso restrito, receptação, extorsão e cárcere privado.