CRIMINOLOGIA

Especialistas dizem que é precipitado se referir a Lázaro como ‘serial killer’

Especialistas afirmam que faltam conclusões sobre o caso e explicam a importância destes estudos

Ex-patrão de Lázaro diz que foi procurado por mulher e sogra do suspeito para negociar rendição (Foto: divulgação/Polícia Civil)

Especialistas em criminologia consideram precipitado chamar o assassino Lázaro Barbosa de serial killer antes de concluída na análise pericial detalhada dos crimes que ele cometeu. A ciência forense diz que, para classificar alguém com este termo, o assassino em série deve apresenta uma tríade fundamental de características em seu comportamento: um modus operandi padrão, a “assinatura” e o ritual.

A pesquisadora Beatriz Moura Fé Nunes diz ao Mais Goiás que todas essas informações levantadas e consolidadas até agora ainda não são o suficiente para traçar o perfil criminal de Lázaro e, principalmente, não o classificam como um ‘serial killer’.

O modus operandi é a maneira com que um indivíduo, ou uma organização, realiza os crimes. Trata-se principalmente da arma utilizada, das semelhanças entre as vítimas e o critério para escolha dos locais onde os crimes foram praticados. Na grande maioria das vezes, os serialkillers ‘aperfeiçoam’ esse modus operandi conforme vai fazendo mais vítimas. Em outras palavras, ele sempre age maneira semelhante em todos os crimes e, assim, acaba melhorando na prática, o que colabora para que siga impune.

Até o momento, o que se sabe é que Lázaro sempre invade as casas das vítimas e utiliza diferentes armas durante os crimes, sejam armas de fogo, facas ou machados. Segundo a polícia, há registros de estupros supostamente cometidos por ele. Como em 26 de abril deste ano, em que Lázaro teria invadido uma casa, no Sol Nascente, trancado pai e filho no quarto e levado a mulher para o matagal, onde abusou sexualmente da vítima.

Buscas foram intensificadas agora pela manhã em região onde Lázaro trocou tiros na noite passada com um chacareiro (Foto: divulgação/ PC)
Buscas foram intensificadas agora pela manhã em região onde Lázaro trocou tiros na noite passada com um chacareiro (Foto: divulgação/ PC)

Outro registro são as situações de abuso e soberba durante a ação com as vítimas. No último sábado (12), três pessoas foram baleadas em uma casa na zona rural de Cocalzinho de Goiás. Lázaro teria forçado vítimas a fazer comida para ele enquanto as obrigava a fazer consumo de drogas. No local, Lázaro supostamente roubou duas armas de fogo e munições.

Contudo, ainda não há a confirmação pericial se essas vítimas são mortas de maneira semelhante, nem mesmo qual a motivação dos crimes. “Dito isso, se torna precipitada a avaliação de Lázaro como sendo um Serial Killer, uma vez que para se laudar um perfilamento é necessário uma análise a longo prazo dos crimes cometidos e de seu modus operandi, não somente se basear na quantidade de vítimas feitas pelo mesmo”, afirma Beatriz Moura Fé Nunes.

A assinatura

Quanto à assinatura presente nos crimes, ou até mesmo nas próprias vítimas, se dá por analogia de comportamentos, não se tratando apenas de formas de agir incomuns. Ferimentos específicos, por exemplo, podem ser uma forma de assinatura do criminoso serial.

Suposto esconderijo de Lázaro, próximo onde Cleonice foi encontrada (Foto: Reprodução)

Na última quarta-feira (9), Lázaro teria invadido uma casa em Ceilândia. Lá, teria matado o empresário Cláudio Vidal, 48; dois filhos dele, Gustavo Marques, 21; e Carlos Eduardo Vidal, 15; e sequestrado a mãe deles, Cleonice Marques, 43. A mulher foi encontrada, na tarde de sábado (12), nua, de bruços e apresentava cortes na região das nádegas.

Os tais cortes nas nádegas encontrados em Cleonice, até podem ser considerados uma assinatura do fugitivo se tivessem sido realizados em mais de uma vítima, por exemplo. Fato que ainda não foi confirmado pelas autoridades.

O ritual

Por fim, o ritual é considerado uma das características mais aparentes. Ele majoritariamente se dá por uma fantasia sexual, a fim de satisfazer o desejo pessoal do assassino. A pesquisadora explica ainda que, na maioria dos casos, o serial killer apresenta características marcantes desde sua infância, com características como incontinência urinaria, mania de atear fogo nas vítimas como forma de prazer, maus tratos à animais e demais crianças, além de comportamento conturbado e agressivo.

A expertise em Psicologia do Sistema Criminal pela Universidade de Queensland na Austrália, Claudia Luiz Lourenço, explica que as características mencionadas também podem ser atribuídas à psicopatas e, por isso, torna-se tão difícil diferenciar se Lázaro é um assassino em série ou um psicopata. “É necessária uma investigação mais aprofundada para chegar a uma conclusão como esta. Nem todo serial killer é um psicopata, da mesma forma, nem todo psicopata se destinará a tornar-se um serial killer”, explica.

Em 2013, um laudo criminológico de um processo por roubo, porte de arma de fogo e estupro, apontam que Lázaro tem uma personalidade “agressiva, impulsiva, de dependência emocional, preocupações sexuais e sentimentos de angústia”.

Claudia explica que esse laudo não expõe condições que caracterizem um serial killer. “Quanto ao laudo de 8 anos atrás poderemos encontrar em seu conteúdo elementos que encontraremos em diversas pessoas, e nem por isso poderemos denomina-las Serial Killers. O laudo inclusive faz referência que os crimes cometidos são relacionados a dependência química, e não a um desvio de personalidade, como a psicopatia”, detalha a especialista.

Como isso impacta a sociedade?

Levando em consideração a complexidade do assunto, a falta de conclusões sobre o caso de Lázaro e a necessidade de uma longa análise deste e outros casos, a reportagem questionou às especialistas qual a importância de traçar corretamente o perfil de uma pessoa assassina e, principalmente, como esses estudos impactam a vida do cidadão na sociedade.

Sobre isso, as especialistas são unânimes em afirmar que os estudos são fundamentais para que as autoridades estejam à frente dos passos dados pelo assassino. Ou, pelo menos, não tão distantes. De modo a dar maior efetividade na resposta estatal a esse tipo de crime, promovendo uma sensação maior de tranquilidade à população, com uma prisão mais célere desses sujeitos.

“A classificação faz com que o juiz analise a personalidade do agente e isso pode fazer com que a aplicação da pena aconteça num patamar mais elevado. Para o cidadão comum significa uma resposta estatal mais adequada e rápida, gerando a sensação maior de segurança e confiança nas instituições”, explica Claudia Luiz.

Histórico

A série de crimes atribuídas à Lázaro tiveram início entre os dias 8 e 9 de abril de 2020. Desde então, o homem é suspeito de matar cinco pessoas, furtar um carro, balear outras quatro vítimas, entre elas um policial militar, invadir propriedades e fazer moradores reféns. Mas, o histórico violento do fugitivo é bem mais antigo que isso, como apontado pelo laudo de 2013, mencionado acima.

O próprio pai do fugitivo, identificado como Edenaldo Barbosa Magalhães, de 57 anos, diz que não reconhece o filho e tem medo do suspeito: “o demônio se apoderou dele”, afirma. As declarações foram dadas ao Correio Braziliense. O pai ficou mais de 20 anos sem ver o filho e só o reencontrou há cerca de seis meses.

Goiás já teve casos de serial killers?

Tiago Henrique Gomes da Rocha, é condenado a 20 anos de prisão, pela morte de uma estudante em Goiânia (Foto: Aline Caetano/ Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

De acordo com Beatriz, o estado de Goiás já registrou casos de serial-killers. Segundo a pesquisadora, o caso mais recente é o de Tiago Henrique Gomes da Costa, noticiado em todo mundo devido a forma violenta de cometer seus crimes. Preso em outubro do ano de 2014, Tiago declarou ter matado 39 pessoas, além dos assaltos cometidos e casos de autoria não confirmada que tendem a ter sido cometidos pelo mesmo na cidade de Goiânia. 

A sequência de assassinatos chamou atenção fora do normal da mídia e das investigações por possuir um padrão: homossexuais, moradores de rua e mulheres de 15 a 30 anos de idade. Além do modus operandi característico, era notória a inteligente do executante e a forma vaidosa com que lidava com os crimes, fato esse confirmado após a prisão de Tiago, que mostrou possuir alto ego e desejo de visibilidade. A captura de Tiago só foi possível mediante força tarefa que ligou pontos coincidentes entre diversos crimes ocorridos na capital, chegando até o assassino.

No caso de Lázaro, ainda é precipitado traçar o perfil criminológico dele sem antes ter sido feito um estudo aprofundado. O que se sabe até o momento, é que o foragido é apontado como o principal autor de uma série de crimes de extrema violência e, principalmente, que continua em liberdade. Especialistas acreditam que ele será capaz de tudo para continuar sem ser pego, atitude que poderá significar mais mortes e vítimas inocentes.

Segundo o secretário de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO), Rodney Miranda, a tendência é que Lázaro fique mais perigoso em razão do cansaço. No entanto, isso também irá facilitar que ele seja capturado. “Ele geralmente sai da mata em busca de alimento. Estamos chegamos muito perto, vamos pegá-lo”, assegurou. No entanto, até a manhã desta quinta-feira (17), Lázaro continua solto.